sexta-feira, 31 de julho de 2015

Pérolas do Netflix - Cartas ao Padre Jacob

De: Klaus Härö. Com Heikki Nousiainen, Kaarina Hazard e Jukka Keinonen. Drama, Finlândia, 2009, 75 minutos.

Poucos filmes vão se encaixar tão bem na nossa categoria de Pérolas do Netflix, quanto essa pequena preciosidade do cinema finlandês chamada Cartas ao Padre Jacob (Postia Pappa Jaakobille) - para encontrá-lo na plataforma de streaming, procure pelo título em inglês Letters to Father Jacob. Se trata de uma obra ao melhor estilo da tradição europeia, especialmente daquela relacionada aos países nórdicos - não chegando a ser uma surpresa pensarmos imediatamente em Bergman conforme a fita se desenrola. O Padre Jacob em questão é um sacerdote cego que vive isolado em algum lugar do interior da Finlândia. Por conta da deficiência visual, ele "contrata" uma ex-presidiária, chamada Leila, que lhe auxiliará na leitura de dezenas de cartas que chegam até ele, com o objetivo de ter como resposta uma palavra de conforto ou a simples indicação de um caminho a ser seguido.

Os pedidos ao presbítero podem ser os mais banais, podendo estar relacionados a um filho que anda tendo dificuldades na escola, até os mais complicados, como o de alguma mulher angustiada com o marido que terá de encarar a realidade da guerra. À nova pupila, o padre explica que as cartas possuem pedidos de intermediação, com a intenção de acercar ou de aproximar a Deus, todos aqueles que lhe escrevem. "É bom que as pessoas saibam que não há nenhum filho Dele esquecido ou inútil, sendo todos àqueles com pedidos de misericórdia divina bem recebidos", explica o sacerdote. Mas nem tudo são flores na relação entre o Padre e Leila. O trabalho rotineiro - e de propósito questionável, ao menos para a mulher - fará com que Leila esconda algumas cartas, comprometendo as ações do Padre que, no fim das contas, não consegue enxergar tudo o que ela está fazendo.


O fato de ser ex-presidiária - Leila estava encarcerada por conta de um assassinato - também gerará dúvidas a respeito do caráter e da índole da nova moradora. E é justamente o clima de tensão permanente, existente em cada movimento feito por Leila em meio as árvores do jardim ou junto aos grandes cômodos da casa, que será capaz de gerar um surpreendente clima de suspense na curiosa relação entre a dupla. Algo que é reforçado pela desconfiança do carteiro que, diariamente, aparece na propriedade para entregar as novas correspondências a Jacob - o que serve também para dar uma dimensão da liderança exercida por um presbítero em uma comunidade. E, nesse sentido, o filme terá especial significado para aqueles que possuem a religião como parte importante de suas vidas - o que não impede, evidentemente, que a obra seja apreciada por todos os públicos.

Com cenários exuberantes - alguns são tão bonitos que chegam a parecer pinturas - e trilha sonora muito bem escolhida - com composições de nomes como Offenbach, Chopin, Beethoven e Haydn - essa pequena pérola é diminuta até no tamanho: 75 minutos. Como é de praxe no cinema europeu, não vemos rostos bonitos ou corpos esculturais e muito menos imagens feitas em computador. A força de uma película desse tipo está nas interpretações naturalistas, nos silêncios que muito dizem, na trilha bem pontuada, nas emanações singelas, na delicadeza dos gestos, no olhar tocante. Jacob e Leila construirão uma impactante trajetória juntos até o magnético e surpreendente desfecho, que não precisará de grandes reviravoltas ou soluções estapafúrdias para deixar qualquer espectador arrebatado. Uma pequena aula de cinema.


quinta-feira, 30 de julho de 2015

Disco da Semana - Kacey Musgraves (Pageant Material)

Quando se faz a análise de um produto cultural, qualquer que seja, é preciso que se separe, fundamentalmente, o gosto pessoal do resultado daquilo que está sendo avaliado. Por exemplo, eu não gosto de heavy metal. Mas nem por isso eu ignorarei as virtudes de algum eventual novo disco do Megadeth ou do Slayer, apenas por não apreciar o estilo. O mesmo vale para o cinema. Sempre fico com um pé atrás em relação aos filmes de terror. Não sou muito dessa categoria, apesar de saber da existência de excelentes obras no segmento. Mas vou avaliá-las mal por isso? A nota será menor do que cinco, invariavelmente? Evidentemente que não e eu até nem procuro fazer muitas análises do gênero por aqui, justamente para que o produto final não fique comprometido pela subjetividade que, vamos combinar, pouco contribui nesse processo.

Bom, e o que todo esse blablablá - até parece que quem está falando aqui é um crítico DE VERDADE - tem a ver com o novo disco da cantora americana Kacey Musgraves - segundo, depois do elogiado Same Trailer Diferent Park, de 2013 -, intitulado Pageant Material? Bom, trata-se do mais puro sertanejo - ou country, se preferirem - americano. E não é só isso: de quebra, a texana ainda é resultado de um reality show para escolher artistas novatos (nos moldes do tal Superstar da Rede Globo), no caso o programa Nashville Stars, exibido pelo canal USA Networks. Bom, dado todo esse contexto, você, leitor médio (um dos seis) do Picanha já deve estar pensando: deve ser uma M****, certo? Errado. Aliás, muito errado! Kacey não apenas envolve e aconchega com sua voz doce, com seu canto melodioso e de refrões fáceis, como ainda concebe um daqueles discos que, sem exagero, tem tudo para figurar em listas de melhores do ano.



E, vejam bem, aqui está falando alguém que não é lá muito chegado no estilo (brasileiro), hoje conhecido por sertanejo universitário. Mas o que Kacey faz está muito distante daquele clima "vou pra balada pegar (e beber todas), tô solteiro mas tô feliz, não me quis, tem quem queira" - por favor, não me levem a mal os amigos que gostam! Digamos que  a artista estaria muito mais uma Paula Fernandes. Mas com MUITAS doses a mais de Johnny Cash, Loretta Lynn, Emmylou Harris ou mesmo Bob Dylan (não conjunto da obra, mas nos detalhes). Ou, até mais recentemente, nomes Shania Twain, Taylor Swift e Lady Antebellum, da qual Kacey abriu shows, em início de carreira, quando da realização de turnês pelo Reino Unido. Como boa texana, a compositora não apenas se apropria das referências, como as transforma em um produto absolutamente irresistível, daqueles capazes de te acompanhar por horas e horas de audições.

Faça um teste: pegue uma canção como Biscuits - a primeira de trabalho - que tem aquele clima de rodeião do interior, com letra divertida e esperta e experimente ficar alheio. É absolutamente impossível. Musgraves abraça o ouvinte. O convida a participar, alternando momentos mais melancólicos ou reflexivos, como em Fine ou Family is Family, com outros mais movimentados e igualmente belos e magnéticos, como Dime Store Girl, Late to the Party e a já citada Biscuits. O clima rural - que chega a fazer lembrar algumas composições de veteranos como John Denver ou Neil Young - está presente não apenas nos violões, mas em todos os arranjos, letras e trabalho vocal. É divertido, leve, radiofônico e sem perder a elegância. E tem sido bem recebido pela crítica em geral - o Pitchfork, sempre tão exigente, deu nota 8,0. O Miojo Indie, 8,5. E, nós, aqui no Picanha, assinamos embaixo.

Nota: 8,5

quarta-feira, 29 de julho de 2015

Cinema - Pixels

De: Chris Columbus. Com Adam Sandlerm Michelle Monagham, Kevin James e Peter Dinklage. Ficção Científica / Ação / Comédia / Aventura, 2015, EUA, 106 minutos.

A premissa do recém lançado Pixels (Pixels), não poderia ser mais divertida: uma raça alienígena resolve invadir a terra utilizando monstros digitais, tendo por base videogames clássicos dos anos 80 - como Atari 2600 ou CCE. Ou seja, de uma hora para a outra, os seres humanos passam a ser perseguidos pelas pequenas naves do game Space Invaders, pelo gorila do Donkey Kong, ou mesmo por versões gigantes do Pac Man que, com sua habitual voracidade, atropelam (ou comem) tudo aquilo que veem pela frente. Isso ocorre pelo fato de a Nasa - sempre ela! -, ainda nos anos 80, enviar para os satélites dispostos no espaço, uma série de imagens e sons do que seria a cultura daquela época, com o objetivo de estabelecer algum contato. Um contato amistoso, claro, algo que acaba sendo mal interpretado pelos aliens que recebem a mensagem.

Na realidade o filme, dirigido por Chris Columbus - que, poucos, lembram, mas foi o responsável por ótimas comédias como Uma Babá Quase Perfeita e Esqueceram de Mim - inicia nos anos 80, mais especificamente em uma casa de jogos de fliperama, algo que era tradicional na época. Entre audições de Tears for Fears e brincadeiras de pogobol, a gurizada disputava batalhas entre si, para ver quem era o melhor jogador de videogame. Numa dessas competições, o jovem Sam Brenner (que na vida adulta será vivido pelo Adam Sandler) perde para Eddie Plant (Peter Dinklage, em divertido papel). Um salto no tempo nos mostrará um Brenner que, nos dias atuais, trabalha instalando equipamentos eletrônicos e um Eddie Plant preso por falcatruas envolvendo a invasão hacker de sistemas de grandes organizações.



