De: David Lynch. Com Kyle MacLachlan, Laura Dern, Isabella Rossellini e Dennis Hopper. Drama / Suspense, EUA, 2022
Intrigado, Jeffrey procura o delegado local para relatar o ocorrido. Claramente há algo por baixo dessa superfície tão certinha - e que a alegórica imagem de um grupo de formigas revolvendo a terra evidencia de uma forma nem tão sutil. No caminho para casa, o protagonista é interpelado pela jovem Sandy Williams (Laura Dern) que afirma que o mistério tem algo a ver com uma certa cantora de cabaré chamada Dorothy Valens (Isabella Rosselini), o que desperta a curiosidade do rapaz. Como se fossem uma dupla de detetives sem nenhuma experiência, ambos resolvem investigar o caso por conta própria - o que envolverá a invasão do apartamento de Dorothy. As descobertas serão aterradoras, a partir da entrada em cena de um perverso psicopata de nome Frank Booth (Dennis Hopper) que mantém o marido e o filho da cantora em cativeiro, enquanto a utiliza para satisfazer as suas sádicas perversões sexuais.
Onírico, perturbador, eventualmente grotesco, Veludo Azul é daqueles filmes que geram desconforto nos espectadores mais impressionáveis. A sequência em que Booth violenta Dorothy por longos minutos, enquanto Jeffrey os observa, paralisado, do armário, é brutal e excêntrica em igual medida. De posse de um equipamento de gás do riso - do qual é viciado - o atormentado psicopata age como um predador do submundo, gargalhando na hora errada, enquanto abusa da cantora. Como espectadores somos confrontados por esse voyeurismo bizarro que emerge da união entre sexo e violência, com tudo se tornando ainda mais estranho a cada vez que a singela canção título, de autoria de Bobby Vinton, aparece, com sua melodia de romance dilacerante e letra de paixão comovente (Ela vestia veludo azul / Mais azul que o veludo só a noite / Mais suave que o cetim só a luz das estrelas).
Tecnicamente vibrante, a obra utiliza a sua fotografia, o desenho de produção e os elementos do cenário para evidenciar os contrastes que envolvem aqueles que acompanhamos. O apartamento de paredes vermelhíssimas de Dorothy, por exemplo, evoca a paixão e a dor que decorrerão do sangue derramado nesse universo de abusos - um paradoxo aos tons cinzas de neo noir evocados pelas noites sombrias. A sensação eventualmente parece ser a de sonho - mas um sonho bizarro que se assemelha a um pesadelo (e que se tornaria, de alguma forma, a marca registrada de boa parte da filmografia de Lynch). As soluções não serão fáceis, há toda uma tensão no ar. Mas a construção do suspense é sinuosa, indo no limite da esquisitice como matéria-prima pra esse "mundo estranho" em que todos se encontram, como lembra Sandy em mais de uma oportunidade. Vale revisitar na Amazon Prime.
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