quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

25 Grandes Filmes de 2016 Lançados em Cinema ou DVD (+15 Menções Honrosas)

Elaborar listas nunca é tarefa fácil - e não bastasse a complexidade para organização de um post do tipo, ainda há o risco de se deixar de fora muita coisa bacana. A nossa intenção com a lista dos 25 Grandes Filmes de 2016 Lançados em Cinema ou DVD, com direito a 15 menções honrosas, não é (apenas) falar sobre os melhores do ano. Até mesmo porque não assistimos a tudo o que queríamos, evidentemente. Nesse sentido, a relação serve mais para sugerir filmes que chegaram ao mercado, nesse ano, nos dois formatos - e que merecem ser vistos -, do que para impôr qualquer ideia ou opinião. Aliás, como não poderia deixar de ser, as suas sugestões, querido leitor do Picanha, também são mais do que bem-vindas! Se você não vai viajar no feriadinho, não faltarão opções para que o catálogo de filmes vistos seja atualizado. Boa leitura! (ah, recomendamos a leitura das resenhas completas para um melhor entendimento das idéias, sempre que elas existirem, claro!)

Menções Honrosas

#40 Sing Street: Música e Sonho (Sing Street)
#39 Shaun: O Carneiro (Shaun The Sheep Movie)
#38 As Memórias de Marnie (Omoide No Marine)
#37 A Garota do Trem (The Girl On The Train)
#36 Rua Cloverfield 10 (10 Cloverfield Lane)
#35 Ave, César! (Hail, Caesar!)
#34 Prova de Coragem
#33 A Bruxa (The Witch)
#32 Ponte dos Espiões (Bridge Of Spies)
#31 Anomalisa
#30 A Passageira (Magallanes)
#29 Big Jato
#28 Brooklyn (Brooklyn)
#27 Deadpool
#26 Agnus Dei (Les Innocentes)


#25 Desajustados (Fúsi): existem filmes que nos fazem ter vontade de entrar na tela para começar a distribuir abraços nos personagens, um a um. E é exatamente isso que ocorre com esse filme islandês que fez sucesso na temporada, entre os alternativos. Na trama somos apresentados a Fúsi (Gunnar Jónsson), um homem que já ultrapassa os 40 anos de idade e ainda mora com a mãe. Por ser gordo e não ser adequado aos padrões de beleza da sociedade, Fúsi tem total insegurança e muita dificuldade de se relacionar com as mulheres - ainda que quase nunca demonstre preocupações quanto a isso. Entre um episódio de bullying e outro conhecerá duas "moças" que modificarão a sua vida. Uma, a filha de um vizinho de apenas oito anos. A outra, uma colega do curso de danças. O que ocorre DURANTE o filme - que lembra muito as obras de Todd Solondz - é que nos comoverá.



#24 Destino Especial (Midnight Special): existem obras que, mais do que filmes com começo, meio e fim bem delineados, se constituem em verdadeiras experiências cinematográficas. São filmes nem sempre fáceis, eventualmente complexos e que, inclusive, muitas vezes desafiam as convicções ou mesmo os códigos morais dos espectadores. Em partes, pode-se dizer que é o que ocorre com esse filme etéreo, denso e incomum, a mais recente empreitada do diretor Jeff Nichols (do igualmente belo O Abrigo). São filmes que, muito provavelmente provocarão muito mais perguntas do que respostas e que, nesse caso, nos farão refletir sobre perda, relacionamento entre pais e filhos e temor a Deus ou a qualquer tipo de energia "superior". Leia a resenha completa.



#23 Nise: O Coração da Loucura: ao voltar a trabalhar em um hospital psiquiátrico no subúrbio do Rio de Janeiro, após sair da prisão, a doutora Nise da Silveira (Gloria Pires) propõe uma nova forma de tratamento aos pacientes que sofrem da esquizofrenia, eliminando o eletrochoque e lobotomia. Seus colegas de trabalho discordam do seu meio de tratamento - aliás, não demora muito para que ela seja considerada, vejam só, comunista - e a isolam, restando a ela assumir o abandonado Setor de Terapia Ocupacional, onde dá início a uma nova forma de lidar com os pacientes, através do amor e do estímulo para as artes. Não será um embate fácil, evidentemente. Glória Pires tem uma interpretação segura dessa personalidade forte e que transformou os estudos psiquiátricos nos anos em que viveu.



#22 Julieta (Julieta): Existe um lugar-comum que diz que "família não se escolhe, simplesmente acontece", e, num sentido mais amplo, pode-se dizer que a frase combina bem com o que se vê no filme. No começo da película, somos apresentadas a uma Julieta (Emma Suárez) já na meia-idade, disposta a abandonar Madri para morar em Portugal ao lado do namorado Lorenzo (Dario Grandinetti). Em sua expressão ao mesmo tempo doce e melancólica parece haver também um tanto de amargura, que aflorará ainda mais após um encontro fortuito com a jovem Bea (Michelle Jenner), uma antiga amiga de sua filha. Pois esse encontro de poucos segundos e de, aparentemente, inexpressivas trocas de palavras, será o suficiente para que Julieta mude de ideia, não apenas permanecendo na capital espanhola, como se mudando para o antigo apartamento em que morava. Leia a resenha completa.



#21 Truman (Truman): esse é daqueles filmes em que, recomenda-se, seja assistido com a caixinha de lenços de papel a tiracolo - especialmente se você for aquele tipo de sujeito que vai as lágrimas até mesmo com o episódio da venda do churros, no seriado Chaves. É uma obra que, entre outros temas, aborda o poder da amizade, a capacidade de exercer a empatia e a importância das sábias decisões, ainda que em momentos difíceis. Parece coisa de autoajuda e, em partes, talvez até seja. Mas é um drama ao mesmo tempo simpático e comovente, singelo e elegante. E ainda tem Ricardo Darín e Javier Cámara como protagonistas, interpretando sujeitos que são melhores amigos. Cámara é Tomás, que vive no Canadá e resolve viajar até Madri para encontrar Julián (Darín), ator argentino radicado na Espanha que foi diagnosticado com um câncer terminal. Leia a resenha completa.