Mas será justamente desses dois losers, aliados ainda a um terceiro, o nerd Ludlow Lamonsoff (o hilário Josh Gad), que o governo americano precisará, diante da "terrível ameaça" que se estabelece. Brenner é amigo do presidente (interpretado por um caricato Kevin James), o que facilita a negociação para que os nerds tomem a frente da batalha contra o mal. Ainda que a tenente-coronel Van Patten (Michelle Monagham), fique meio contrariada - o que só será pretexto para uma futura aproximação entre o casal de protagonistas. O filme não perde tempo com grandes explicações científicas sobre o tipo de armamento que deve ser usado para aniquilar os inimigos ou sobre qualquer eventual complexidade em sua construção, dado o pouco tempo, partindo direto para as batalhas (são cinco no total), para o deleite do público.

Aliás, aí reside o maior ponto positivo da película - que certamente fará sucesso em futuras sessões da tarde: as cenas de ação são espetaculares, sendo a batalha dentro do jogo Centipede (o da centopeia), uma das mais legais. Ainda que a cena da grande invasão da cidade seja meio confusa , especialmente para quem fica ansioso para identificar quais são os personagens dos jogos que aparecem, o resultado geral é muito satisfatório. A obra tem boas piadas - o treinamento de Ludlow com os soldados é engraçadíssima - e peca, curiosamente, pelos excessos românticos no terço final. Ah, e também não é recomendado esperar grandes arroubos criativos do roteiro. A maior criatividade está na recriação da época ou mesmo nas soluções para as interações entre as peças de cada jogo com os elementos da vida real - a cena do Tetris, nesse sentido, é marcante. Para os saudosistas de plantão, valerá cada segundo.

Nota: 6,5


terça-feira, 28 de julho de 2015

PicanhaCast 23/07/2015

Um apanhado da semana no nosso mais recente Picanha Cast! Entre os destaques, falamos um pouco do nosso Top 10 especial para o Dia do Rock, o novo do Tame Impala e o imperdível filme nacional O Som ao Redor, que foi a nossa Pérola do Netflix da semana. O bate-papo rolou na última quinta-feira (23/07), dentro do programa Enciclopédia 95 & 1 da Rádio Univates, capitaneado pelo meu xará, Tiago Segabinazzi.

Confere lá!

Lançamento de Videoclipe - Weezer (Go Away)

Os americanos do Weezer seguem em plena campanha de divulgação do mais recente disco, o simpático Everything Will Be Alright In the End, lançado no final do ano passado. Por conta disso, a banda disponibilizou, na última semana, um videoclipe para a música Go Away, que faz parte do registro. No vídeo, Rivers Cuomo e seus comparsas do grupo tiram uma onda com o Tinder, popular aplicativo utilizado para, digamos, conhecer e encontrar novas pessoas para futuros relacionamentos. Na história, o personagem principal faz de tudo para conquistar a amada - a bela Bethany Cosentino, vocalista e guitarrista dos californianos do Best Coast, que participa da música. Dá o play e confere!



segunda-feira, 27 de julho de 2015

Novidades em DVD - Sem Direito a Resgate

De: Daniel Schechter. Com Jennifer Aniston, Tim Robbins, Yasinn Bey, John Hawkes, Isla Fisher e Will Forte. Comédia / Policial, EUA, 2015, 100 minutos.

Sendo bastante generoso na análise é possível dizer que esse Sem Direito a Resgate (Life of Crime), recém chegado lançamento em DVD do diretor estreante Daniel Schechter, faz lembrar bastante as comédias malucas dos Irmãos Coen - casos de Queime Depois de Ler, Matadores de Velhinhas e, especialmente, Fargo. Isso pela quantidade de personagens absolutamente sem-noção, a que somos apresentados na película. Na trama, Jennifer Aniston - bem distante das caras e bocas que faz nas comédias convencionais - é a socialite Mickey Dawson, que é sequestrada pela dupla Ordell (Yassin Bey, aliás, o novo nome artístico do ator Mos Def) e Louis (o sempre ótimo John Hawkes), com o objetivo de fazer com que o seu marido, o ricaço Frank Dawson (Tim Robbins) pague US$ 1 milhão pelo resgate da "patroa".

O problema - e é nesse ponto que os sequestradores erram completamente o pulo - é que o casamento de Frank e Mickey já não andava lá aquelas coisas, não parecendo ser algo tão urgente para o marido, a negociação para ter a esposa de volta. Ao contrário, em viagem à Europa, Frank encontra a amante (a bela Isla Fisher) justamente para anunciar a ela a pretensão de dar encaminhamento a papelada para o divórcio. Dado esse contexto, como negociar para que ninguém saia perdendo? A situação inesperada e os dias que passam sem uma solução para o caso, fazem com que os bandidos bolem algumas estratégias para (tentar) sensibilizar Frank. Mas nada que soe muito efetivo, dada a inexperiência da dupla que, não querendo prejudicar Mickey, também fica sem saber o quê exatamente fazer com ela.



O resultado dessa convivência forçada entre sequestradores e vítima, faz com Louis e Mickey se aproximem, estabelecendo uma curiosa "amizade". Ao passo que o terceiro braço do grupo de bandidos, o nazista (com direito a foto de Hitler na parede e tudo) Richard Monk (Mark Boone Junior) - aquele tipo de sujeito que acredita que tudo se resolve na base da bala, ainda que seja em nome de Deus -, se mostra bastante desconfortável com a situação. Ainda que a trama seja divertida, curiosa e renda boas cenas, é preciso que se se diga que parece faltar na obra de Schechter, justamente uma pegada de "irmão Coen". Sabe-se que esse tipo de comparativo dificilmente aponta para uma solução definitiva, mas aquilo que nos filmes dos famosos irmãos é nonsense ou absurdo, nesta película é apenas enfado - e até o muito citado "surpreendente" final, acaba soando meio deslocado.

Evidentemente a obra tem virtudes. O elenco, primoroso, se esforça para entregar o melhor de si nas interpretações, ainda que estejam diante de um material apenas médio. John Hawkes, como sempre é o destaque e, com seu estilo sempre cativante, faz com que torçamos para que ele se saia bem. Robbins, Aniston, Fisher e os demais fazem o básico do básico, sem muito esforços. O único que parece realmente deslocado é o talentosíssimo Will Forte, que interpreta um candidato a amante de Mickey, que acaba flagrando os bandidos em ação. E que pouco pode fazer na solução do caso. As cenas dos bandidos aguardando os noticiários da noite (e se frustrando!) pra ver se algo sobre o sequestro sai na mídia, são engraçadas e a recriação dos anos 70 é correta (ainda que o figurino pouco ajude). Mas acaba sendo insuficiente, no conjunto da obra.

Nota: 6,0


sexta-feira, 24 de julho de 2015

4 Considerações Sobre o Show Acústico Sucateiro da Banda Apanhador Só

Antes de mais nada, é preciso elogiar a iniciativa do professor - e publicitário e músico e pai de família - Rodrigo Brod, por ter tido a sacada de trazer para Lajeado, pela primeira vez, o show Acústico Sucateiro, parte da turnê nacional Na Sala de Estar, da banda gaúcha Apanhador Só. A ideia surgiu no período em que o grupo levantava grana por meio de financiamento coletivo - no site Catarse -, para a realização da turnê e para a gravação de um novo álbum, algo que deverá ter início entre o final de 2016 e o começo de 2017. Ter uma apresentação exclusiva, em tom intimista, era uma das dezenas de recompensas bacanas que a banda de Alexandre Kumpinski e companhia estava oferecendo, para quem colaborasse no projeto. E por um preço, vamos combinar, que é quase uma piada: R$ 750 por duas horas de apresentação, de diversão, de bate-papo descontraído, de um clima leve e pra cima.

Como forma de viabilizar o evento, Mestre Brod - e sua fiel escudeira Fernanda, não esqueçamos - convocou cerca de 30 amigos que, ele sabia, poderiam abraçar essa nobre causa. De preferência aqueles identificados com o som dos caras, conhecidíssimos em qualquer canto do Estado pelos hits (!) Líquido Preto e Nescafé. Foi o que aconteceu. Pra sorte, nós, do Picanha, estávamos entre os selecionados - o amigo Henrique, que foi quem me apresentou o trabalho da Apanhador, evidentemente, também estava presente. E agora, com esse nosso pequeno Top 5, a gente relata um pouco do que foi essa magnífica noite. (Em tempo, a banda Apanhador Só fará apresentação no dia 11 de agosto, na Univates, a princípio apenas para estudantes da Instituição de ensino. A princípio, já que a ideia é botar uma pressão pra que esse evento seja aberto ao público em geral)




1) Os caras são uma simpatia sem fim. Antes da chegada deles à casa do Rodrigo, o sentimento de muitos - especialmente daqueles não tão familiarizados, eu, entre eles - era o de bah, como será que eles são?, vão chegar aqui, vão passar reto e vão direto tocar?, vão conversar? cumprimentar? vão ser rockstar do nariz empinado ou pessoas simples? Pois a banda chegou, colocou os instrumentos e equipamentos no lugar e passou por TODAS AS PESSOAS do ambiente, cumprimentado-as uma a uma. Agradecendo por estar ali. Ouvindo, conversando. Se mostrando genuinamente interessados  com as histórias de cada um. Tudo isso só serviu para aumentar o sentimento positivo em relação ao que seria a noite (início da madrugada).

