terça-feira, 6 de setembro de 2022

Novidades em Streaming - Elvis (Elvis)

De: Baz Luhrmann. Com Austin Butler, Tom Hanks, Olivia DeJonge e Dacre Montgomery. Drama / Musical, EUA, 2022, 159 minutos.

"Ela estava tendo sentimentos que não tinha certeza se deveria gostar. Ele era um gosto de fruta proibida e ela poderia tê-lo comido vivo."

"Caímos em uma armadilha. Não posso escapar". Em uma das tantas grandes sequências de Elvis (Elvis), superprodução de Baz Luhrmann que acaba de estrear na HBO Max, o Rei do Rock está em uma espécie de recomeço musical no início dos anos 70, após a sua fracassada incursão por Hollywood. Na ocasião, todo um aparato foi montado para uma apresentação no International Hotel, em Las Vegas, com a presença de um público seleto e uma banda de apoio de altíssima qualidade - o que incluía os grupos gospel The Imperials e Sweet Inspirations. Enquanto o artista entoa os sinuosos versos de Suspicious Minds, o Coronel Tom Parker (Tom Hanks) se ocupa de fechar um contrato de cinco anos para que o astro se apresente no local, com um salário milionário - e, muito provavelmente, um esgotamento físico e mental que decorreria dos mais de 500 shows no período. Encarnado de forma magnética por Austin Butler, Elvis Presley caía em (mais) uma armadilha. Da qual não podia escapar.

E, sim, muito mais do que uma obra sobre a ascensão e a queda de um dos grandes artistas da nossa história, Elvis é uma obra sobre o controverso relacionamento de Parker com o cantor. Até mesmo porque, se por um lado o coronel foi um dos responsáveis por conduzi-lo a um estrelato meteórico quando, ao observa-lo em ação - com seu frenético, sexy e envolvente rebolado, que levava a platéia à loucura -, o incluiria na turnê do cantor country Hank Snow (David Wenham), por outro ele também seria o mentor de um sem fim de decisões erradas que, de alguma forma, atrasariam a carreira de Elvis. E, a bem da verdade, é possível perceber na trama como as suas personalidades poderiam ser diametralmente opostas. Elvis era transgressor, iconoclasta, selvagem em uma alguma medida, e até inconsequente em outra, ao passo que Parker adotava uma postura comportada, conservadora, submissa às convenções, mas que escondia a sua perversão (e a sua ambição) atrás de sorrisos e de promessas de sucesso fácil.


Nesse sentido seria óbvio que, lá pelas tantas, eles bateriam de frente - e aqui está uma das grandes mágicas da produção. Muito mais do que o mito ou do que a lenda maior do que tudo, nos deparamos aqui com o Elvis ao menos um pouquinho, que seja, "gente como a gente" - ainda que dono de um talento único que viria a ser o seu ônus e o seu bônus, com a fama vindo à reboque do uso de medicamentos para conseguir aguentar a agenda insuportável, ao mesmo tempo em que luta para sustentar sua família, alcançar seus sonhos, persistir. Tudo enquanto a máquina trituradora de astros e estrelas passa, prontinha pra apresentar a seus jovens uma nova atração - que podem ser os Beatles ou os Stones ou mesmo Little Richard ou Fats Domino (o rock surgia, afinal). Já Parker é o vilão onipresente que participa de praticamente todos os negócios que envolvem sua maior estrela - e o seu faro desenfreado para os negócios, que poderia ser uma de suas grandes virtudes, também o conduzirá a uma derrocada motivada por uma ganância quase infinita.

Mesmo sendo menos Baz Luhrmann do que os filmes do Baz Luhrmann, Elvis é uma obra tecnicamente impecável - e será praticamente impossível não ver o filme indicado ao Oscar em categorias como Desenho de Produção, Maquiagem e Penteados, Figurino, Edição e talvez até Roteiro Original (com a cereja do bolo podendo ser uma nominação à Filme). É tudo muito bem costurado, com cada sequência da cronologia estabelecendo diálogo com eventos políticos, culturais e sociais históricos - casos dos assassinatos de Martin Luther King e Bob Kennedy. Aliás, como não ser absorvido pela sequência em que Elvis quebra o protocolo e enfrenta a polícia, que pretendia prendê-lo caso ele cantasse e dançasse de forma lasciva em um show voltado apenas ao público branco (com um político a alguns quarteirões de distância proferindo um discurso de exaltação higienista aos confederados)? É esses instantes que transformam a obra em uma experiência elétrica, fisicamente palpável, cheia de entusiasmo, de significado e de licenças poéticas mais do que justas, que englobam da juventude de Elvis na pequena Tupelo até o ocaso em circunstâncias pouco claras. E tudo embalado pelo melhor do repertório do ídolo - indo de Hound Dog, passando por Blue Suede Shoes até chegar à Jailhouse Rock. É um filme grandioso. Que merece demais a nossa atenção.

Nota: 8,5

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