#20 O Novíssimo Testamento (Le Tout Nouveau Testament): Deus existe, está muito "vivo" e é um velho entediado, rabugento, beberrão e malvado que vive com a esposa e a filha de 10 anos de idade nos arredores de Bruxelas, na Bélgica. A menina, de nome Ea (Pili Groyne), cansada do comportamento abusivo e violento do pai, aproveita um momento de distração do todo poderoso para invadir o seu computador, que contém os dados de todos os habitantes da terra, para mandar uma mensagem que revelará a data de suas respectivas mortes. É tomando por base essa premissa que subverte a lógica deste e de outros dogmas da Igreja Católica, que o diretor Benoit Poelvoorde constrói uma deliciosa fábula moderna que, ainda que resulte em um filme leve, colorido e divertido, não ignora o debate existencialista, passando ainda de raspão por temas relacionados ao destino, ao senso de liberdade e até mesmo ao amor nos tempos modernos. Leia a resenha completa.



#19 Cinco Graças (Mustang): esse é um filme que mostra que, mesmo em sociedades um pouco mais ocidentalizadas (ou abertas), o papel da mulher, especialmente nas pequenas comunidades rurais e patriarcais, segue sendo o de submissão ao marido, com casamentos arranjados e com elas tendo seu papel relegado ao de donas de casa, cozinhando, lavando, passando roupa, costurando. Estudar? Nem pensar. Trabalhar? Nada. A trama nos desloca para um vilarejo turco no início do verão. No local, Lale e suas quatro irmãs brincam de forma debochada com os meninos, o que acarreta em um escândalo de consequências muito fortes: a casa delas se torna praticamente uma prisão. As cinco não deixam de desejar a liberdade, e tentam resistir aos limites que lhes são impostos, em um filme comovente e com elenco encantador, que foi indicado ao Oscar na categoria Filme Estrangeiro. Leia a resenha completa.



#18 As Sufragistas (Sufragette): cansadas de mais de 50 anos de manifestações pacíficas, as mulheres do início do século passado, impossibilitadas de votar, resolvem ir literalmente a luta. Por meio da coordenação de um grupo militante - comandado pela líder Emmeline Pankhurst (Meryl Streep) -, que tem o objetivo de se fazer ouvir, a ordem do dia passam a ser os atos de insubordinação e desobediência, com direito a vidraças quebradas e caixas de correio queimadas. "Você quer que eu respeite a lei? Então torne a lei respeitável", afirma uma das protagonistas. Tudo para tentar chamar a atenção de políticos que possam aderir a causa e contribuir para a promulgação de uma emenda ou mesmo um projeto de Lei que possa garantir o exercício da cidadania a elas. Um filme histórico, já que baseado em fatos reais. E atualíssimo. Leia a resenha completa.



#17 Elle (Elle): indigesta e controversa, certamente a nova obra do diretor Paul Verhoeven é daquelas que possibilita um debate acalorado após a sessão. A trama conta a história de Michèle (Isabelle Hupert, sempre perfeita), empresária do ramo dos videogames, que, aos 50 anos, mantém o seu negócio com mão de ferro. Aliás, é assim também com a sua vida pessoal e não é por acaso que a sua relação com os os personagens homens é sempre as turras, sejam eles os empregados, o ex-marido, o amante, o filho. Quando ela é estuprada em sua casa por um desconhecido, resolve guardar para si o evento traumático. Para o espectador, após o estranhamento inicial, tudo pode se esclarecer: os traumas de Michèle, acredite, são ainda maiores e a trama, repleta de nuances vai no limite de temas como fetichismo, sexualidade na meia idade, empoderamento feminino e misoginia. Um filme diferente. E instigante.



#16 Sully: O Heroi do Rio Hudson (Sully): ainda falta cerca de um mês para que os indicados ao Oscar de 2017 sejam anunciados, mas alguns filmes já começam a aparecer com força na bolsa de apostas. E este tem todos os elementos que agradam a Academia. Primeiro, é dirigido por Clint Eastwood. Depois tem Tom Hanks, como o protagonista. Ou seja, meio caminho andado. A trama narra a história do conhecido episódio ocorrido em janeiro de 2009 quando, logo após decolar do aeroporto de La Guardia, em Nova York, um avião faz um pouso forçado em pleno rio Hudson, após um problema nas turbinas. A iniciativa é bem sucedida, com todos os 150 passageiros a bordo sendo salvos. Mas era necessário tudo isso? Sully é um herói? Ou arriscou a vida de todos de maneira arrogante ou prepotente? O filme, uma delícia de se ver, passa voando - com o perdão do trocadilho.



#15 O Valor de Um Homem (La Loi du Marché): a França que o diretor Stéphane Brizé costuma mostrar em seus filmes em nada lembra o glamour romanceado de sua capital, bem como o de pontos turísticos. Não, a "cidade luz" de Brizé é a do trabalhador que paga impostos, que luta para se manter, que enfrenta um sistema em que os ricos e pobres permanecem a algumas léguas de distância uns dos outros. E que em 2015 alcançou um índice de desemprego próximo dos 11% da população trabalhadora ativa. É nesse contexto que está estabelecida a trama do filme. Homem de cinquenta e poucos anos, Thierry (o sempre competente Vincent Lindon) está desempregado. Mas isso não significa leniência, já que ele luta de todas as formas para retornar ao mercado de trabalho nessa obra silenciosa, reflexiva, sutil e naturalista. Leia a resenha completa.



#14 Marguerite (Marguerite): existe uma frase atribuída ao escritor George Bernard Shaw que bem poderia definir aquilo que assistimos nesse verdadeiro achado do cinema francês: "os espelhos são usados para ver o rosto, a arte para ver a alma". Baseado em fatos reais, o filme do diretor Xavier Giannoli conta a história da baronesa Marguerite Dumont (Catherine Frot), ricaça que costumava organizar saraus e outros eventos artísticos privados, em sua mansão, com objetivo de levantar fundos para crianças órfãs ou outras entidades em vulnerabilidade social. Por acreditar ter uma boa voz, a mulher eventualmente "presenteava" o público com exibições de música clássica. O problema é que ela cantava mal. Aliás, mal não. MUITO MAL. Despretensioso e recheado de personagens complexos e ambíguos, o filme questiona os limites da arte, sem ignorar o pano de fundo político. Leia a resenha completa.



