quarta-feira, 4 de março de 2015

Cine Baú: Uma Rua Chamada Pecado

De: Elia Kazan. Com Vivien Leigh, Marlon Brando, Kim Hunter e Karl Malden. Drama, EUA, 1951, 125 minutos. 

Poucas vezes a vida de uma pessoa foi retratada de forma tão mesquinha, fútil e sem sentido como no caso de Blanche Dubois (Vivien Leigh, em interpretação espetacular), personagem da peça Um Bonde Chamado Desejo de Tenessee Williams - e que no cinema recebeu a tradução de Uma Rua Chamada Pecado (A Streetcar Named Desire). Blanche é uma mulher decadente, dissimulada e ainda assim arrogante que, após perder a casa de campo em que morava com a família - em circunstâncias misteriosas - resolve ir morar com a irmã Stella (Kim Hunter) e com o cunhado Stanley Kowalski (Marlon Brando), em um minúsculo apartamento apertado, em um bairro da periferia de Nova Orleans.

Como é de supor, a vida do casal se torna um verdadeiro inferno com a chegada da nova moradora. Blanche, com sua personalidade delirante, insiste em viver de aparências, usando roupas e acessórios refinados, que geram desconfiança por parte de Stanley, vivido por Brando como um homem rude e explosivo, que não hesita em gritar e brigar na hora das discussões mais acaloradas - inclusive com a esposa. Na realidade, Stanley desconfia de que Blanche tenha vendido a casa e não a perdido, o que vai tornando a tensão dentro da casa a cada dia mais sufocante. Algo agravado pelo comportamento ardiloso e cheio de devaneios da cunhada que, para piorar ainda mais a situação, parece esconder um passado bem distante daquele que ela tenta a todo o custo "vender".



Como forma de tornar o clima ainda mais claustrofóbico dentro desse pequeno ecossistema, Kazan - que teve a obra roteirizada pelo próprio Williams - abusa de closes e de cenas pouco iluminadas, o que transforma a pequena casa em um ambiente ainda mais opressor. Com divisórias feitas de cortinas, o simples ato de ligar um rádio para ouvir música pode ser o estopim para discussões violentas e agressões físicas. Além destes elementos, o calor constante, reforçado pelo suor permanente no rosto (e no corpo) de Stanley, também reforça essa ideia. E é preciso que se diga que a versão do diretor - liberada anos depois e hoje facilmente encontrada em DVD - reforça o caráter sensual da obra, que não hesita em mostrar as mulheres com roupas "de baixo" e homens sem camisa, algo que resulta em uma tensão sexual permanente - especialmente entre o magnético Stanley e a lânguida Blanche.

O filme foi vencedor de quatro Oscar, sendo três para atores - Leigh e Hunter, além do ator Karl Malden, que interpreta um postulante a namorado de Blanche - e um para a direção de arte, o que serve como demonstrativo de que a grande força dessa obra-prima está nas inspiradas interpretações. Leigh, com suas frases de efeito insanas - "Sim, eu conto muitas mentiras, mas 50% do charme de uma mulher não está na ilusão?" -, é o destaque, mas é o conjunto de astros que faz este clássico funcionar. E é preciso que se diga que Marlon Brando talvez não tenha faturado a estatueta dourada apenas por ser jovem demais, já que estava somente em seu segundo filme. E por ter encontrado um inspirado Humphrey Bogart, por Uma Aventura na África, pelo caminho. Nada que apague o brilho do filme, que figura no 47º lugar na lista dos 100 melhores do American Film Institute.




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