A jogada que deslocou o filme de Abreu para a disputa da estatueta dourada nesse ano tem a ver com o sistema de distribuição da obra em solo americano. A detentora dos direitos da película na terra do Tio Sam é a GKids - maior distribuidora de filmes de animação independentes do País e que tem batalhado forte para que o nosso "Menino dos Olhos" emplaque de vez nos Estados Unidos, como revelou matéria publicada pelo El País. Ainda que a briga seja no melhor estilo Davi e Golias - pra usar o surrado chavão - nos bastidores o sonho de bater os favoritos da noite é grande - além de Divertida Mente, ainda corre por fora Anomalisa, mais recente empreitada do diretor Charlie Kaufman, e que é defendido com unhas e dentes pela gigante Paramount Pictures. Ainda mais se levarmos em conta o fato de o filme já ter faturado 44 prêmios em festivais mundo afora - e isso com uma obra com orçamento de apenas 500 mil dólares. (Para efeito de comparação, o filme da Pixar custou US$ 200 milhões)
Se vamos ganhar, é coisa que só saberemos na noite do dia 28 de fevereiro. A disputa com gigantes do setor evidentemente é complicada - não à toa, nas bolsas de apostas o filme de Abreu aparece geralmente em quarto lugar, entre os favoritos. Mas vai saber, né? A GKids, com o seu rico catálogo, parece ter ótimo trânsito em Hollywood, de acordo com a mesma matéria do El País. Quem não se lembra, por exemplo, da vez em que Juan José Campanella bateu Michael Haneke, levando a estatueta na categoria Filme Estrangeiro com o seu imperdível O Segredo de Seus Olhos (2010)? E isso que o favoritíssimo, na ocasião, era o incensado A Fita Branca (2010), do austríaco. Enfim, são coisas que eventualmente acontecem e que enchem nossos surrados corações cinéfilos de esperanças!
Mas ganhar, vamos combinar, agora é detalhe! O Menino e O Mundo, com sua história ao mesmo tempo singela e realista - e que mostra um jovem garoto do interior que vê seu pai migrar para a cidade grande atrás de melhores oportunidades, perseguindo-o incansavelmente, logo após, movido pelo sentimento demasiado humano da saudade - deve ser vista por todos. É uma obra tocante, doce, que mostra a transição forçada de um jovem para a fase adulta, ocasião em que irá descobrir da maneira mais melancólica possível como sobrevive uma sociedade (doente) em que a ordem do dia é consumir. É ter, ter e ter. É viver pensando em si e no seu umbigo. E mostrar para os outros que tem, num ciclo de espetacularização da vida em que pouco importa se, logo ao lado, outros passarão fome. Ou não terão emprego. O que importa é o número. E a geração de divisas. Em uma emblemática cena, o jovem acompanha a poluição acachapante e desvairada que caudalosamente toma conta de todo um ecossistema, inclusive dos rios - fruto de um sistema que premia poucos e que ainda é aplaudido por muitos. Alguém aí lembrou de algum evento real que seja parecido?
Claro, há gente boa lá no meio e será a essas pessoas que o menino se apegará em sua jornada, em um filme que, além de divertir e inundar os olhos pela riqueza de detalhes do trabalho - a forma como o rapaz "guarda" na sua mente as notas musicais tocadas pelo pai na época de sua infância é daquelas que ficarão na memória para sempre -, ainda fará pensar, como poucas animações são capazes de fazer. E, ainda por cima, o filme ainda possui uma matadora trilha sonora do Emicida, nosso primeiro colocado entre os Melhores Discos Nacionais de 2015!
Nenhum comentário:
Postar um comentário