2) Repertório na humildade. A abertura com a ótima e animada Prédio - não é o prédio que táááá caindo - serviu apenas para apresentar a banda, a proposta, o tipo de sonoridade que embasaria o espetáculo. A partir daí, a ideia era tocar somente aquilo que o pessoal pedia. Nescafé gritou alguém do fundo. Rota mencionou outro. Cartão Postal sugeriu mais alguém. E assim a noite foi avançando, com o quarteto executando prontamente tudo aquilo que era solicitado. Quando se esgotaram todas as canções possíveis, houve tempo para um bis com dois repetecos. E, para meu gosto, um dos momentos mais legais foi Vila do Meio Dia, pela possibilidade de todo o povo acompanhar os animadíssimos laialaialaiás!

3) Interação com o público. Além da generosidade em relação ao repertório, a banda ainda teve disposição para responder perguntas feitas pelos fãs, independentemente do grau de elaboração de cada questionamento. Kumpinski até fez um elogio a relativa "profundidade" de algumas perguntas, brincando com o fato de ser muito melhor atender a esse tipo de dúvida mais natural e não apenas aquelas pautadas por alguma eventual pesquisa no Google. A respeito da interação, a canção Nado rendeu um dos momentos mais divertidos - e caóticos, claro! - com o público auxiliando (ou seria atrapalhando?) a banda com os instrumentos.

4) A propósito dos instrumentos desse formato, eles são um espetáculo a parte - com o perdão do redundante lugar-comum. A inevitável roda de triciclo, panela velha, apito, ralador de queijo, pianinho e brinquedo, conduítes elétricos e toda a sorte de utensílios domésticos ou badulaques que possam gerar alguma sonoridade inventiva, mas útil no contexto, foram utilizadas. O mais impressionante foi o fato de, mesmo tocando nesse formato, conseguir repetir fielmente aquilo que os fãs estão acostumados a ouvir nos álbuns. A canção Lá em Casa tá Pegando Fogo - com os músicos divertindo a plateia ao ir tocar junto a escada que dá acesso ao segundo andar da casa, por conta de um favorável reverb -, por exemplo, ficou absolutamente igual. E isso que é ela cheia de elementos.

Enfim, uma noite que certamente ficará marcada para todos os que estiveram lá. Por esses e por mais tantos motivos!

quarta-feira, 22 de julho de 2015

Disco da Semana - Tame Impala (Currents)

Tão legal quando ouvir os discos dos australianos do Tame Impala é ver as manifestações e reações daqueles que gostam da banda, a cada nova música, disco, videoclipe ou qualquer que seja o material lançado pelo grupo. Nooossa, esse som quase me faz ter a sensação de tocar no céu em um dia limpo, garante uma fã empolgada. Essa música é tipo amor a primeira vista, filosofa outra. Quando ouço, tenho a sensação de estar voando, complementa um terceiro. E assim vai o clima, não apenas nos dois trabalhos lançados anteriormente - os fundamentais Innerspeaker (2010) e Lonerism (2012) - mas também no recém chegado Currents. A magia é tanta entre os adeptos que a internet, universo usualmente povoado por haters, quase vai na contramão do mundo, ao possibilitar uma troca de ideias saudável, empática e quase idílica entre os envolvidos.

Tudo isso é efeito do carinho com que o vocalista Kevin Parker e seus comparsas tratam as suas composições, não olhando a elas como um veículo para o exercício de ideias individualistas ou sectárias e, sim, como manifestação artística capaz de agregar e de gerar em quem dela se apropria os mais variados sentimentos. De preferência os mais positivos, não sendo poucos os casos em que visualizamos, apenas ao ouvir os arranjos extremamente bem elaborados feitos com guitarra, baixo, bateria e sintetizadores, um eventual caminho para litoral, ou mesmo um passeio em meio a natureza, em uma estrada do interior. Algo que outros artistas modernos, como os norte-americanos do Real Estate e até mesmo nacionais, como o capixaba SILVA - especialmente em seu mais recente trabalho, Vista pro Mar -, já o fizeram, não dá pra negar, com igual qualidade.


A propósito, muitas são as comparações feitas com grandes bandas clássicas como The Beatles, na fase Sgt. Pepper's, ou mesmo Pink Floyd, no psicodélico Dark Side of the Moon. Outros artistas como Tears for Fears, Michael Jackson, Flaming Lips e, mais recentemente, Toro Y Moi, costumam aparecer entre as referências, na hora de situar a condição artística da banda. Mas é preciso que se diga que o Tame Impala tem personalidade, ainda que beba de qualquer uma dessas fontes na hora de organizar as suas primorosas harmonias - capazes de conduzir o ouvinte a um ambiente aconchegante e familiar, ainda que lisérgico. E isso ocorre justamente pelo fato de o grupo nunca soar ultrapassado ou preso a uma época hoje já distante daqueles que lhe servem como fonte. Seja por uma atualização sonora em um verso aqui, seja por um verniz mais arrojado em um arranjo acolá.

E isso também pode ser notado nas letras que, ainda que na aparência possam sugerir alguma simplicidade - especialmente pelo seu caráter popíssimo, de refrãos altamente grudentos -, no fundo reservam alguma reflexão mais profunda sobre temas como amor e vida cotidiana. Algo que pode ser percebido, por exemplo, na já clássica Cause I'm Man, em que o interlocutor pede desculpas, simplesmente por "ser homem" (Cause I'm a man, woman / Don't always think before I do / Cause I'm a man, woman / That's the only answer I've got for you). Em geral pautada pela melancolia  (The Less I Know the Better, Yes I'm Changing, Let It Happen), aparentemente mais intensa que nos trabalhos anteriores, a obra vai crescendo a cada audição. E, ao passo que nos faz viajar, também nos faz entender o por quê de o Tame Impala ser, hoje, uma das grandes bandas da atualidade.

Nota: 8,5

terça-feira, 21 de julho de 2015

Pérolas do Netflix - O Som ao Redor

De: Kléber Mendonça Filho. Com Irandhir Santos, Gustavo Jahn, Maeve Jinkings, Waldemar José Solha. Drama / Suspense, Brasil, 2012, 130 minutos.

Já dizia o professor e pensador brasileiro José Hermógenes: "Silêncio, em verdade não é ausência de som. Silêncio é a voz de Deus. Aprende dele." Pois quantas vezes em nosso corrido dia a dia conseguimos "ouvir" a idílica "voz de Deus", professada na frase acima? Diria que NUNCA. Os barulhos de nosso cotidiano podem ser os mais diversos: carros de som fazendo intermináveis propagandas do circo que chega a cidade, o pedreiro que martela incessantemente na construção ao lado, o vendedor que grita as maravilhas atribuídas ao seu produto, os cachorros que latem, as crianças que brincam, a música que vem de longe. O som definitivamente está ao nosso redor. Faz parte da nossa vida. E, nessa verdadeira pérola do cinema nacional, ganha ainda mais significado.

Assim, nas aparências, O Som ao Redor - disponibilizado nesse mês na plataforma de streaming Netflix - não tem uma história com começo, meio e fim, como estamos acostumados. Ainda que seja recheado de possibilidades, de reflexões, de nuances. Uma das personagens, por exemplo, é Bia (Jinkings), que passa as noites em claro pelo fato de o cachorro do vizinho ao lado não sossegar, por um instante que seja. Como atitude extrema, ela colocará um comprimido em meio a um pedaço de carne, com a intenção de fazer o animal dormir. Tudo para que ela também descanse, ainda que seu cotidiano de dona de casa da classe média, tenha como atividades mais interessantes as lidas domésticas - que definitivamente lhe dão algum prazer - e os cuidados com os dois filhos.


Outro personagem é o corretor de moveis João (Gustavo Jahn), que percebe que o carro da futura namorada foi arrombado, na noite em que ela fica com ele. Aliás, é a (aparente) onda de violência que faz com que João, Bia e outros moradores aceitem contratar uma espécie de equipe de segurança para tomar conta do condomínio. Comandados por Clodoaldo (o sempre ótima Irandhir Santos), os vigilantes vão armar a sua base em uma das esquinas do bairro, ganhando até mesmo a simpatia do veterano Francisco (Solha) - que funciona como espécie de Seu Barriga do local. É claro que a presença dos seguranças não garantirá a tão desejada paz dos moradores, que, no fim, desconfiam de tudo e de todos. Mas fará com que pequenos delitos ou mesmo presenças indesejadas da madrugada sejam coibidas.

A película discute uma série de questões, entre elas, a relação entre patrão e empregado, a sensação de solidão e de isolamento dos dias de hoje, o medo nas grandes cidades, o individualismo, o temor de que algo ruim possa acontecer - mesmo que nada aconteça, de fato. Nesse sentido, a obra do curta-metragista e crítico de cinema Kleber Mendonça Filho, se assemelha a outras, como o magnífico Caché, do diretor Michael Haneke. Mesmo sem gritar a sua intenção, Mendonça Filho registra os seus personagens com foco nos detalhes relativos a prisão particular vivenciada por cada um deles, que passam os seus dias entre muros altos, cercas elétricas e cachorros latindo. Com ecos de O Pagamento Final e do ótimo argentino O Homem ao Lado, o filme, que utiliza um angustiante e surpreendente som diegético, é econômico em sua carga dramática, ainda que passe o recado. E ainda conta com uma improvável e divertida cena de reunião de condomínio.


