sexta-feira, 6 de março de 2015

Disco da Semana: Wander Wildner (Existe Alguém aí?)

Eu devia de ter uns 15 ou 16 anos quando tomei contato pela primeira vez, por meio de um amigo da época, com o Baladas Sangrentas, disco de estreia do músico gaúcho Wander Wildner. Lembro até hoje de que se tratava de uma cópia demo, obtida antes do lançamento oficial do álbum, numa capinha laranja que nem o camelô mais desorganizado conseguiria fazer. O estilo não me era tão atrativo, um punk-rock-brega, com letras irônicas, românticas, engraçadas, sarcásticas e que, no fim, se configuraram como importante etapa da minha formação musical. E acho que é possível dizer com segurança que esse deve ser o sentimento de muitas pessoas de 30 e poucos anos que cresceram ao som de Bebendo Vinho, Lonely Boy, Tenho uma Camiseta Escrita Eu Te Amo e, claro, a indefectível Lugar Du Caralho - versão feita a partir da composição e outro gaúcho, Júpiter Maçã.

Mas era outra época. Em 1996 ainda não havia internet, os programas dominicais da TV aberta eram o grande assunto familiar e o país ainda se ressentia da morte de ídolos como Ayrton Senna, em 1994, e, especialmente, os Mamonas Assassinas, em 1995. O pop e o rock nacional passavam por uma espécie de entressafra que, curiosamente, parece ter afetado o próprio Wander - que na época surgia como um elemento "novo" do rock gaúcho pós-Replicantes. E uma audição mais cuidadosa de canções como Freira Desalmada tornarão possível, inclusive, uma aproximação com aquilo que bandas como Virguloides fariam um pouco mais tarde.



Ocorre que todos nós, de lá para cá, amadurecemos. Inclusive o Wander, que acaba de lançar o seu oitavo álbum da carreira, intitulado Existe Alguém Aí? Wander hoje está com 55 anos. E a proximidade da tão famosa "terceira idade" o tornou mais sério, o que se reflete nas letras políticas, reflexivas e em alguns momentos até sombrias do novo registro. Em entrevista a Zero Hora, ele chegou a dizer que este se tratava de seu primeiro disco conceitual - o que não deixa de ser verdade, já que os trabalhos anteriores, na maioria dos casos, se configuravam como um apanhado de canções que, ainda que soassem divertidas, roqueiras, sacanas, muitas vezes representavam um recorte um tanto desconexo, em uma análise mais global. "As músicas mostram a minha visão da sociedade atual" falou o compositor ao periódico. O que não deixa de ser verdade.

Por exemplo na densa Réquiem Para uma Cidade, que abre o trabalho, Wander fala de uma capital que vive uma realidade quase apocalíptica, onde só chove o tempo todo. Naquela Noite Ela Chorou fala das dores de uma derrota em uma eleição, quando, em muitos casos se vê a democracia acontecer, sem muito se ter o que fazer - e ele mesmo explicou que a letra se refere à derrota de Olívio Dutra para Lasier Martins, na corrida pelo Senado. Ainda que fale sério, o compositor em muitos casos, brinca, usando um jogo de palavras que, ao mesmo tempo em que faz pensar, é capaz de divertir - como na candidata a hit Uma Angústia Presa na Garganta. A parte instrumental é básica - até demais - e em muitos casos resulta em uma sensação de "mais do mesmo", como se estivéssemos ouvindo o tempo todo discos como Mondo Bizarro dos Ramones, algo que, inclusive, pode tornar a audição um tanto cansativa para quem não está tão familiarizado. E quem já ouviu bandas modernas como Cloud Nothings e Ex Hex - pra citar dois exemplos - sabe que é possível soar inovador e criativo, mesmo usando os básicos guitarra, baixo e bateria.

Nota: 7

Nenhum comentário:

Postar um comentário