terça-feira, 17 de maio de 2016

Novidades em DVD - As Sufragistas (Sufragette)

De: Sarah Gavron. Com Carey Mulligan, Helena Bonham Carter, Meryl Streep e Brendam Gleeson. Drama, Reino Unido, 2015, 106 minutos.

"As mulheres não tem o temperamento calmo, nem o equilíbrio mental para exercitar o julgamento de assuntos políticos. Além disso, elas são bem representadas por pais, irmãos e maridos". Essa frase, que bem poderia ter sido dita na semana passada pelo presidente em exercício Michel Temer, quando da formação de seus ministérios, na verdade abre o filme As Sufragistas (Sufragette), da diretora Sarah Gavron. Ela refere-se ao pensamento dos legisladores - e dos homens em geral - do início do século passado, mais precisamente do ano de 1912, que não facultavam às mulheres britânicas da época o direito de exercer o sufrágio universal. Parece bizarro, mas esse era o pensamento em um período em que elas nasciam com o seu papel já determinado: ser "bela, recatada e do lar". Se bem que, tenho a impressão de ter lido algo parecido com isso, em algum lugar, não faz muitos dias.

Cansadas de mais de 50 anos de manifestações pacíficas, elas resolvem ir literalmente a luta. Por meio da coordenação de um grupo militante - comandado pela líder Emmeline Pankhurst (Streep, com pouco tempo em tela) -, que tem o objetivo de se fazer ouvir, a ordem do dia passam a ser os atos de insubordinação e desobediência, com direito a vidraças quebradas e caixas de correio queimadas. "Você quer que eu respeite a lei? Então torne a lei respeitável", afirma uma das protagonistas. Tudo para tentar chamar a atenção de políticos que possam aderir a causa e contribuir para a promulgação de uma emenda ou mesmo um projeto de Lei que possa garantir o exercício da cidadania a elas. Algo que, inicialmente, tem pouco resultado. Ainda mais em um tribunal recheado de homens velhos interessados apenas em saber qual o jantar feito pela "patroa" no turno da noite.




Entre as militantes está a jovem Maud Watts (Mulligan). Apesar de não possuir nenhuma formação política ela vai percebendo, com o passar do filme, que a causa delas é na verdade a de todas as mulheres. E não deixa de ser interessante o fato de haver, entre as próprias mulheres, aquelas que são contrárias ao movimento (o que faz com que lembremos da certeira frase de Simone de Beauvoir, que dizia que "o opressor não seria tão forte se não tivesse cúmplices entre os próprios oprimidos"). Nesse caso, o silêncio - por mais que este fosse fruto do medo - significava compactuar com um sistema em que as mulheres no mercado de trabalho ganhavam menos que os homens, exerciam suas atividades durante um período maior e ainda sofriam mais com doenças relacionadas ao esforço excessivo. Além de serem assediadas física e moralmente. E constantemente.

Nesse sentido, o maior mérito da obra talvez não esteja no fato de tornar o voto um mero formalismo de conquista para as mulheres - "o que o voto significaria?" pergunta um dos legisladores a Maud, que dá o seu testemunho. E sim apresentá-lo, nem que seja nas entrelinhas, como um instrumento capaz de modificar um sistema que sempre oprimiu, agrediu, ridicularizou, violentou e ignorou a importância das decisões políticas tendo por base a igualdade entre os gêneros. Não fosse isso e talvez jamais tivéssemos uma Presidenta. Ou mesmo mulheres participando de fóruns em associações e instituições, com liderança, se fazendo ouvir. E sendo respeitadas. Ainda que esta conquista tenha sido fruto de muito sangue derramado - e nesse sentido o filme não faz concessões ao mostrar as agressões às militantes, o que talvez explique a classificação indicativa de 16 anos.


Não bastasse a importância do debate, apresentado de maneira elegante pelo roteiro de Abi Morgan, a obra ainda conta com boas interpretações - além de Mulligan, Bonham Carter como outra sufragista, Gleeson como um repulsivo inspetor de polícia e Geoff Bell como o repugnante chefe de uma lavanderia, merecem destaque. A trilha sonora composta por Alexander Desplat também contribui para que a melancolia de algumas sequências não descambe para o melodrama barato. Em uma semana em que o governo Michel Temer acena com a possibilidade de extinção do Ministério das Mulheres, da Igualdade Racial, da Juventude e dos Direitos Humanos, o sinal de alerta deve estar permanentemente ligado. Voltar ao início do século passado por meio de atos totalitários e pouco democráticos seria promover o retrocesso que ninguém deseja.

Nota: 8,8

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