Lançamento de Videoclipe - Marcelo Jeneci (Um de Nós)

O cantor, compositor e multi-instrumentista Marcelo Jeneci - um dos favoritos aqui da casa - lançou recentemente um videoclipe para a canção Um de Nós, presente no último disco, o elogiadíssimo De Graça, de 2013. Em formato de animação e com temática futurista, o vídeo é dirigido, ilustrado e animado por Fabrício Lima. Nas palavras do próprio, o personagem de Jeneci, no clipe "percebe as respostas que o Universo está concentrado nele mesmo ao constatar que uma galáxia existia em seu próprio corpo”. Singelo, delicado e inteligente. Como costuma ser a obra do artista. Confira abaixo o resultado!


segunda-feira, 20 de julho de 2015

Novidades em DVD - Refúgio do Medo

De: Brad Anderson. Com Kate Beckinsale, Jim Sturgess, Michael Caine e Ben Kingsley. Suspense, EUA, 2014, 108 minutos.

Se você gostou de filmes como Ilha do Medo, de Martin Scorsese, ou mesmo Um Método Perigoso, de David Cronenberg, é muito provável que você vá apreciar a sessão do recém-lançado em DVD, Refúgio do Medo (Stonehearst Asylum). Não que a obra do diretor Brad Anderson - do surpreendente O Operário e do previsível Chamada de Emergência - tenha a qualidade de ambas as películas citadas anteriormente. Mas é preciso que se diga: possui o mesmo clima de mistério, a fotografia acinzentada (e o nevoeiro!), personagens envolventes, história de época e uma ou outra reviravolta na hora de arrematar o roteiro. Além do bom elenco, encabeçado por veteranos como Ben Kingsley, Michael Caine e Brendan Gleeson.

Na trama, Jim Sturgess é o recém diplomado médico Edward Newgate, que é enviado a um sanatório (o tal asilo Stonehearst, do título), para acompanhar de perto o trabalho realizado pelos médicos locais, o que poderá servir como uma espécie de estágio que complemente seus estudos. Ao chegar ao local, Edward é recebido por um certo doutor Silas Lamb (Kingsley), que logo se apresentará como um profissional que se utiliza de métodos bastante inclusivos para o tratamento de seus pacientes. Explico: ao invés de entupir os internos de medicamentos - como era não apenas na época, mas até os dias de hoje - Lamb prefere estimular os doentes por meio da exploração de suas potencialidades. Se uma mulher é tida como louca, mas gosta de tocar piano, bom, que toque piano como parte do tratamento.


Inicialmente, Edward considera o sistema bastante curioso, já que, no final do século 19, esse não costumava ser o padrão. Ao contrário, o desconhecimento a respeito das doenças mentais - fossem elas histerias, demências, melancolias ou loucuras - era suficiente para acometer aqueles que sofriam desses males a verdadeiras torturas, não sendo incomuns a aplicação de banhos gelados, camisas de força, máquina para promover náuseas e toda a sorte de flagelos. Isso sem contar a humilhação pública daqueles que eram tidos como insanos, que eram apresentados a plateias e que serviam, no fim das contas, como veículo para mero estímulo de um comportamento misógino, xenófobo, preconceituoso e machista, daqueles que os "dominavam". E que pouco contribuíam para uma eventual cura dos envolvidos.

Ainda que soe pesada, a obra não deixa de ter momentos de romance - Edward, inevitavelmente, se apaixonará por uma interna - e de humor, como na parte em que Eliza Graves (Beckinsale) brinca com Edward ao dizer: "tem certeza de que você é um médico? Pois eu nunca vi um que pedisse desculpas". Em meio ao clima "paz e amor" instituído por Silas Lamb - que usa frases de efeito como "meu método terapêutico visa a dar as boas almas um pouco de esperança e bondade" - Edward descobrirá, com o passar do filme, a realidade por trás do sanatório Stonehearst. No começo da sessão aparece a frase "não acredite em nada do que você ouve e apenas a metade do que você vê". Aí pode estar a chave para o espectador mais atento descobrir qual o mistério do local. Mas esse é apenas um detalhe.

Nota: 7,5

quinta-feira, 16 de julho de 2015

Picanha em Série - Orange is the New Black (3ª Temporada)

[SPOILER ALERT]: se você ainda não assistiu a terceira temporada da série e não quer ter a surpresa estragada, recomendamos que pule para o próximo texto do Picanha!

A impressão que se tem da terceira temporada de Orange is the New Black - mais uma ótima série original da plataforma de streaming Netflix - é que se vai embora todo e qualquer drama, ou mesmo algum suspense, para que haja um investimento  (ainda) maior no humor. Mas isso é apenas nas aparências, já que a série criada por Jenji Kohan - que já trabalhou anteriormente como roteirista em alguns episódios de Weeds, Sex and the City e Mad About You - não deixa de discutir diversos temas relevantes para a sociedade. Algo que já vinha desde a primeira temporada, quando assuntos como preconceito racial, xenofobia, fanatismo religioso, abuso de poder e misoginia, apareciam frequentemente. Nos treze episódios que foram entregues no último dia 12 de junho, adicionam-se a esse leque, assuntos como direitos trabalhistas, aborto e estupro. Ou seja, a barra não é aliviada. Ainda que não seja tão pesada

Ainda assim, a obra - baseada no livro de Piper Kerman, a protagonista que conta a sua experiência na prisão de Litchfield -, em sua terceira temporada definitivamente parece mais "leve". Talvez como  forma de compensar a tensão gerada pela perturbadora presença da personagem Vee, interpretada por Lorraine Toussant, que morre no final da segunda temporada, após tocar o terror entre as detentas. Para exemplificar o novo momento da série, basta perceber o caminho tomado pela Crazy Eyes (Uzo Aduba) que se, na primeira temporada, se apresentava como uma pessoa esquizofrênica e perigosa, agora entretêm as presas escrevendo obras de ficção científica. O mesmo vale para Dogget (Tarin Manning), a caipira que vociferava os seus evangelhos entre as presas, com a bíblia embaixo do braço, em comportamento extremista no estilo Malafaia. E que agora se torna a motorista da prisão - ainda que ela sofra um duro abuso, é preciso que se diga.



Até o retorno de Alex Vause (Laura Prepon), torna o início da temporada excessivamente açucarado, por conta do namoro com Piper (Taylor Schilling), chegando a irritar o espectador. Algo que só muda um pouco de figura com o surgimento da detenta Stella (Ruby Rose) - que parece estar em Litchfield para cumprir uma "missão" em relação a Vause - e de Tricia (Madeline Brewer), que coloca alguma pimenta na relação entre Piper e Vause. A própria Piper ocupa seu tempo na prisão trabalhando em uma fábrica de calcinhas instalada dentro de Litchfield, enxergando aí uma oportunidade de negócio. Algo que se torna engraçado pelo aspecto curioso. Pra não dizer que não há alguma tensão, há a compra da prisão por novos investidores, o que gerará alguns dissabores, a eterna briga pela cozinha entre Red (Kate Mulgrew) e Gloria (Selenis Leyva) e algumas situações episódicas, como a briga entre Gloria e Burset (Laverne Cox) ou mesmo o caso de abuso de medicamentos de Soso (Kimiko Glenn).

Como sempre acontece desde a primeira temporada, a série segue se utilizando de flashbacks pra mostrar não apenas o passado dos presos, mas também dos agentes prisionais e conselheiros. E aqui entra outra coisa que eu não entendi: a opção por dar mais espaço a personagens chatíssimas como Norma (Annie Golden), Chang (Lori Tan Chinn) e a insuportável Leanne (Emma Myles). Deixando de lado, com essa decisão, outras integrantes de Litchfield, como Boo (Lea DeLaria), Poussey (Samira Wiley) e Nicky (Natasha Lyonne), que vai pra solitária, deixando todo mundo com saudades. Bom, deve ter sido assim que as coisas aconteceram de fato. As latinas seguem promovendo alguns dos momentos mais marcantes, com o filho de Daya (Dascha Polanco) nascendo ao final da temporada. Aliás, o último episódio deixa um ponto de interrogação sobre quais os caminhos que Orange is the New Black deverá tomar para a Four Season, que já está agendada. É aguardar.


quarta-feira, 15 de julho de 2015

5 Considerações Sobre a Apresentação do Nei Van Soria em Lajeado

Por meio de uma promoção do Sesc - que anda matando a pau no quesito cultura, diga-se de passagem - Lajeado recebeu na noite de ontem (14/07), no Centro Comunitário Evangélico, o show do Nei Van Soria. Com o tema The Beatles e Cascavelltes, o evento teve o objetivo de celebrar o Dia Mundial do Rock, comemorado na última segunda. Nesse post especial, cinco constatações sobre a apresentação!

1) Antes de mais nada é preciso que se registre a boa presença de público! O que faz com que a gente perceba que há sim potencial para eventos do tipo em Lajeado, e que fujam um pouco de estilos musicais mais populares. E isso que estava chovendo.

2) Sobre a apresentação: na verdade a parte Beatles é bem curtinha. Foram somente duas canções: I Saw Her Standing There e A Hard Days Night. O mesmo caso com o TNT, bem no início do espetáculo. Na verdade, esse preâmbulo teve o objetivo apenas de preparar o público para aquilo que realmente interessava na noite: o resgate, com os maiores hits dos Cascavelletes.

