sexta-feira, 6 de janeiro de 2023

Novidades em Streaming - A Mulher Rei (The Woman King)

De: Gina Prince-Bythewood. Com Viola Davis, John Boyega, Thuso Mdebu e Lashana Lynch. Aventura / Drama, Canáda / EUA, 2022, 135 minutos.

Devo admitir que concluí a sessão de A Mulher Rei (The Woman King) com sentimentos mistos. Por um lado um filme que faz um mergulho na África Ocidental do Século 19, feito quase integralmente por atores negros, contando uma história de heroísmo que envolve um grupo de guerreiras que luta contra colonizadores e o tráfico de escravos - uma trágica marca do continente. De outro, uma obra que pode até funcionar num estilo "parte ação, parte drama de amadurecimento" mas que, eventualmente, a despeito de todos os seus méritos, parece meio antiquada - por mais paradoxal que isso possa parecer. Sim, guerreiras negras defendendo seu Reino com unhas, dentes, espadas e muita fúria e estratégia é algo definitivamente inovador. Mas há um quê de produção estilo Sessão da Tarde no filme da diretora Gyna Prince-Bythewood que talvez não tenha me pegado tanto. Talvez o senso de humor meio deslocado e aleatório. Talvez essa coisa de batalha, que faz lembrar uma época em que obras como Coração Valente (1995) venciam o Oscar. Parece algo de outro tempo. Ainda que, em igual medida, estejamos olhando para o futuro.

Por que não dá pra negar que Viola Davis comandando as mulheres Agojie dentro das paredes do Palácio de Dahomey é algo verdadeiramente empolgante. Aliás, Viola Davis é sempre um capítulo a parte e aqui, no papel da General Nanisca, ela equilibra fúria e vulnerabilidade que, em muitos casos, são expressadas apenas com o olhar. Por vezes na mesma sequência ou até na mesma cena. Com traumas que surgem, aqui e ali, por meio de flashbacks esmaecidos em sua memória, ela é a encarregada de treinar um grupo de novatas que integra o Reino de Daomé - estando entre elas a jovem Nawi (Thuso Mbedu). O objetivo é o de prepará-las para que se defendam de tribos vizinhas e maiores - como é o caso do Império Oyo - que estão se articulando com navegadores portugueses para a compra de uma nova remessa de escravos. O imperialismo europeu é uma ameaça, simbolizada pelo comércio transatlântico de escravos. E, insatisfeitas com essa "política" que devasta seus povos, as Agojie pretendem barrá-la. 

Ao cabo, essa é uma história que tem tudo a ver com as inúmeras discussões sobre machismo, direitos das mulheres, xenofobia e outros preconceitos, que são tão atuais. Ok, em 1832 poderia até não existir ainda o movimento que luta para que o "lugar da mulher seja onde ela quiser". Mas as Agojie funcionam, nesse sentido, como esse recorte ainda hoje "marginalizado" da sociedade que, indiferente à ideia de ter um marido e se submeter ao simples ofício de dona de casa, opta por ser outra coisa - aqui, no caso, ser uma guerreira. É assim que Nawi chega ao Palácio de Dahomey, sendo apresentada ao Rei Ghezo (John Boyega) e, posteriormente, à Nanisca. Nawi se recusa a um casamento forçado com um homem muito mais velho (e violento). Seu pai fica insatisfeito, ela também. Excluída da lógica estabelecida pelas convenções sociais ela se oferece para o treinamento. E, bom, será através do seu olhar ainda ingênuo e um tanto destemido, que descobriremos os caminhos que lhe conduzirão a ser uma imponente líder. Naquela caso de jornada de heroi (e de amadurecimento) típica dos filmes épicos.

Ainda que os temas sejam sérios e as batalhas sangrentas, aqui e ali, a obra é salpicada por comentários bem humorados e um senso cômico meio deslocado - especialmente nas interações entre Nawi e a sua mentora Izogie (a ótima Lashana Lynch). E ainda que a experiência se torne um pouco truncada por conta da demora em as coisas acontecerem - talvez uns 20 minutos a menos fizessem bem na ilha da edição -, há que se dizer que o resultado certamente agradará os fãs de narrativas de heroísmo em que minorias superam os grupos mais fortes. Nesse sentido há algumas sequências comovedoras envolvendo o esforço daquelas mulheres em prol da coletividade. Livremente inspirado em fatos reais, o filme tem excelente desenho de produção, trilha sonora, maquiagem e, especialmente, figurino, podendo ser lembrado em algumas categorias técnicas no Oscar (além da própria Viola Davis ser uma excelente aposta no Bolão). Como disse lá no começo, tem clima de mais do mesmo - ainda que, não esqueçamos, o óbvio também precisa ser dito. E em tempos em que ideias tanto se repetem, é bom vermos esse tipo de história mais clássica, sendo repaginada.

Nota: 7,5


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