#13 Filho de Saul (Saul Fia): absolutamente agonizante, a obra vencedora na categoria Melhor Filme em Língua Estrangeira, na última edição do Oscar, não é apenas um filme sobre um judeu que trabalha carregando corpos e cremando mortos em um campo de concentração nazista. É também a história de um pai desesperado e que busca, a todo o custo, possibilitar um enterro digno a seu filho - enviado para a autópsia. Poucas vezes os horrores da guerra foram apresentados de forma tão realista e perturbadora, como nessa pequena obra-prima húngara. A câmera subjetiva - e nervosa -, não desgruda um instante sequer do rosto de Saul, formando uma opressiva proposta estética que fortalece em todos os sentidos a tensão sobre aquilo que se vê. Uma película em que é praticamente impossível ignorar o gosto amargo ao final da projeção.



#12 Para Minha Amada Morta: Fernando (Fernando Alves Pinto) perdeu a esposa não faz muito e, como forma de aplacar a dor, passa os dias observando fotografias da amada, organizando suas roupas e assistindo fitas VHS com gravações de sua juventude. Em um dos vídeos, descobre que a falecida - que era advogada - lhe traía com um homem que foi seu cliente. É o estopim para que o protagonista passe a investigar o que está por trás da fita e perpetre a sua vingança nesse saboroso suspense nacional. A aproximação entre ambos os homens é lenta, mas sempre fluída. O ambiente é ao mesmo tempo soturno e claustrofóbico em meio a máquinas e outros equipamentos relacionados a profissão do amante. Absolutamente sombria, densa, psicológica, a obra bebe de fontes clássicas como o suspense Cabo do Medo. E surpreende!




#11 Capitão Fantástico (Captain Fantastic): Ben é o pai de seis crianças, que decide fugir da civilização e criar os filhos nas florestas selvagens do Pacífico Norte. Ele passa os seus dias dando lições às crianças, ensinando-os a praticar esportes e a combater inimigos. Um dia, no entanto, quando sua esposa doente morre, Ben é forçado a deixar o local e retornar à vida na cidade. O resumo dessa verdadeira pérola do cinema alternativo nunca será suficiente para a compreensão dessa obra tocante, que faz uma análise sobre o conhecimento para além da intelectualidade vazia, com questionamentos de padrões e de normas pré-estabelecidas. Especialmente em um mundo em que o saber empírico é pouquíssimo valorizado. Viggo Mortensen dá um verdadeiro show de interpretação como o pai, nessa película que emociona do início ao fim.



#10 O Regresso (The Revenant): O filme conta a história (inspirada em fatos reais) de Hugh Glass que, em 1823, serviu de guia em uma expedição de caçadores de peles em terras indígenas americanas e que, após ser atacado por um urso, foi deixado à mercê da própria sorte pelo integrante John Fitzgerald, que nutria certa antipatia por Glass. Decidido a não esperar pela morte de seu compatriota, deixa-o sozinho agonizando em uma cova coberta com terra - além de ser responsável por uma tragédia envolvendo o filho de Glass (fruto de seu relacionamento com uma indígena, cuja aldeia foi dizimada por caçadores brancos). Movido pelo instinto de sobrevivência, o personagem - que FINALMENTE possibilitou um Oscar a Leonardo Di Caprio - consegue resistir às adversidades, partindo em uma jornada épica em busca de vingança. Leia a resenha completa.



#09 O Menino e O Mundo: com sua história ao mesmo tempo singela e realista - e que mostra um jovem garoto do interior que vê seu pai migrar para a cidade grande atrás de melhores oportunidades, perseguindo-o incansavelmente, logo após, movido pelo sentimento demasiado humano da saudade - essa obra-prima deve ser vista por todos. É um filme tocante, doce, que mostra a transição forçada de um jovem para a fase adulta, ocasião em que irá descobrir da maneira mais melancólica possível como sobrevive uma sociedade (doente) em que a ordem do dia é consumir. É ter, ter e ter. É viver pensando em si e no seu umbigo. E mostrar para os outros que tem, num ciclo de espetacularização da vida em que pouco importa se, logo ao lado, outros passarão fome. Ou não terão emprego. O que importa é o número. E a geração de divisas. Leia a resenha completa.



#08 A Grande Aposta (The Big Short): Em setembro de 2008 o mercado imobiliário norte-americano entrou em colapso, resultando em uma crise econômica talvez só vista, anteriormente, na época da quebra da Bolsa de Valores de Nova York, que veio a acarretar a Grande Depressão nos Estados Unidos. O filme de Adam Mckay se propõe a contar essa história, mas de uma maneira diferente: partindo justamente do ponto de vista daqueles que apostaram todas as suas fichas CONTRA o "infalível" sistema financeiro americano, a fim de lucrar milhões (e até bilhões) de dólares, as custas do sofrimento de centenas de milhares de pessoas que depositaram tudo no sonho da casa própria. Parece um filme pesado, dramático e cheio de termos do economês. E até é. Mas ele também tem um lado leve, bem humorado e charmoso - sem falar nas interpretações - que torna a sessão irresistível. Leia a resenha completa.



#07 Spotlight: Segredos Revelados (Spotlight): baseada em fatos reais, a trama do filme dirigido por Tom McCarthy - e vencedor do Oscar na última edição - segue os passos de um grupo de jornalistas do diário Boston Globe, que, em 2001, teve acesso a uma série de documentos capazes de provar diversos casos de pedofilia causados por padres católicos. Com um agravante: os eventos teriam sido acobertados pela própria igreja, com transferências de religiosos para outras localidades e chantagens diversas - com direito a participação de advogados e da própria imprensa - ao menor sinal de que os casos pudessem vir à tona. É mais ou menos como um Todos os Homens do Presidente. Mas sai o escândalo de Watergate, entra um movimento escabroso de violência, capaz de traumatizar centenas de famílias. E que foi acobertado justamente por aqueles que deveriam apoiar os sobreviventes. Leia a resenha completa.