3) Num estilo meio storytelling, Nei Van Soria divertiu o público contando algumas curiosidades sobre as canções da banda. Em uma delas, disse que eram três os temas preferidos dos Cascavelletes: sexo, sexo e sexo. Em outra parte, recordou o improvável vídeo de Eu Quis Comer Você, feito em uma apresentação nos anos 80, no Programa Clube da Criança, comandado por uma jovem Angélica. Pra quem não assistiu, aqui está o link do divertido vídeo. Que prova que os loucos anos 80 aceitavam mesmo TUDO.

4) As letras de canções como Morte por Tesão, Menstruada, Nega Bombom, Moto e Minissaia sem Calcinha, no contexto de hoje, até podem parecer excessivamente juvenis. Mas a pegada roqueira e altamente punk, aliada a energia efervescente do grupo, mantém o clima de diversão adolescente, mesmo para os tiozões - meu caso! - que lá estavam. E ver todo o povo cantando em coro o "refrão" de Nega Bombom, inclusive a mulherada, é um indicativo de que as canções permanecem vivas nos corações dos roqueiros.

5) Além de extremamente pontual - foram no máximo 10 minutos de atraso - Nei Van Sória, Juliano Pereira e companhia esbanjaram gentileza com a plateia, agradecendo o tempo todo a oportunidade, bem como ao público, por ter dedicado a terça chuvosa para lhes prestigiar. Como ponto altíssimo do exercício de sensibilidade, ainda executaram, já no bis, Jardim Inglês, um dos maiores hits da carreira solo de Van Soria. Ainda que a canção nada tivesse a ver com a proposta do projeto levado pelos músicos Rio Grande afora.


terça-feira, 14 de julho de 2015

Cine Baú - Os Incompreendidos

De: François Truffaut. Com: Jean-Pierre Léaud, Claude Maurier e Albert Rémy. Drama, França, 1959, 99 minutos.

Disse Truffaut, por ocasião do lançamento de seu primeiro filme, Os Incompreendidos (Les Quatre Cents Coups), o seguinte: a adolescência é uma fase reconhecida pelos educadores e sociólogos, mas negada pelo família e pelos pais [...]. O mundo é injusto, então é preciso se virar: faz-se o que se deseja, mesmo que isso seja proibido. A frase resume bem o espírito da película, tida por muitos estudiosos como o marco inicial do movimento conhecido como Nouvelle Vague - ao lado de Acossados, de Jean-Luc Godard, lançado também em 1959. (Aliás, um dos anos mais espetaculares da história do cinema, sendo também desse período os clássicos Intriga Internacional, Quanto mais Quente Melhor, Anatomia de Um Crime, Ben-Hur, Pickpocket - O Batedor de Carteiras, Hiroshima Meu Amor e A Um Passo da Eternidade. Isso só pra citar alguns!)

Com ares autobiográficos, a película conta a história do jovem Antoine Doinel (Léaud), garoto negligenciado pelos pais, que também não encontra na autoritária escola que frequenta, o lugar ideal para ocupar a sua mente cheia de ideias. A alternativa passa a ser matar aula para, ao lado do melhor amigo, fazer outras coisas, como ir ao cinema ou ao parque de diversões. Em uma de suas andanças, Julien flagra a mãe com um amante, em plena rua. A situação piora quando, para justificar a sua ausência da escola, o rapaz diz que sua mãe morreu. Mentira que será descoberta mais tarde, tornando a situação ainda mais catastrófica. Após fugir de casa e se desentender com um professor por, aparentemente, "plagiar" uma obra de Balzac, o menino passa a viver de pequenos roubos.


Em uma época em que tanto se discute, no Brasil, a redução ou não da maioridade penal, a obra de Truffaut, impactante para o contexto político da França na época, quase deveria ser filmografia básica para os nossos representantes do Congresso Nacional. Julien se torna um "marginal" - aliás, palavra que muitos gostam de utilizar, nem sempre corretamente - simplesmente por estar cansado do autoritarismo da escola - que pouco parece acrescentar com o seu sistema engessado -, e pela total ausência dos pais, mais interessados em suas vidinhas ordinárias do que em educar, adequadamente, o seu filho. A cena em que o jovem é preso, após furtar uma máquina de escrever, sendo "enjaulado" com um preso bem mais velho e que parece estar lá por algum motivo bem mais sério, é emblemática nesse sentido. Isso sem falar no terço final, quando o rapaz vê a sua juventude ser cerceada, justamente pela falta de compromisso de quem mais deveria lhe dar suporte.

Truffaut tinha apenas 26 anos quando filmou Os Incompeendidos, na época fazendo parte do grupo que integrava a publicação Cahiers Du Cinema. Mas, a despeito da juventude, o francês enche a tela com imagens extremamente bem fotografadas - pelo mestre Henri Decaë, que filmou em locação em Paris -, e utilizando o que de melhor poderia ser feito em termos de recursos técnicos, mas sem perder a simplicidade. Não à toa a cena final, que mostra a fuga de Julien em um longo travelling, permanece até hoje no coração de todos os cinéfilos. Truffaut se tornaria ainda mais conhecido quando, mais tarde, filmaria clássicos como A Noite Americana e A História de Adèle H. Mas foi com esse relato pungente sobre a importância da infância na formação do caráter do sujeito - e que rendeu a Truffaut a Palma de Ouro em Cannes como diretor - que o francês apresentou ao mundo o seu impactante cinema autoral. Irretocável.


segunda-feira, 13 de julho de 2015

Especial Dia Mundial do Rock - 10 Discos Internacionais Fundamentais dos Anos 2000

Quem acompanha o Picanha de perto, sabe: o Rock and Roll (com letra maiúscula, claro!) faz parte das nossas vidas! Seja nas resenhas de discos que aparecem por aqui semanalmente, ou em outros quadros do site como Lado B Classe A, Pra Ouvir, ou mesmo em listas, como esta. Sendo assim, não poderíamos deixar passar em branco uma data tão importante para todos nós que crescemos escutando Beatles, Rolling Stones, Bob Dylan, Led Zepellin, The Doors, The Who, Kiss, AC/DC, Pink Floyd, Ramones, Guns N' Roses e Nirvana. Esses e outros tantos representantes fundamentais para o gênero.

Na nossa listinha a gente salta um pouco no tempo, para listar os 10 Discos Internacionais Fundamentais dos Anos 2000. É a nossa humilde maneira de celebrar a data. Você, leitor, verá que muitos dos álbuns ali listados fizeram (e fazem até hoje), parte de suas vidas. A Nossa ideia é recordar um pouco esse passado recente. Sem perder o apreço por todos aqueles que iniciaram essa história - casos de Bill Haley, Little Richard e Elvis Presley. Veja se você concorda conosco! E, concordando ou não, fica o convite para usar o espaço dos comentários, para falar dos trabalhos mais impactantes do Rock and Roll do novo milênio. Isso, porque vale lembrar: o rock não morreu. Ao contrário. Segue vivíssimo!

10) Foo Fighters - Wasting Light (2011): a carismática banda de Dave Grohl pode até dividir a crítica, que costuma relegá-la ao segundo escalão, quando o assunto é qualidade. Mas existe algo na aura dos americanos, que os torna tão magnéticos na sua relação com é o público: a capacidade de fazer rock and roll bem tocado, direto ao ponto, equilibrando na medida certa as distorções da guitarra com os ganchos pop. O trabalho anterior do quarteto - o irregular Echoes, Silence, Patience & Grace - era bem mais ou menos. Wasting Light, com seu peso sedutor, amparado por petardos como, Bridge Burning, Rope, These Days e Arlandria, representa uma espécie de retorno explosivo as origens. Para a alegria dos fãs.



9) Amy Winehouse - Back to Black (2006): a cantora e compositora britânica tinha uma atitude tão rock and roll, mas tão rock and roll, que foi encontrada morta em seu apartamento, em 2011, aos 27 anos, por conta de uma intoxicação alcoólica. Vinte e sete anos - a famosa data maldita que também levou outros artistas como Jim Morrison, Jimi Hendrix e Kurt Cobain. A breve carreira foi suficiente para que Amy, com sua voz ao mesmo tempo aveludada e potente, entregasse um álbum repleto de jazz, soul e R&B, a moda dos grupos dos anos 60 que faziam parte da gravadora Motown. O trabalho ficou mundialmente conhecido pelo hit Rehab. Mas foi em outras canções, como You Know I'm No Good, Back to Black e Tears Dry on Their Own, que Amy mostrou seu verdadeiro potencial.


8) Interpol - Turn on the Bright Lights (2002): a última década foi privilegiada em termos de estreias matadoras - aliás, essa lista chega a comprovar isso. Mas poucas foram tão aclamadas quanto a do primeiro trabalho do grupo de Paul Banks e companhia. Recheado por emanações sombrias e letras existencialistas, o álbum fez a festa dos alternativos do início do milênio passado, que dançavam as canções em inferninhos, conversando entre si sobre as semelhanças entre o Interpol e grupos oitentistas como The Smiths e Joy Division. Amargo e melancólico, muito por conta do sensacional serviço do baixista Carlos Dengler, o disco é figurinha tradicional em listas de melhores desse milênio. E músicas como NYC e PDA permanecem no coração dos fãs.



7) Arctic Monkeys - AM (2013): o grupo de Alex Turner não apenas sobreviveu a síndrome do primeiro disco - o elogiado Whatever People Say I Am, That's What I'm Not, lançado num agora longínquo 2006 - como torna cada novo trabalho o preferido instantâneo de críticas e fãs. O disco mais recente condensou tudo o que de melhor a banda pode fazer em relação a sonoridade sessentista, habitualmente adotada pelos britânicos, como ainda ampliou suas possibilidades, trazendo ao álbum um verniz moderno, capaz de dialogar com tudo o que se está fazendo atualmente, no mundo da música. De quebra o trabalho ainda possui alguns dos melhores hits do quarteto, casos de Do I Wanna Know?, R U Mine?, One For the Road e Why'd You Only Call Me When You're High?



