segunda-feira, 29 de agosto de 2022

Tesouros Cinéfilos - 10 Horas Até o Paraíso (10 Timer til Paradis)

De: Mads Matthiesen. Com Kim Kold, Elsebeth Steenloft e Lamaiporn Sangmanee Hougaard. Drama, Dinamarca, 2012, 91 minutos.

Histórias de mães castradoras que impedem seus filhos de exercer plenamente sua independência - de "voar", como costumamos dizer - existem aos montes por aí. Mas o que torna diferente 10 Horas Até o Paraíso (10 Timer til Paradis) - filme disponível no Mubi - talvez seja o contraste que envolve Dennis (Kim Kold), o seu protagonista. Com quase dois metros de altura, o sujeito é um fisiculturista tímido que, a despeito dos vários títulos da modalidade que ostenta na casa em que divide com a mãe, tem extrema dificuldade para se relacionar, para socializar. Especialmente com as mulheres. Tímido, introspectivo, Dennis é uma massa de músculos - um homem forte, mas que caminha pra lá e pra cá com os ombros encurvados, retraídos. As tentativas com o sexo oposto são sempre desastrosas. Com pouca habilidade ele parece nunca ter tido um relacionamento sequer. E a vigilância permanente da mãe Ingrid (Elsebeth Steenloft) piora tudo.

Aliás, não será necessário muito tempo para que percebamos que o tipo de criação de Dennis diz muito sobre como ele se comporta atualmente. Com 38 anos, ele quase parece uma criança envelhecida em corpo de adulto - uma discrepância assombrosa para quem alcança, seguramente, um peso próximo dos 150 anos. Kim Kold, por sinal, converte o seu personagem em uma figura carismática e afável, bem distante do estereótipo exibicionista que costuma frequentar as academias. A despeito, por exemplo, de seu corpo invejável para aquilo que se propõe, jamais se utiliza dele para levar alguma vantagem. Ao contrário, quando uma jovem tenta seduzi-lo pedindo para vê-lo sem camisa ele se recolhe, se enfurna em seu universo. Quase como um animal desconfiado, em meio a olhares que sugerem fragilidade emocional diante da situação vivida por ele. É um gigante gentil que carrega um peso maior que a vida.



Mas quando um tio seu retorna da Tailândia casado, o seu sorriso meio de lado na festa que celebra o matrimônio do parente é revelador. Estimulado pelo irmão da mãe, Dennis sai de Copenhague em direção à convidativa Pattaya, no País asiático. De acordo com seu tio, lá a chance é maior de se obter uma companhia. Para conseguir subir no avião sem gerar desconfiança alguma de Ingrid, Dennis mente que está indo participar de uma competição na Alemanha. Aos trancos e barrancos, o protagonista sofre nos primeiros dias de Tailândia - ele não imaginava que a dica do tio envolvia sexo pago e relações nada românticas, típicas de quem procura esse tipo de turismo. Frustrado, Dennis vai parar em uma academia local, onde faz novos amigos, treina um pouco e conhece a recém viúva Toi (Lamaiporn Sangmanee Hougaard). Onde, enfim, começará a encontrar algum carinho.

Com ecos do clássico Marty (1955) numa mistura com o recente Desajustados (2015), esse é aquele caso de O Virgem de 40 Anos (2005), mas sem tanta graça. Ao contrário, poucas vezes uma experiência foi tão verdadeira ao evidenciar a inaptidão dos que se sentem inadequados e de como qualquer movimento que quebre a lógica de sua rotina costuma envolver um grande esforço. Mas a mensagem embutida sobre a necessidade de se romper o cordão umbilical, que interromperá também a inconveniência da família - especialmente quando se chega à vida adulta, aos boletos e as preocupações de gente grande - é um acerto. E não vai adiantar Ingrid chorar, espernear, ou fazer de tudo para que Dennis não se sinta adulto. Aliás, poucas vezes torci tanto para que alguém se livrasse de um "cativeiro" nessa obra totalmente verossímil, com um protagonista espetacular. Méritos para Kold, que é fisiculturista na vida real e que entrega aqui uma interpretação que só não foi lembrada nas grandes premiações porque está distante dos grandes centros. O prêmio de consolação veio de Sundance. Merecido, diga-se.


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