#06 A Juventude (Youth): Pra quem gosta de cinema enquanto manifestação artística para além do simples entretenimento, o mais recente filme do diretor Paolo Sorrentino é um prato cheio. Aqui, ainda que o tema central seja a velhice, não se tem uma história no formato a que estamos acostumados, com começo, meio e fim bem definidos, um arco dramático suficientemente claro ou uma gramática fílmica aos moldes daquilo que se faz em Hollywood. Para Sorrentino, a construção de uma obra escapa um tanto desse caráter mais convencional, para que possamos aproveitar o cinema para além do mosaico essencialmente visual (e simples) apresentado, não surpreendendo, portanto, o caráter por vezes atmosférico, climático ou catártico daquilo que presenciamos em cada um de seus filmes. Em suma, é um daqueles prazeres que talvez experimentemos ao assistir a algum clássico do cinema. Leia a resenha completa.



#05 Os Oito Odiados (The Hateful Eight): o cinema é a maior de todas as Artes. Ou a junção de praticamente todas elas. Roteiro (a escrita), atuações (artes cênicas), fotografia, trilha sonora (a música), cenários (direção de arte) e outras tantas unidas para criar uma obra pronta a ser apreciada pelos espectadores em comunhão em uma sala escura. A catarse em forma de riso, choro, reações frente ao que se vê na tela e se ouve saindo das caixas de som. Uma orquestração milimetricamente desenvolvida para proporcionar emoções na plateia. O absurdo da vida amplificado em forma de imagens e som. E quando tudo isso vem no pacote genial do diretor americano Quentin Tarantino, temos algo especial. E é esse o caso de Os Oito Odiados. Não viu? Apenas pare. Leia a resenha completa.



#04 O Quarto de Jack (Room): com interpretações arrebatadoras da dupla de protagonistas Brie Larson e Jacob Tremblay, o filme conta a história de uma mulher que, sequestrada e há sete anos vivendo trancada em um quarto minúsculo (o Room, do título em inglês), possui um filho de cinco anos de idade, fruto dos constantes abusos perpetrados pelo sequestrador de nome "Old" Nick. Assim olhando parece um suspense simples que tratará a respeito das tentativas de fuga de mãe e filho desse ambiente inóspito e desolador em que ambos vivem. Mas a obra é dividida em duas partes. E a segunda, da qual não vale a pena comentar para evitar qualquer spoiler, é tão sufocante e angustiante quanto a primeira. Talvez O Quarto de Jack seja o melhor filme entre os indicados ao Oscar na última temporada. Talvez. Vejam e nos digam. Leia a resenha completa.



#03 A Chegada (Arrival): disse certa vez o escritor Charles Baudelaire: "manejar sabiamente uma língua é praticar uma espécie de feitiçaria evocatória". Pois, em uma análise da obra mais recente de Denis Villeneuve, é praticamente impossível permanecer alheio ao aforismo do autor de As Flores do Mal. Discutir a linguagem e os seus significados em um filme de ficção científica - em que, imagina-se, as pessoas esperem invariavelmente o maniqueísmo das guerras sem fim entre humanos e alienígenas - certamente não é tarefa fácil. Mas Villeneuve o faz não apenas com sensibilidade e profundidade, mas imprimindo ainda um caráter existencialista às noções de tempo e de espaço ou mesmo de presente, passado e futuro, confundindo cronologias e lógicas pré-estabelecidas. Sem ignorar a (importante) porção cinematográfica, evidentemente. Leia a resenha completa.



#02 Boi Neon: em linhas gerais e de forma muito resumida, o espetacular filme de Gabriel Mascaro, fala de escolhas profissionais. E de como elas podem ser muito mais difíceis para as camadas menos abastadas que, na maioria das vezes, entram para o mercado de trabalho levando em conta muito mais as circunstâncias do meio em que estão inseridas, do que a paixão por aquilo que se faz. No filme, Juliano Cazarré vive Iremar, curraleiro que vive em meio a vaquejadas realizadas em feiras populares. Iremar na verdade gostaria de ser estilista. E é tomando por base esse surpreendente contraponto, que Mascaro constrói um filme livre de preconceitos, nunca estereotipado, levemente iconoclasta e que olha com carinho para os seus personagens. Uma obra naturalista, que mostra a força do cinema nacional. Leia a resenha completa.



#01 Aquarius: a gente percebe que o cinema nacional vive uma grande fase quando, pelo segundo ano consecutivo, o primeiro colocado de nossa lista é brasileiro. Aliás, com toda a justiça, vamos combinar! Aquarius, obra-prima de Kleber Mendonça Filho, é muito mais do que o filme que gerou um comovente protesto contra o golpe no Festival de Cannes. É uma obra sutil, de grandes interpretações e que não está interessada em denunciar injustiças sociais. Ao menos não de maneira evidente ou escancarada. É uma obra nostálgica sobre memórias, reminiscências, sensações. E que tem Sônia Braga em seu momento máximo, como uma mulher bem sucedida que resiste às pressões de uma construtora para vender o seu antigo apartamento. Que dará lugar a um luxuoso e asséptico condomínio. Sem vida. Sem história. Insípido. Inodoro. Leia a resenha completa.



E então, pessoal, gostaram? Não esqueçam de dar as vossas opiniões! =D

quinta-feira, 15 de dezembro de 2016

25 Melhores Discos Nacionais de 2016 (+15 Menções Honrosas)

Como todos nós já estamos carecas de saber, o ano de 2016 foi um dos piores da história. Mas não musicalmente. Aliás, nesse campo talvez tenha sido, como num contraponto, um dos melhores anos! Foram muitos os grandes lançamentos que dialogam justamente com esse período em que estamos vivendo hoje em dia, em que o ódio, a intolerância e os preconceitos de todas as formas são disseminados e legitimados justamente por aqueles que nos deveriam representar de maneira equilibrada, na busca por justiça social ou por igualdade de direitos. Não fossem esses tempos e talvez o rapper paulistano Rashid não realizaria um disco tão potencialmente histórico e efervescente como o essencial A Coragem da Luz. Ou talvez o Carne Doce não resolvesse mudar a direção de sua carreira falando muito mais sobre feminismo e empoderamento da mulher, como no caso de Princesa. A arte ainda tem esse potencial redentor, iconoclasta, provocador. E quanto mais o sistema é bruto, mais os artistas parecem dispostos a falar. Pena que a nossa lista contempla apenas 40 discos. E admitimos que não foi tarefa fácil condensá-los aqui. Esperamos que gostem da nossa relação com os 25 Melhores Discos Nacionais de 2016, com mais 15 Menções Honrosas!