6) Wilco - Yankee Hotel Foxtrot  (2002): a história do lançamento desse disco é ótima e já foi contada, na íntegra, nesse post do blogue. Quando o Wilco entregou as canções do trabalho, o quarto da banda, para os representantes da Warner/Reprise, os executivos fizeram pouco caso e resolveram abandonar o grupo. O álbum era influenciado por discos como Third/Sister Lovers, do Big Star, e Blood on the Tracks, de Bob Dylan, sendo um registro triste, desesperançoso, de sonoridade experimental e um tanto desafiadora. E muito pessoal. Com todo esse contexto, a alternativa foi lançar o material pela internet. O sucesso de público e crítica fez com que a gravadora voltasse atrás, comprando de volta os direitos. Numa bela ironia do destino.


5) Arcade Fire - Funeral (2004): lembro até hoje de um episódio do ano de 2005. Aguardávamos o show do Strokes, no Pepsi On Stage, quando iniciou a apresentação de abertura. Uma banda canadense da qual eu pouco tinha ouvido falar. E que, na real, somente mais tarde fui entender a importância e o impacto do que via. A produção era primorosa. O clima era soturno, um tanto experimental. O instrumental era executado com uma técnica impecável. E não contava apenas com guitarra, baixo e bateria, como é a tradição dos grupos de rock. Havia muitos integrantes e espaço para violino, teclado, acordeão, harpa. O rock do Arcade Fire, que tinha por base as canções do seu disco de estreia, era apresentado à Porto Alegre. E o mundo ganhava a sua nova banda favorita.


4) White Stripes - White Blood Cell (2001): o White Stripes surgiu para o mundo um pouco antes do The Strokes, carregando consigo uma diferença: o rock de Jack e Meg White, que utilizava apenas guitarra e bateria, era ainda mais cru, direto, garageiro e sem firulas do que o da banda capitaneada por Julian Casablancas. E não era só pelo instrumental, que a dupla começava a ganhar pontos com os fãs do bom e velho rock and roll. As letras sacanas e perspicazes, eram recheados de reflexões cínicas sobre o cotidiano, como no caso do primeiro single, Feel In Love With a Girl, que, com seu clipe colorido e clima dançante, versava sobre as diferenças entre o cérebro de um homem e o de uma mulher. Toda essa inspiração contribuiu para dar novo fôlego ao estilo, no início da década passada.


3) Queens of the Stone Age - Songs for the Deaf (2002): escolher um disco, entre os tantos trabalhos espetaculares lançados pela banda de Josh Homme e companhia, pra figurar na nossa listinha, não é tarefa fácil. Songs for the Deaf talvez seja o mais experimental de todos, com suas vinhetas, canções curtas e barulhinhos diversos. Mas se engana quem pensa que o trabalho é só invencionice: com um petardo atrás do outro, os americanos acrescentaram ainda mais peso as suas canções, estabelecendo diálogo com o hard rock, sem deixar de conquistar o público. Por conta de gemas roqueiras como No One Knows, First It Giveth e Go With the Flow, o quinteto chegou a ser chamado, por algumas publicações, de "salvação do rock". Status que se mantém até hoje.



2) The Strokes - Is This It (2001): desde a estreia de Nevermind, do Nirvana, no início dos anos 90, que os fãs do bom e velho rock and roll se ressentiam da ausência de uma banda pra chamar de sua. Grupos como Metallica, Red Hot Chilli Pepers e U2 - além dos remanescentes do Nü Metal - lançavam trabalhos periódicos e bons. Mas não causavam tanta comoção. Fazia falta aquele som que te fizesse pular do sofá da sala, berrar, tocar air guitar. Foi o que ocorre com o retumbante lançamento desse primeiro trabalho dos nova-iorquinos. Desde os acordes iniciais de Is This It, até o final, com Take It Or Live It, o trabalho é puro rock sujo, de garagem, capaz de trazer de volta, instantaneamente, a efervescência dos anos 70, das roupas de brechó, dos all star surrados. Enfim, o rock vive.


1) Radiohead - Kid A (2000): talvez os fãs do rock mais convencional até estranhem a presença da banda de Thom Yorke nessa lista. Ainda mais em primeiro lugar! Mas é preciso que se analise esse álbum, um dos mais inventivos do último século, em seu contexto: o grupo tinha lançado, em 1997, Ok Computer, elogiadíssimo disco de transição, que misturava rock e música eletrônica, falando sobre invasões alienígenas, dominação tecnológica e medo da morte, num caldeirão sonoro e de referências que elevou o quinteto a um outro patamar. Quando todo mundo achava ser impossível superar a si próprios, Thom e companhia surgem com Kid A, disco etéreo, controverso, por vezes sinistro e introspectivo. Quase sem letras e sem guitarras, recheado de uma sonoridade iconoclasta, tensa, vertiginosa. Atitude mais rock and roll, desculpem os puristas, era impossível.



domingo, 12 de julho de 2015

Picanha Cast 09/07/2015

Um apanhado dos últimos dias do Picanha, no mais novo Picanha Cast! Confira!

Participação Tiago Bald.
Apresentação Tiago Segabinazzi.


terça-feira, 7 de julho de 2015

Espaço do Leitor - Juliano Heinen (Toda Luz Que Não Podemos Ver)

Hoje, no Espaço do Leitor, temos a ilustre participação do amigo e escritor Juliano Heinen. E não é que o Juliano deu um tempo nos livros relacionados à sua área de atuação (o direito, no qual é autor de vários volumes) para discorrer um pouco sobre a obra vencedora do prêmio Pulitzer 2015, Toda Luz Que Não Podemos Ver. A obra de Anthony Doerr, best seller nos Estados Unidos e bastante elogiada, é uma bela dica que você pode conferir no texto abaixo:



"Já nas primeiras páginas somos capturados pela obra de Anthony Doerr. E, a partir deste ponto, não há mais como parar de ler. Não saberíamos ao certo se é por conta do estilo objetivo e descritivo do seu texto, pelo enredo inesquecível, pela fascinação de uma história que se passa em um momento dramático da humanidade (a 2ª Guerra Mundial), por seus personagens serem demasiadamente humanos, enfim. O certo é que demora pouco para nos darmos conta de que não é à toa que o livro recebeu tantos prêmios (livro do ano pelo New York Times, em 2014; indicado ao National Book Award; aclamado pela crítica de inúmeros periódicos no mundo; culminando, de quebra, em 2015, per receber o prêmio Pulitzer). E demora menos ainda para compreender a facilidade com que atingiu um milhão de exemplares vendidos só em 2014.

'Toda luz que não podemos' ver conta a história de duas crianças que crescem aos horrores da guerra. E no meio de tantas privações, conseguem, cada qual ao seu mundo, escavar perante os escombros, e, no meio da lama, encontrar as suas “flor de lótus”. Duas histórias que são contadas alternadamente, em capítulos de duas ou três páginas, cuja linha de tempo o autor consegue impressionantemente também modular, cativando ainda mais o leitor.

Não há como não sentir afeto pela menina francesa Marie-Laure, cega desde a infância, que recompõe um mundo tão próprio em Paris e em Saint-Malo; que nos demonstra que a beleza do mundo é criada pela nossa mente, e não necessariamente pelos nossos olhos. Como não se ser tocado pela pureza de Werner, um órfão de pai e mãe, crescido em um orfanato alemão e incorporado no exército do Reich. Duas histórias que se alternam, dando verdadeira pulsação ao livro.
Esta obra nos presenteia com tantas e tantas reflexões por demasiadas humanas. Brinda-nos com mensagens por deveras tocantes. Eleva-nos a um mundo realmente imaginário. Um belo livro para ser sorvido!"

E você, tem algum livro, filme, disco que marcou sua vida? Mande para nós!
Um abraço e até o próximo Espaço do Leitor!

segunda-feira, 6 de julho de 2015

Lado B Classe A - The New Pornographers (Twin Cinema)

Escolher um disco dos canadenses no The New Pornographers pra figurar no nosso Lado B Classe A: taí uma tarefa complicada. Na discografia do grupo - e na impressão desse jornalista que vos fala - são dois os trabalhos que mais se sobressaem, entre os álbuns da banda capitaneada por Dan Bejar, A. C. Newman, Neko Case e companhia: Mass Romantic, lançado no ano 2000 e Twin Cinema, em 2005. Este último, e escolhido por nós para o quadro, foi o responsável pelo primeiro contato que tive com a banda. Sabe quando você coloca um LP pra rodar e logo depois se pergunta: caceta, como foi que eu nunca tinha escutado isso antes na minha vida? Enquanto ouvia as harmonias altamente coloridas, a guitarra marcante, o pop festeiro e com clima alto astral da primeira música - que marcava a meu ver uma espécie de cruzamento entre os Beach Boys, Weezer, The Wonders e os oitentistas do B-52s -, era esse o meu pensamento.

