sexta-feira, 5 de junho de 2020

Cinemúsica - Fantasia (Fantasia)

Hoje em dia essa história é mais do que conhecida: foi uma ideia de JERICO a do Walt Disney a de juntar música clássica e animação no começo dos anos 40, em uma obra que receberia o nome de Fantasia (Fantasia). A intenção era nobre. Nobríssima! Tentar popularizar peças eruditas de Beethoven, Schubert e Stravinsky, juntando-as ao rato mais famoso daquela época - no caso, o Mickey. Foi um fiasco de bilheteria, com os poucos espectadores que se arriscaram, saindo enfastiados da experiência lisérgica, cheia de cores, formas e paisagens que poderiam vir acompanhadas de segmentos do Quebra Nozes, de Tchaikovsky ou de Uma Noite na Montanha Calma, de Mussorgsky. A regência, que ocorria em tempo "real", como parte integrante da película, ficou a cargo do maestro Leopold Stokowsky.

Nas oito histórias, os mais variados "formatos". O mais conhecido, como não poderia deixar de ser é, é aquele que evoca O Aprendiz de Feiticeiro, enquanto o Mickey se esforça para ensinar um grupo de vassouras (!) a levar baldes de água de um lado para o outro. A experiência com magia dá errado, claro, e Mickey quase se afoga enquanto as vassouras vilanescas se replicam de forma intermitente, inundando todo o cenário, ao mesmo tempo em que a música avança, com suas notas cheias de intensidade e volúpia. Aliás, está aí uma das mágicas do filme que contou com um coletivo de diretores e que viria a ser resgatado anos depois, por uma plateia de cinéfilos apaixonada: a de nos fazer pensar em quais as imagens mentais que "enxergamos", ao ouvir certa música. Que formas ou desenhos que se descortinam quando escutamos as notas econômicas da Dança da Fada Açucarada, de Tchaikovsky, por exemplo? Ou a Pastoral de Beethoven?


Bom, no caso da peça que integra o Quebra Nozes, o que vemos é um cenário aquático em que flores, algas e fadas se alternam de forma delicada, em um coletivo de cores reforçado por um brilho impactante. Em outras etapas do balé de Tchaikovsky - aliás, o próprio compositor russo detestava a sua criação, considerando-a excessivamente popularesca -, o que se veem são flores, cogumelos, cachoeiras e peixes, numa dinâmica que equilibra placidez e energia. A suíte se encerra com a primaveril Valsa das Flores, que nos força a um tipo de imagem mental quase óbvia. Já na Pastoral quem invade a tela são personagens da mitologia - de unicórnios a centauros, passando por deuses como Apollo, Baco e Zeus. A suíte, bucólica e onírica, se encerra com querubins de formas bem desenhadas que se misturam com deusas de um paraíso imaginário.

Imaginar. Essa foi a brincadeira de Disney que pretendia fazer um filme por ano nesse estilo, após o lançamento de Fantasia - o que não foi possível, dado o fracasso retumbante de bilheteria e o altíssimo custo de produção. O que ficou da experiência foi o vibrante caráter experimental da iniciativa que, vista hoje com distanciamento, se torna de certa forma compreensível. Disney vinha de dois sucessos, no caso Branca de Neve e Os Sete Anões (1937) e Pinóquio (1940). Se havia hora para arriscar, era aquela. Nunca mais repetiria a ideia. Ao contrário, investiria nos anos seguintes em obras que se tornariam clássicos instantâneos, como Dumbo (1941) e Bambi (1942), que permanecem até hoje no imaginário dos cinéfilos. Já o desfile de paisagens abstratas, com alternância de hipopótamos bailarinos, avestruzes que dançam, flores silvestres, deuses ecumênicos e vulcões que explodem em meio a dinossauros agressivos e danças tribais virou peça de excêntrica curiosidade, mas que foi resgatada em 1999, sendo redescoberta por um séquito de fãs.

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