Menções Honrosas

40) Vitreuax - Pra Gente Poder Passear
39) Mano Brown - Boogie Naipe
38) El Toro Fuerte - Um Tempo Lindo pra Estar Vivo
37) Graveola - Camaleão Borboleta
36) Trombone de Frutas - Chanti Alpïsti
35) Hurtmold e Paulo Santos - Curado
34) Eduardo da Silva - Abre Alas
33) Bilhão - Bilhão
32) Rômulo Fróes e César Lacerda - O Meu Nome é Qualquer Um
31) Morfina - Farta Evanescente
30) Fernando Temporão - Paraíso
29) Barro - Miocárdio
28) Nego E. - Oceano
27) Não ao Futebol Moderno - Vida Que Segue
26) Rico Dalasam - Orgunga




25) Bruna Mendez (O Mesmo Mar que Nega a Terra Cede à Sua Calma): É quase palpável o clima aconchegante e íntimo do ouvinte, proporcionado pela audição do disco de estreia da goiana - que chega após o elogiado EP lançado ainda em 2014, intitulado Pra Ela. Com personalidade, a cantora acaricia quem se arrisca pelas curvas desse registro, que flerta fortemente com a MPB clássica, mas sem deixar de lado o diálogo com uma sonoridade mais contemporânea, capaz de trazer ainda algum frescor para uma vertente que parece sempre pronta a mostrar algum esgotamento. Assim como mostra a capa, Bruna parece literalmente "abrir a janela para a sua alma" equilibrando temas românticos (Sorte), nostálgicos (Calor Sol e Sal) e cotidianos (Brisa).


24) Wado (Ivete): Produzido pelo próprio cantor, Ivete procura ir além daquilo que Wado já experimentou anteriormente em clássicos modernos como Atlântico Negro (2009), buscando esmiuçar e vasculhar (ainda mais) os guetos. "Ivete é a musa a não ser alcançada, ela é norte, mas não é ela quem canta no disco", explicou o artista, por meio de material de divulgação. "Ela é a musa intocada da empreitada". Uma atenta audição ao disco nos permite inferir que, para o cantor, a escolha pele axé também está relacionada a um caráter ideológico, social e racial. A vertente, enquanto manifestação artística, surge em meados dos anos 80, na Bahia, promovendo uma mistura de ritmos africanos e latinos, com reggae, forró e maracatu. A intenção, de acordo com Wado, era de evocar nomes como Moraes Moreira, algo certamente palpável, em mais este grande (pequeno) registro. [Resenha]



23) Fernando Motta (Andando Sem Olhar Pra Frente): o cantor e guitarrista Fernando Motta vem para comprovar o fato de não ser necessária, nos dias atuais, uma grande potência vocal para a construção de música de qualidade. Tomando por base o espírito nostálgico - presente já no título das canções (Com o Tempo, Videokê, Paris Texas) - o mineiro integra aquela leva efervescente de artistas da música alternativa que a imprensa local tem denominado de "rock triste". Flertando ao mesmo tempo com o rock mais cabeça de bandas oitentistas - como a Legião Urbana - com o shoegaze tão presente nas rodas noventistas de bandas como Superchunk e Yo La Tengo, Motta constroi, em sua estreia, um registro melancólico, íntimo do ouvinte em suas camadas, contemplativo e repleto de texturas.


22) Monza (Hoje Foi Um Dia Fantástico): parece não ter fim a onda nostálgica que faz com que, a cada ano (pra não dizer semana), mais e mais bandas apareçam dispostas a "homenagear" os anos 80, apresentando canções que se apropriam do período, mas com uma roupagem mais atual - e isso é muito bom, diga-se. Mas e os anos 90? Eis que surge o Monza para contemplar o período - a começar pelo nome do grupo. E pela hilária capa! Os paulistas fazem um som nostálgico e urbano, que mistura guitarras bem pontuadas, capazes de garantir um certo tom ensolarado para cada uma das composições - a despeito do tom eventualmente melancólico. As letras são um verdadeiro desfile de ironias, trafegando livremente entre o tom de deboche e o sarcasmo que reflete a vida individualista dos grandes centros - mesmo quando o tema é sério, como no caso do suicídio (na ótima Helena).


21) Sammliz (Mamba): Sammilz foi vocalista do cultuado, dramático e hermético grupo Madame Sataan, que, entre 2003 e 2014 entregou dois discos, alguns EPs e outros materiais. Tudo embalado por um combo potente de thrash, metal e hardcore. A verve roqueira, clara paixão da artista paraense, permanece intacta em seu inaugural trabalho solo que, aqui e ali, recheia o registro com elementos de música eletrônica e até mesmo com referências mais densas e oitentistas. Resultado da colaboração com os músicos Leo Chermont (Strobo) e João Lemos (Molho Negro), o disco faz o ouvinte viajar musicalmente para diversas épocas - dialogando com artistas tão distintos como Black Sabbath e Yeah Yeah Yeahs. Tudo embalado por uma sonoridade que cresce conforme Sammliz entoa os versos - não sem uma boa dose de fúria.


20) Catavento (Chá): se no primeiro disco dos gaúchos de Caxias do Sul, intitulado Lost Youth Against the Rush, era possível encontrar o rock'n roll mais potente, inspirado por bandas modernas como Queens Of the Stone Age e Cloud Nothings -, com o segundo registro, Cha, se sobressaem os cenários multicoloridos, lisérgicos e psicodélicos que fazem a ponte entre Pink Floyd e Tame Impala, sem escalas. E o mais legal: o quinteto jamais soa como algo apenas derivativo ou fruto de uma "modinha" que nada possa ter a acrescentar musicalmente - ainda que a base venha afundada por toneladas de efeitos que quase escondem os vocais, que trafegam entre o inglês e o português. Com personalidade, o grupo entrega um disco ao mesmo tempo garageiro, etéreo e inadvertidamente lúdico, como mostram os imperdíveis hits Rooftop e Plantinha.


