terça-feira, 3 de maio de 2022

Novidades em Streaming - Nos Corredores (In den Gängen)

De: Thomas Stuber. Com Franz Rogowski, Sandra Hüller e Peter Kurth. Drama, Alemanha, 2018, 126 minutos.

Corredores, empilhadeiras, caixas, estrados. Uniformes, crachás, registros de ponto. É possível encontrar algum tipo de "emoção" na rotina tão repetitiva do dia a dia em um supermercado? Há alguma beleza possível nesses espaços de bastidores de compras? Em pacotes de alimentação e em produtos de limpeza? Bom, por mais paradoxal que isso pareça, o diretor Thomas Stuber prova, com Nos Corredores (In den Gängen), filme baseado em conto de Clemens Meyer, que há. Apostando em ângulos de câmera pouco óbvios, em uma iluminação discreta, em um desenho de produção tão sutil quando grandioso - o que não é afinal um depósito senão um amontoado de objetos agrupados de forma mais ou menos ordenada? - o realizador nos contará a história de Christian (Franz Rogowski), um sujeito taciturno, de poucas palavras, mas bastante observador, que começa a trabalhar no turno da madrugada em um supermercado.

Como em qualquer novo local, ele passa pelo seu "batizado" - as brincadeiras e a impaciência de seus novos colegas, os pequenos ensinamentos -, com uma resignação que parece saltar de seus olhos curiosos. Circulando pelos corredores, aprendendo a dirigir a empilhadeira, se atrapalhando, avançando, pegando um café aqui e ali, a vida ao seu redor vai acontecendo sem grandes novidades. Ao espectador a experiência do tédio e do enfado é consolidada em movimentos que se repetem - como nas sequências insistentes em que Christian veste seu uniforme de forma quase robótica (sensação ampliada pelos cortes secos) -, e pela pouquíssima engenhosidade que envolve o trabalho, afinal, lá pelas tantas o protagonista se familiarizará com aquilo para o qual foi contratado. E, o que mais? Algum segredo sobre o passado? Quais os motivos de tanto silêncio? De tanto ouvir e pouco se manifestar? Pra quê tantas tatuagens? Qual o sentido afinal dessa existência tão ordinária quanto solitária?

Sem muita pressa, Stuber vai entregando as pistas aos poucos, misturando aqui e ali fragmentos de obras distintas como a francesa O Valor de Um Homem (2015) ou a mexicana Almacenados (2015) - ambas sobre o universo do trabalho -, em que não muito acontece, mas quando nos damos conta, estamos diante de uma ampla reflexão sobre ressocialização, relação empregado e patrão, oportunidades, entre outros. Em Nos Corredores há um carismático superior, no caso o veterano Bruno (Peter Kurth), que parece ficar preocupado com a chegada de Christian (estaria ele sendo descartado?), e uma colega de trabalho misteriosa, chamada Marion (a sempre ótima Sandra Hüller), que despertará enorme curiosidade no protagonista. Qual é, afinal, a história da mulher? O que lhe move? Qual o diálogo possível com uma colega? É flerte ou é amizade? São tantas as pequenas perguntas que careceriam de enormes respostas que é praticamente impossível ficar alheio a um projeto desse tipo.

Em entrevistas para o Festival de Berlim, onde o projeto foi exibido, o diretor explicou que a "solidão é um aspecto muito importante no cinema" - e talvez aí esteja a chave. No caso de Christian há um detalhe interessante que é como ele vive a solidão: de forma resiliente, manifestando pouco sobre seus sentimentos, sendo feliz em pequenos instantes, como se tateasse em piso desconhecido. Quem assiste fica meio que no vácuo, mas vai sendo agraciado aqui e ali com um ou outro comentário ou alguma reflexão que contribuirá para fazer o encaixe narrativo. Toda essa intenção sendo ampliada por um ótimo uso da trilha sonora - que em muitos casos surge de forma diegética, o que forma uma espécie de balé mecânico meio aleatório nesse vai e vém cotidiano. Ainda assim, vale mencionar: trata-se de uma experiência absolutamente aberta, o que talvez desagrade alguns paladares. Já quem se aventurar, certamente irá se identificar com essa a dura ideia de que a nossa existência ocorre, em grande parte, em meio a cubículos fechados, equipamentos frios e relações pouco profundas.

Nota: 8,5


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