quarta-feira, 2 de março de 2022

Cinema - Licorice Pizza (Licorice Pizza)

De: Paul Thomas Anderson. Com Alana Haim, Cooper Hoffman, Mary Elizabeth Ellis, Bradley Cooper e Sean Penn. Comédia dramática / Romance, EUA, 2021, 133 minutos.

Assim que subiam os créditos finais de Licorice Pizza (Licorice Pizza) comecei a me dar conta de como o novo filme de Paul Thomas Anderson (Sangue Negro) parecia ser sobre tudo e sobre nada ao mesmo tempo. Bom, tentando explicar é sobre tudo porque é a obra de amadurecimento por excelência, que nos apresenta a persistentes jovens da geração baby boomer que se aproximam da idade adulta em meio a incertezas, inseguranças, anseios e desejos. Desejos de tudo: sexuais, de bonança financeira, de constituir família, de ter uma estabilidade. Mas é também um filme sobre o nada - um "nada" meio à moda Seinfeld - porque se constitui de uma série de acontecimentos que mais parecem uma sequência de esquetes aleatórias, meio imprevisíveis, em que assistimos jovens vivendo, sobrevivendo, tentando. Errando e acertando. Se frustrando, mas sem deixar a peteca cair. Sofrendo decepções, mas achando que a vida sempre será melhor ali adiante, na curva seguinte, na próxima esquina. A vida, a vida de qualquer pessoa, ali, na tela. 

Somos, afinal, seres que parecem sempre insatisfeitos. E Licorice Pizza leva essa questão até o limite do aceitável, na relação cheia de ambiguidades de Alana Kane (Alana Haim) e Gary Valentine (Cooper Hoffman). O filme por sinal já abre com um belo plano sequência, em um longo diálogo em que Gary tenta, à sua maneira, cortejar Alana. Mas há um problema aí: a jovem de 25 anos é uma espécie de monitora da escola em que o adolescente de 15 estuda. Dez anos de diferença que, não demorará, se diluirão em meio a experiências mútuas, paixões secretas, decepções amorosas. Prisões. Eventos sociopolíticos. Pessoas indo e vindo. Imprevisibilidade. Um monte de encontros e desencontros, numa enxurrada deliciosa de assistir não apenas pela leveza, mas também pelo apuro técnico. Pela riqueza do desenho de produção, pelos figurinos exuberantes (e extravagantes) e pela trilha sonora onipresente (cortesia, mais uma vez de Jonny Greenwood) - todos, talvez, injustiçados no Oscar desse ano.



E tudo é conduzido por Paul Thomas Anderson a partir de um roteiro bem amarrado, que nos leva de um ponto a outro na narrativa sem jamais nos deixar confusos, fazendo de cada salto temporal uma espécie de interlúdio que nos conduz às ocorrências de forma palatável, crível. Assim Gary inicia como o ator mirim que se aposenta - aparentemente ele não serve mais para os papeis que busca -, mas sem grande sofrimento, já que no instante seguinte ele já se vê envolto em um negócio de comercialização de colchões de água - que será um inesperado sucesso -, até desembocar num empreendimento que se aproveita da legalização dos jogos de fliperama. Já Alana é a parceira involuntária das maluquices do jovem ainda que, pela sua experiência, seja capaz de perceber os movimentos políticos e sociais para, também à sua maneira, se aproveitar deles, como no instante em que ela se aproxima de um candidato a prefeito (papel de Ben Safdie) para lhe assessorar.

Enquanto tudo se desenrola há a paixão que nunca acontece, que já dei a entender anteriormente. Com uma verdadeira coleção de figuras excêntricas cruzando o caminho da dupla, caso do astro do cinema William Holden (Sean Penn) e do cabeleireiro e produtor Jon Peters (Bradley Cooper) - duas pessoas reais que conferem certo charme real e irreal (olha a ambiguidade novamente) ao filme -, a obra também nos leva da tensão ao riso em questão de segundos, como no caso da longa cena em que Alana precisa improvisar enquanto dirige um caminhão. Aliás, a conclusão dessa sequência é a prova vida de que aquilo que permanece na nossa memória, com afeto, como uma lembrança viva e remota, não necessariamente precisa ser um grande acontecimento. Nossa existência, ao cabo, é uma coleção de eventos grandes e pequenos, de pessoas indo e vindo, de gente que cruza o caminho. Só que às vezes a felicidade pode estar justamente ali do lado. No simples. No aconchegante. No Confortável. E Licorice Pizza faz questão de nos lembrar disso.

Nota: 8,5


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