19) Baleia (Atlas): existem disco que, de tão desafiadores, exigem muito mais do que uma ou duas audições para que todo o processo de criação executado pela banda/artista possa ser compreendido. É exatamente esse o caso do coletivo Baleia. Se com o inaugural Quebra Azul (2013), os arranjos um tanto mais acessíveis de canções pegajosas como Jiraya e Hiato (quase) possibilitavam aos cariocas a colocação nas paradas de sucesso da MPB, com o segundo registro, o que se tem é trabalho muito mais climático, de atmosfera densa e composto por canções repletas de reviravoltas, encaixes instrumentais surpreendentes e vocais levemente abafados, ainda que limpos em termos de produção. A banda chegou a admitir, em entrevista para a Revista Rolling Stone, uma eventual dificuldade para reproduzir as canções ao vivo. Não sei se isso ocorre. Agora, ouvir o disco, especialmente com um bom par de fones de ouvido, é um deleite.


18) Tássia Reis (Outra Esfera): o mais recente registro da paulistana tem apenas sete faixas e não chega a alcançar os 30 minutos de duração. Mas o formato é enxuto apenas nisso, já que a mensagem do disco é ampla e atualíssima. Especialmente em uma sociedade que parece a cada dia mais intolerante, preconceituosa e incapaz de entender o outro. Em seu trabalho, não são apenas as letras sobre empoderamento feminino, racismo e o cotidiano na comunidade que se sobressaem. A produção também é caprichada e embalada por ritmos diversos, como hip hop, soul, jazz e R&B e que combinam bem com a imagem multicolorida da capa. Sem se prender a um ou outro gênero, o disco utiliza-se ainda de uma roupagem mais pop e acessível, mas sem perder a potência dos versos paradoxalmente entoados pela voz adocicada de Tássia.


17) Séculos Apaixonados (O Ministério da Colocação): verdadeiro caldeirão sonoro e roqueiro dos anos 80, o segundo registro dos mineiros parece ainda mais melancólico - ainda que, em muitos casos, as excêntricas letras sobre o dia a dia ou a respeito de situações da vida nas grandes cidades, torne a experiência de ouvi-los paradoxalmente divertida. Medo da Cidade Quando Chove, com seu refrão autoexplicativo, parece alguma canção do Joy Division perdida em meio ao cancioneiro nacional. Referências ao RPM, ao Sidney Magal e até mesmo as músicas de auditório dos anos 80 (na ótima Dedo em Riste), fazem com que a banda trafegue no limite entre o rock soturno e a música boba de karaokê. Melhor mixado e muito mais limpo do que o primeiro registro, o igualmente ótimo Roupa Limpa, Figura Fantasmagórica, o segundo trabalho da Séculos, consolida a banda como uma das mais criativas da cena nacional.


16) Bruno Souto (Forte): Muito mais dançante, leve e comercial do que o inaugural Estado de Nuvem (2013), o mais recente e ótimo registro do cantor Bruno Souto apresenta uma curiosa dicotomia: versa sobre separação, mas utiliza-se de uma roupagem mais alegre e jovial. O que garante, sem sombra de dúvidas, alguns dos melhores e mais cataroláveis refrões desse ano - experimente ouvir a música que dá nome ao disco umas duas ou três vezes sem ficar com a sua letra em looping infinito na cabeça! Sem vergonha alguma de parecer excessivamente romântico ou até mesmo piegas, o artista utiliza a sua experiência pessoal como fonte para letras absolutamente confessionais, mas que versam sobre conflitos universais e românticos - o que facilita o ponto de encontro (e até de equilíbrio) com o ouvinte. É um álbum sóbrio, de produção limpa e caprichada e muito bom de ouvir. Ah, e sensível até o talo!


15) Jay Vaquer (Canções de Exílio): Produzido novamente pelo consagrado Moogie Canazio - indicado ao Grammy pelo disco anterior -, o presente registro amplia a habilidade ímpar do artista em entregar ao ouvinte uma produção cheia de nuances, algumas surpresas, letras desafiadoras (umas extremamente ácidas, outras de um romantismo sincero e pungente) e uma certa novidade em termos sonoros. Nunca a eletrônica foi tão bem trabalhada como neste álbum - oitavo da carreira de Vaquer, que parece trafegar no limite entre o mainstream e o alternativo -, de forma a complementar o teor pop rock das canções. Não bastasse isso, a produção caprichada e as letras muito acima da média do que se produz no Brasil atual, fazem deste lançamento talvez a obra mais bem acabada e concisa do artista até agora. [Resenha]


14) Baianasystem (Duas Cidades): verdadeiro caldeirão de referências culturais, com ritmos caribenhos, africanos e música regionalista e carnavalesca, o grupo baiano supera o grande desafio de realizar um conjunto de canções alegres, dançantes e contagiantes - ao menos do ponto de vista instrumental - mas sem deixar de lado os posicionamentos ideológicos e o debate acerca de diferenças sociais, investimentos imobiliários, racismo e outros temas da atualidade. E se há uma grande inovação em relação ao inaugural registro homônimo de 2010, ele está justamente na inclusão de mais versos e da presença de letras em quase todas as canções. "Tirem as construções da minha praia / Não consigo respirar" canta o MC Russo Passapusso, na ótima Lucro: Descomprimido. A potência e a efervescência urbana e urgente parece ser um grito que sai dos guetos.


13) Raça (Saboroso): existe algo meio desviado, meio torto, talvez até um tanto inexato na banda Raça que, como num paradoxo, torna a experiência de ouvi-los absolutamente prazerosa. Música não é uma ciência exata e, sabendo disso, o conjunto paulistano usa o mais puro rock'n roll, recheado de letras pungentes (e nostálgicas) como a matéria-prima para seus registros crus e diretos. Em relação ao inaugural Deu Branco (2014) há um claro "polimento" na produção, o que torna a audição ainda mais agradável. Ao voltar o seu olhar para o passado - a lancheira na capa e canções com títulos como É Pra Copiar? e Levado, não são por acaso - o quarteto ainda garante a identificação imediata por parte do ouvinte, que, certamente, não resistirá ao estilo autoirônico do grupo.