O meu "sócio" aqui do blogue já tinha passado as credenciais: o finado (e divertidíssimo) site Gordurama tinha dado nota 10. O Pitchfork, normalmente exigente, não se fez de rogado e tascou logo um 9, colocando o grupo no panteão daqueles que são categorizados como Best New Music. Uma baita credencial para qualquer artista da música que está buscando seu espaço. Juro que achei que não era pra tanto. Mas conforme as músicas avançavam e o clima festivo, tendo por base o que de mais saboroso uma banda pode fazer dentro do estilo denominado de power pop, ia tomando conta, a paixão só ia aumentando. Sim, paixão. Quem gosta de música tem suas bandas do coração: não precisei terminar de escutar esse trabalho, um dos melhores elaborados por grupos que surgiram no início dos anos 2000, para já colocar os canadenses entre os favoritos de sempre.


O disco Mass Romantic, citado no começo desse texto, talvez seja o que tenha os hits mais bacanas do grupo - casos da música título, The Slow Descent Into Alcoholism, Letter form a Occupant e The Body Says No. O que se configura como uma baita porta de entrada para eventuais novos ouvintes, que estejam interessados pelo grupo. Mas o Twin Cinema é mais completo. Mais coeso em suas possibilidades musicais, como se cada elemento sonoro e cada canção estivessem coladas uma na outra, compondo um trabalho heterogêneo em sua estrutura, ainda que, aqui e ali, possam ser notadas diferenças de ritmo, de clima e de velocidade entre uma composição e outra. Mas, no geral, e até por possuir um grande número de integrantes se "revezando" nos instrumentos - guitarra, baixo, bateria e sintetizador - o clima é sempre pra cima. Algo que já pode ser notado na coloridíssima capa do trabalho (aliás, quase sempre um padrão em cada lançamento)!

Repleto de letras despretensiosas que podem discorrer sobre situações cotidianas ou mesmo desilusões amorosas - tudo com uma pitada clara de nonsense em cada verso - a banda poderia ser figurinha fácil em qualquer rádio mais antenada, tamanho o potencial sonoro do registro, repleto de refrões, mas também de distorções de guitarras que posicionam o coletivo um tanto distante de seus pares do indie rock - ainda que faça parte dele, inevitavelmente. E audições de verdadeiras gemas pop - chego a ser repetititvo! - como a música título (aliás, é bom tirar o sofá da sala quando colocar essa canção pra rodar) -,  The Bleeding Heart Show, Jackie Dressed in Cobras, The Jessica Numbers e Sing Me Spanish Techno apenas corroboram essa tese. O Canadá normalmente é tido como um país frio - aliás, é a terra de grupos muito mais soturnos, como o Arcade Fire, apenas pra citar um. Mas o The New Pornographers, com seu estilo colorido, descolado e cheio de energia, afasta esse estereótipo para bem longe com seu pop acessível, agridoce e feito para todos os públicos. Fundamental.


quinta-feira, 2 de julho de 2015

20 Discos do Primeiro Semestre que não Foram Resenhados no Picanha - E que Você Precisa Ouvir!

Quem acompanha o Picanha de perto, sabe: dada a quantidade de quadros do nosso estimado blogue, acabamos tendo espaço para apenas um ou no máximo dois lançamentos de discos, por semana. E isso faz com que muita coisa boa se perca sem ser analisada, citada, lembrada, criticada. Mas não para os nossos atentos ouvidos! Nesse quadro especial, selecionados 20 trabalhos que não foram resenhados por aqui, durante os primeiros seis meses do ano, mas que merecem toda a atenção. A lista é bem variada e vai de Madonna a Lower Dens. Boa leitura!

20) Madonna (Rebel Heart): A rainha do pop, todos nós sabemos, não precisa provar nada pra ninguém - e discos clássicos como Like a Virgin, True Blue e Like a Prayer falam por si. Mas a artista de 57 anos se empenha em soar moderna, ao dialogar de perto com aquilo tem sido feito na música atual, inserindo uma série de elementos eletrônicos, de R&B e de hip hop em seu novo trabalho. As 19 canções liberadas para streaming (e os extensos 75 minutos de audição) poderão soar cansativas para alguns ouvidos. Mas é inegável que ainda segue sendo muito prazeroso ouvir o que Madonna tem a nos entregar. E ela entrega o de sempre: ótimas canções pop. Melhor música: Living for Love. Ouça também: Bitch I'm Madonna e Ghosttown.


19) Holly Herndon (Platform): espécie de FKA Twigs da vez, Holly Herndon recheia o seu segundo trabalho com sons etéreos, densos e cerebrais. Misturando um vocal em muitos casos sussurrado, quase imantado a parte instrumental, a artista ainda é capaz de provocar uma nítida sensação de caos, ao colocar aqui e ali barulhos de passos, de vasos se enchendo de água, de vidros estilhaçando, de computadores em processo de funcionamento. O estilo pouco convencional certamente não é para todos os paladares. Mas quem se arriscar, mergulhará em um dos mais experimentais e inclassificáveis discos do ano. Melhor música: DAO. Ouça também: Chorus e Interference.



18) Dingo Bells (Maravilhas da Vida Moderna): ainda que não seja assim nenhum exemplar do outro mundo em termos de criatividade ou em relação ao que se tem ouvido nas últimas décadas no rock gaúcho, o primeiro trabalho da Dingo Bells merece atenção. Muito por conta do trabalho dos produtores Felipe Zancaro (Apanhador Só) e Gustavo Fruet (Chimarruts), capazes de levar o ouvinte a uma fácil navegação por meio de um conjunto de canções essencialmente pop, mas nunca vazias em seu conteúdo. O clima é colorido, a despeito da capa acinzentada, e a viagem versa sobre a vida depois dos 30 e sobre o "sentimento" dos dinossauros, entre outros. Melhor música: Fugiu do dia. Ouça também: Eu Vim Passear e Maria Certeza.


17) Will Butler (Policy): mais um exemplo de disco que deve ser ouvido muito mais pela curiosidade despertada do que pela qualidade em si do produto final. Afinal de contas, Will Butler é um dos integrantes de uma das melhores bandas do mundo, o Arcade Fire. Em sua estreia como artista solo, Butler faz um álbum enxuto, são apenas oito músicas e pouco mais de 30 minutos, e com clara inspiração no rock mais cru feito nos anos 50 e 60. Ou seja, bem distante daquilo que faz ao lado do irmão Win e de seus parceiros de grupo. A fuga em termos de estilo confere personalidade ao trabalho, nunca dando a sensação de mais do mesmo. Melhor música: Take my Side. Ouça também: What I Want e Anna.



16) Jamie XX (In Colour): a crítica tem se derretido em elogios ao falar da estreia solo do produtor Jamie Smith, ex-integrante do The XX. O londrino entrega um trabalho extremamente autoral, tendo como base uma sonoridade eletrônica, de barulhinhos, econômica nos vocais, mas grandiosa em sua proposta. Por vezes melancólico, em outras ensolarado, a impressão que se tem da obra de Jamie XX é de se ter estado durante toda uma madrugada em uma boate estilosa da capital inglesa. Experimentando desde os momentos que antecedem a festa, até aqueles que envolvem a manhã seguinte e as consequências desta. Absolutamente envolvente. Melhor música: I Know There's Gonna Be (Good Times). Ouça também: Loud Places e Gosh.


15) Courtney Barnett (Sometimes i Sit and Think, and Sometimes i Just Sit): a revista Rolling Stone Brasil fez uma matéria com Courney Barnett, intitulada Canções Sobre o Nada. E é exatamente isso. Num estilo meio Seinfeld, a australiana canta sobre banalidades do cotidiano, muitas delas relacionadas a vida dos jovens como ela, que possui apenas 27 anos. Algo que pode ser percebido já na capa do disco, ou mesmo no título das composições - uma delas se chama Nobody Really Cares if you Don't Go to the Party. Pode ser mais ilustrativo? Barnett canta como uma espécie de Sheryl Crow, mas passa seu recado. Melhor música: Debbie Downer. Ouça também: Dead Fox e An Ilustration of Loneliness (Sleepless in New York)


14) Kendrick Lamar (To Pimp a Butterfly): Kendrick Lamar, como muitos jovens negros dos Estados Unidos, não teve infância fácil. Viu uma pessoa ser assassinada quando tinha apenas cinco anos de idade, viu seu pai se envolver com gente da pesada e dormiu em hoteis baratos ou mesmo no carro da família, por não terem dinheiro para pagar um apartamento. Fora o assédio diário para que entrasse na marginalidade ou mesmo o preconceito, muitas vezes vindo de policiais, simplesmente por ser negro. Mesmo curta, a vida está sendo vivida com intensidade, o que se traduz nesse trabalho que explora e amplia esses temas, um dos mais elogiados do ano até agora. Para quem entende inglês, é uma pérola atrás da outra. Melhor música: King Kunta. Ouça também: u e Hood Politics.


13) Lower Dens (Escape from Evil): o Lower Dens parece dialogar com várias bandas, em muitos casos lembrando grupos oitentistas como o The Smiths e em outros bandas de post-punk modernosas como Interpol. O clima é um tanto soturno, bem distante do colorido dos bloquinhos que ilustram a capa. O estilo shoegaze domina e faz pensar que, se ainda existisse um programa como o Lado B, da finada MTV, o quinteto de Baltimore, Maryland, seria figurinha carimbada. Ainda assim há espaço para um pop eventual, feito com base em guitarras marcantes e sintetizadores discretos. Melhor música: Ondine. Ouça também: Non Grata e Your Heart Still Bleading.