12) Guri Assis Brasil (Ressaca): embalado pelo hit Vou Me Mudar Pro Uruguai - uma das melhores e mais simpáticas canções do ano - o músico de Santana do Livramento (RS) abandona, ao menos em partes, a crueza melancólica pós-fim-de-relacionamento que caracterizava seu primeiro registro, Quando Calou-se a Multidão, para investir em elementos que vão para além da simples emulação de um rock regionalista (e romântico). Assim, se por um lado Guri se apresenta como uma espécie de "cronista do cotidiano", bem à moda de um Vitor Ramil reinventado - cantando sobre pés de laranjeiras pra regar, curvas de rio, nuvens cinzas, geadas no Sul do coração (e do mundo) e andorinhas - por outro, o acréscimo de efeitos eletrônicos, instrumentos variados e sintetizadores forma um amálgama sonoro que dialoga com estilos musicais variados, como a cúmbia, o bolero e o reggaetown. Um disco simples de ouvir. Direto. E irresistível.


11) Matheus Brant (Assume Que Gosta): E quem foi que disse que hipster não pode gostar de carnaval? Arrocha, axé, pagode, marchinha, sertanejo e outros estilos populares, formam a base do grande caldeirão de referências promovido pelo cantor que, aos moldes de outros de sua geração - como Rafael Castro e Jaloo - combinam ritmos reconhecidamente mais comerciais, com guitarras, violões ao estilo MPB, bateria bem marcada, psicodelia, dub e toneladas de sintetizadores. Algo capaz de jogar o trabalho para uma linha limítrofe entre a apresentação no programa do Faustão e a aparição em festivais de música alternativa. Não é por acaso que, já na abertura do disco, o artista convida os ouvintes a se despirem dos preconceitos, com o único propósito de se divertir "Assume que gosta de mim assim / Assim como gosta de um pagodinho / Me beija", brinca o cantor na inaugural canção homônima. Impossível ficar parado. [Resenha]


10) Juliana Perdigão (Ó): Existe algo de teatral na performance enérgica e cheia de personalidade da mineira Juliana Perdigão. Mais ou menos como se, ao escutar este maravilhoso registro, estivéssemos diante de uma instalação artística sonora, daquelas que somos inundados por imagens que se libertam da fluidez e da abstração, para se transformar em uma espécie de realidade formada apenas em nossa mente. Seja nos versos cheios de metáforas, elipses, hipérboles e outras tantas figuras de linguagem, seja no modo de cantar, capaz de emular artistas distintos como Elis Regina ou Ney Matogrosso, tudo parece uma grande homenagem a boa música, a canção como diversão e como entretenimento - mas sem esquecer o ponto de vista ideológico ou mesmo de "protesto" - com temas tão caros a atualidade. Que o diga a já clássica Hino da Alcova Libertina, disparada uma das melhores músicas do ano.


09) Terno Rei (Essa Noite Bateu Com um Sonho): E ouvi dizer / Você volta / As coisas que eu perdi, nunca voltam. Sucessor do melancólico Vigília, o segundo disco dos paulistas parece traspirar nostalgia e urbanidade em cada curva de seu som empoeirado, que emula o dream pop e o shoegaze na mesma medida. Se por um lado o registro nos faz lembrar, com sua guitarra característica, alguma sonoridade perdida em meados dos anos 80, por outro o álbum dialoga com artistas modernos e hypados como Lower Dens, War On Drugs e Kurt Vile. Tudo moldado pela personalidade de seus integrantes, que, de acordo com o vocalista e baixista Ale Sater, participaram muito mais da produção (e das composições), carregando na frieza desoladora e na melancolia íntima em cada detalhe do trabalho. Um disco desafiador, mas nunca difícil de uma das bandas mais promissoras da atualidade.


08) Luísa Maita (Fio da Memória): para quem ouviu Lero-Lero (2010), primeiro registro da cantora, a reação diante de Fio da Memória é de surpresa. Surprresa MUITO BOA, no caso. Deixando para trás o samba e outras sonoridades típicas da MPB, em seu segundo álbum Luísa investe em um som recheado por emanações eletrônicas, sintetizadores e efeitos, mas sem ignorar outras vertentes, como a música regionalista e até mesmo africana - como comprova a espetacular Around You e a sua percussão sensual. "Não queria de jeito nenhum fazer um Lero-Lero 2" afirmou a cantora em entrevista ao site Scream & Yell. O resultado é um trabalho absolutamente inovador, ainda que repleto de referências, com produção absolutamente limpa de Tejo Damasceno e Zé Nigro. Luísa já é conhecida internacionalmente - também por conta da presença de músicas na trilha do filme Boyhood, de Richard Linklater. Quem sabe com Fio da Memória, as portas também não se abram por aqui.


07) Metá Metá (MM3): ainda mais roqueiro e jazzístico que o anterior, MetaL MetaL (2012), a nova obra da banda de Juçara Marçal, Kiko Danucci e Thiago França mantem as tradicionais características - a brasilidade onipresente, o regionalismo tropical e o flerte com a música africana - ampliando ainda mais a visceralidade, o calor, a dramaticidade. Se na parte instrumental a percussão, a guitarra e o saxofone formam um conjunto harmônico de ampla potência, nas letras a impressão é de que o trio trafega sempre no limite entre o amor e a sensualidade, a paixão e a luxúria. São três amigos para matar / Mais doze santos pra apedrejar / Um grande amor a sodomizar / É, não deu, não dá canta Juçara na inaugural Três amigos, que quase resume o espírito dessa obra fundamental.



06) Mahmundi (Mahmundi): Final de verão / Fiz um hit pra entoar você. Curioso notar como o verso que inaugura o maravilhoso disco de estreia da carioca Mahmundi, bem poderia funcionar como um resumo daquilo que encontraremos em toda a obra: um disco por vezes ensolarado, com aquele "cheiro" de fim de tarde na praia, ou de noite quente em clima de romance. Assim são as características de um registro capaz de utilizar sintetizadores, teclados, linhas de baixo e guitarra, além de outros efeitinhos diversos, para entregar uma verdadeira coleção de canções absolutamente radiofônicas, refrescantes na medida certa e com refrões certeiros prontinhos para tocar nas rádios mais descoladas do País. Não à toa, o clima litorâneo à anos 80 pode ser percebido não apenas na sonoridade e nas letras, mas também na capa do registro e no nome das canções - Eterno Verão, Calor do Amor. [Resenha]