12) Tulipa Ruiz (Dancê): Medida, forma, direção / Proporcional aos fatos / Gostar assim sem previsão / É normal nesse caso / Aconteceu de caber / Coube em mim. Coube em você / Calhou de encaixar legal / Envergadura, estatura, peso e tal / Visto GG, você P. Tulipa está safadinha no disco Dancê, o que pode ser percebido nesse trecho da fantástica Proporcional. Apenas uma entre tantas gemas pop dessa que é uma das principais artistas brasileiras da atualidade. O disco é puro balanço, brasileirismo, sensualidade. Tem participação de João Donato e Felipe Cordeiro, entre outros músicos de renome.  A artista canta firme e faz o ouvinte suar. E dançar. Melhor música: Tafetá. Ouça também: Proporcional e Prumo.


11) Natalie Prass (Natalie Prass): a maior força de Natalie Prass, em sua surpreendente estreia, é a sua potente voz. Aos 29 anos, a artista americana canta fazendo lembrar muitas artistas - de Kate Bush a Diana Ross. De Edith Piaf a Tori Amos. O que não é pouca coisa. As letras tem lá seu romantismo, mas nunca soam piegas. Our love is like a long goodbye / We keep waiting for the train to cry, canta a artista em My Baby Don't Understand Me. O Pitchfork, um dos mais conceituados sites sobre música dos Estados Unidos, classificou o trabalho como Best New Music, dando nota 8,3. O que não deixa de ser uma baita credencial, caso alguém ainda tenha dúvidas sobre as qualidades da moça. Melhor música: It Is You (aliás, uma das melhores músicas do ano!). Ouça também: Bird Of Prey e My Baby Don't Understand Me.


10) Christopher Owens (Chrissybaby Forever): há até pouco tempo, Owens esteve a frente de uma das mais inventivas bandas do rock atual, o Girls. Agora, em carreira solo, o americano esbanja produtividade ao chegar ao terceiro álbum em pouco mais de dois anos. O clima é o mesmo do de seu grupo anterior: canções ensolaradas, altamente melodiosas e emocionais, instrumental econômico, vocal ao mesmo tempo tímido, mas vívido, e aquele clima nostálgico ou mesmo de fim de tarde, como se já tivéssemos escutado aquela canção anteriormente. Melhor música: Another Fucked Loser Up. Ouça também: Music of My Heart e Out of Bed (Lazy Head).



9) Speedy Ortiz (Foil Deer): a banda de Northampton, Massachussets, foi feita sob medida para quem gosta do estilo noventista de grupos como Pavement, Elastica e The Breeders. Sem soar ultrapassado por causa disso o quarteto, capitaneado pela vocalista Sadie Dupuis, atualiza o estilo, entregando para novos ouvintes um modelo que foi muito utilizado naquela década. O que pode possibilitar inclusive um resgate do estilo, em uma espécie de contramão daquilo que vem sendo feito na música atual. O clima é garageiro e a música tem personalidade. O que já ajuda muito. Melhor música: Raising the Skate. Ouça também: Homonovus e The Graduates.



8) Girlpool (Before the World Was Big): está sendo um ótimo ano para as RRRRRiot girls. Depois dos recentes lançamento de Sleater Kinney - aliás, No Cities to Love é candidato CERTO a figurar entre os melhores trabalhos do ano - e Veruca Salt - agora é a vez da dupla de Los Angeles lançar seu primeiro disco. A banda ficou muito conhecida no meio alternativo, após o lançamento do EP homônimo, em 2013 - muito por conta do megahit (se é que podemos chamar assim) Blah Blah Blah. No álbum de estreia as meninas tiram um pouco o pé do acelerador no punk rock, mas ficam acima da expectativa na qualidade sonora. Melhor música: Ideal World. Ouça também: Dear Nora e Before the World Was Big.



7) Sufjan Stevens (Carrie & Lowell): tenho de confessar a vocês o fato de não ser nenhum especialista em Sufjan Stevens. Mas o clima "Simon & Garfunkel na depressão" desse trabalho, um dos fortes candidatos a disco do ano - Pitchfork deu nota 9,3 - ganha qualquer ouvinte. A mãe de Stevens (a Carrie do título) teve uma vida problemática, por conta de um comportamento esquizofrênico e bipolar e também pelo uso abusivo de álcool e drogas. E a relação complicada com o padrasto Lowell também não ajudava muito. No disco o músico abre o coração e narra essa história, em clima intimista, com versos recheados de mensagens sinceras. E emocionantes. Melhor música: Should Have Known Better. Ouça também: Death With Dignity e All of Me Wants All of You.


6) Lenine (Carbono): poucos artistas brasileiros (e atuais) conseguem traduzir tão bem a amplitude de significados da música nacional como Lenine. Suas canções são ao mesmo tempo regionalistas e universais, simples e complexas. O mesmo vale para suas letras, para a estética adotada em cada trabalho, para a sonoridade. No seu mais recente álbum, o artista utiliza o carbono - elemento que compõe basicamente toda a matéria - como uma metáfora as coisas que parecem simples, mas no fundo guardam certa complexidade. O cantor - que é engenheiro químico, nunca é demais lembrar! - se reúne com grandes nomes nacionais, sendo a Nação Zumbi o mais marcante. E lança um discaço. Melhor música: Cupim de Ferro. Ouça também: A Meia Noite dos Tambores Silenciosos e Simples Assim.


5) Purity Ring (Another Eternity): o primeiro disco do duo canadense, intitulado Shrines, já era uma verdadeira pérola da música pop futurista, com batidas eletrônicas, clima gélido, sintetizadores certeiros como que vindos de outro planeta. Com o segundo trabalho, a banda consegue não apenas ampliar o seu espectro, como ainda se aproximar do grande público, por meio de canções feitas sob medida pra tocar em qualquer rádio mais antenada. O estilo varia, chegando muito perto do trip hop e do R&B. E a voz de Megan James é tão doce, formando um interessante controponto, que um ouvinte desavisado até poderia confundi-la com alguma outra cantora pop atual. Melhor música: Bodyache. Ouça também: Heartsigh e Stranger Than Earth.


4) Laura Marling (Short Movie): aaah, se o Mumford and Sons conseguisse fazer música folk simples, direta e sem firulas, como faz a compositora Laura Marling. Em seu quinto álbum de estúdio a cantora mantém a qualidade habitual, deixando um pouco de lado os acenos folk de outrora, que faziam parte da crítica compará-la a Joni Mitchel. Não que os arranjos tenham mudado muito, mas a impressão que temos é de uma artista muito mais em contato com o rock - e por quê não, o pop. Tudo fruto de uma espécie de "período sabático" que a inglesa foi passar nos Estados Unidos, após anunciar estar meio cansada do mainstream. Melhor música: Gurdieff's Daughter. Ouça também: I Feel Your Love e Warrior.



3) Toro Y Moi (What You Want?): Chazwick Bradley Bundick, o músico e produtor por trás do projeto Toro Y Moi deve ter passado os últimos meses se entupindo de audições de bandas como Big Star, Teenage Fanclub, Wannadies e Real Estate. O estilo ensolarado até não foge tanto assim do chillwave, vertente a qual o artista é normalmente ligado. Mas, definitivamente, representa uma mudança de rumo e até mesmo uma tentativa de se aproximar de um outro tipo de público.A crítica não foi lá muito com a cara, mas pra quem gosta do estilo ensolarado dos grupos citados no início desse parágrafo - eu, entre eles! - a atual fase é um prato cheio. Melhor música: Spell It Out. Ouça também: Buffalo e Empty Nesters.


2) Best Coast (California Nights): melhor coisa do mundo quando uma banda consegue fazer um pop gostoso, com letra simples, refrão marcante e todos os elementos capazes de arrebanhar ouvintes mundo afora. Ainda mais pelo fato de hoje em dia haver um certo "ranço" por parte da crítica, aberta exclusivamente aos grupos excessivamente "cabeças" (e chatos), deixando para o plano inferior os artistas que, na aparência, não são assim tão elevados artisticamente. E quem lá quer ouvir música complexa o tempo todo? Pois os californianos, com seu estilo leve, colorido, de melodia praiana e versos juvenis, consiste-se em uma das bandas mais legais da atualidade. Vai por mim. Melhor música: Run Through My Head (mais uma pra estar entre as melhores do ano). Ouça também: Jealousy e Feeling Ok.


1) Shamir (Ratchet): responsável pelo melhor disco do ano até agora - tá empatadinho com I Love You, Honeybear, do Father John Misty - o cantor e produtor Shamir Bailey (ou apenas Shamir), tem apenas 21 anos. Mas canta como gente grande. Imagine você um inusitado encontro entre Michael Jackson, Janis Joplin e Outkast. Com uma pitada de modernosos como Psy. O resultado é um trabalho altamente dançante, cheio de groove, de batidas bem arranjadas, de hip hop. Algo que pode ser percebido, inclusive, na capa. As letras são sacanas, bem-humoradas e altamente diversificadas nos temas. We were fit for survival, no books but the Bible / Held out with a gun canta Shamir na ótima Demon. E o povo na pista dança noite adentro. Melhor música: Demon. Ouça também: Call it Off e On the Regular.


Pra conferir as resenhas (com nota e tudo!) feitas aqui no Picanha é só clicar nesse link! Lá tem Muse, Blur, Brandon Flowers, Comunidade Nin-Jitsu, Mumford & Sons, Alabama Shakes, Passion Pit, Death Cab for Cutie, Wado, Noel Gallagher's High Flying Birds, The Decemberists, Wander Wildner e muito mais!