05) O Terno (Melhor do Que Parece): Funcionando como parte de um processo natural de amadurecimento dentro de sua ainda curta discografia, o terceiro registro dos paulistanos d'O Terno parece abandonar, ao menos em partes, o fraseado direto e até mesmo debochado, de seus trabalhos iniciais, para adotar um modelo um tanto mais sutil. Ainda que, é preciso que se diga, igualmente saboroso, divertido e amplo do ponto de vista dos significados, algo que pode ser percebido já na inaugural Culpa e sua letra autocomiserativa - Será que as coisas que eu faço / Penso que não têm problema / Na verdade são pecado / E é por isso que eu me sinto tão culpado? Ainda assim, longe de qualquer tipo de rótulo simplista, o caso é que, a cada novo disco, o trio se apresenta como uma das mais inventivas, criativas e potencialmente inovadoras bandas brasileiras da recém surgida safra que, hoje, se convencionou chamar de "Nova MPB". [Resenha]



04) Céu (Tropix): Céu já foi MPB direta, romântica e levemente regionalista (no homônimo disco de estreia, de 2005), samba com certa malemolência urbana, com um quê de malandragem, com cuícas, cavaquinhos e bandolins (Vagarosa, 2009) e retrô-empoeirado, meio dream pop urbano (Caravana Sereia Bloom, 2012). Como fio condutor sempre está a voz absolutamente melodiosa, em alguns momentos intimista, em outros mais expansiva, mas sempre incrivelmente afinada. Em Tropix, Céu investe em sons mais eletrônicos, com o uso de sintetizadores minimalistas, teclados sutis, efeitos levemente dançantes e outros barulhinhos que aparecem em cada curva do trabalho sempre de maneira discreta, apresentados com calma, sem correria. É um disco ao mesmo tempo sensível e sensual, com direito a uma abordagem sobre as relações e o distanciamento das pessoas na modernidade - como comprovam as ótimas Perfume do Invisível e Amor Pixelado. Para quem ainda não conhece, é a porta de entrada mais do que ideal. [Resenha]



03) Sabotage (Sabotage): é curioso notar como os versos potentes e repletos de significados de Mauro Mateus dos Santos - o rapper Sabotage, morto em janeiro de 2003 - ainda soam atualíssimos, especialmente diante do cenário de ódio, preconceito e intolerância que vivemos no País. E é justamente pior isso que esse disco póstumo, feito com a ajuda de um time de produtores e músicos que eram amigos do artista, não soa como uma mera e burocrática formalidade. Sabotage ainda tinha muito o que dizer e o resgate foi feito com delicadeza e respeito por Teja Damasceno e Rica Amabis (do Instituto), além de Daniel Ganjaman. "Levei quatro anos para abrir uma track e tentar ouvir a voz dele", lembra Damasceno em entrevista para a Revista Rolling Stone. O resultado é um registro ao mesmo tempo robusto e poético, que, se por um lado soa nostálgico por conta das referências da época - games como Sonic ou a novela O Clone - por outro encontra frescor em uma lírica que olha com atenção para a comunidade (no caso o Canão), para os pobres, oprimidos e outras pessoas a margem da sociedade. Um disco rico em sentidos que já nasce como um clássico moderno.



02) Carne Doce (Princesa): Enérgico. Cru. Visceral. Sanguíneo. Lânguido. Potente. Selvagem. Transgressor. São tantos os adjetivos possíveis para definir o segundo registro dos goianos do Carne Doce, que a impressão que se tem é a de que eles jamais serão suficientes. Se com o inaugural e homônimo disco de estreia lançado em 2014, o quinteto já foi o responsável por sacudir a cena independente nacional ao apresentar um registro que equilibrava a psicodelia bucólica com o clima intempestivo da urbe, com o mais recente lançamento toda e qualquer ideia explorada naquele trabalho parece agora ampliada, num exercício não apenas de maturidade mas também de sintonia entre os integrantes. E que resultam em uma nova coleção de canções que abandona, ao menos em partes, a dicotomia campo x cidade, para apostar muito mais em temas que envolvem a presença da mulher na sociedade, o empoderamento e o combate a misoginia. E certamente não é por acaso que a provocadora canção Falo (num dos melhores títulos de música em duplo sentido da história) brinca com esta condição em seus irretocáveis versos - Já tá cansado da minha voz porque / O tempo todo um timbre feminino é / Pra maioria algo enjoativo / Que tal se agora entrasse um homem aqui?. Nunca cansaremos. Da voz, do debate, da música. Ou desse disco, o melhor do ano com justiça. [Resenha]


01) Rashid (A Coragem da Luz): fosse "apenas" um disco de hip hop com letras potentes, rimas ferozes e um discurso atento a um mundo que se apresenta a cada dia mais preconceituoso, reacionária e intolerante, o álbum do mineiro Rashid já seria candidato natural a ser o melhor do ano. Mas o rapper não apenas realiza um trabalho de virtuosístico encaixe poético, raras vezes visto no canceioneiro nacional, como ainda faz transformando a sua música em algo acessível, comercial e até mesmo radiofônico. À moda de um Kendrick Lamar brasileiro, Rashid fala de preconceito racial (A Cena), sobre perda da inocência (Segunda-Feira) e sobre o abuso no uso da tecnologia (Laranja Mecânica), com domínio pleno dos assuntos, organizando cada letra como se fosse um verdadeiro artesão das palavras, algo digno dos melhores letristas do País da atualidade. E a música de Rashid não é apenas rap feroz, questionando governos, ideologias odiosas e instituições. É um amálgama musical em que, dependendo o trecho, podemos ser surpreendidos com perfumados arranjos que trafegam livremente pelos mais variados estilos, indo num instante da soul music ao rock, da bossa nova a música eletrônica, ou do jazz ao R&B. As toneladas de referências culturais - Breaking Bad, Pulp Fiction, Lupita N'Yongo, Graciliano Ramos, Jorge Lafond, Benjamin Button, Bee Gees - sempre surgem de maneira orgânica, sem forçação, integrando uma rima esperta, inteligente, ágil. Bom seria se músicos quadrados e parados no tempo, como Roger do Ultraje A Rigor e Lobão tomassem contato com um trabalho como este. Talvez pudesse servir como uma pequena aula sobre o Brasil de hoje. E sobre a música na atualidade. Um disco que já nasce moderno. E clássico.

E aí, pessoal? Gostaram da nossa lista! Sim, certamente muitas bandas e artistas que amamos ficaram de fora. Mas, comente conosco, quais os seus melhores do ano?