Poucas bandas surgidas nos anos 2000 conseguiram manter uma coesão - não apenas de estilo, mas também de qualidade sonora - como o The National. Não à toa, não é tarefa fácil escolher apenas um disco do grupo, oriundo de Cincinatti, Ohio, para ilustrar a nossa segunda edição do Lado B, Classe A. Quadro que, apenas para lembrar, tem o objetivo de apresentar a vocês alguns dos nossos discos modernos favoritos, especialmente aqueles lançados na última década, de bandas que não são assim tão conhecidas do grande público. E que já podem ser qualificados na categoria de "clássicos da atualidade". Esse recorte, é preciso que se diga, poderá ser bem distinto, como vocês verão mais adiante, já que por aqui poderão passar desde o Deerhunter até o Arcade Fire.
Na verdade, o primeiro álbum que ouvi da banda capitaneada por Matt Berninger foi o também já clássico Boxer (2007) que, para muitos fãs do grupo, se constitui no melhor trabalho. O fato é que foi paixão a primeira "ouvida". Aqueles versos ao mesmo tempo soturnos e carregados de melancolia, amparados por um instrumental acústico, cru - bem distante das firulas computadorizadas de outras bandas da mesma geração (alguém aí falou em Muse?) - me arrebataram. Ainda que claustrofóbico, o trabalho era (e ainda é, claro!) repleto de refrões grudentos, daqueles para ficar na cabeça ainda algumas horas e dias após as audições. Quem já escutou canções como Fake Empire e Green Gloves, pra citar apenas duas, sabe do que estou falando. Bom, na ocasião o álbum permaneceu no repeat durante toda a noite. Aliás, lavar a louça da janta poucas vezes foi tão prazeroso como daquela vez.
A audição do Boxer serviu de porta de entrada para outros discos. O álbum anterior, Alligator (2005), se não é tão coeso como o seguinte, é igualmente belo, possuindo ainda duas das melhores canções do grupo: Secret Meeting e The Geese of Beverly Road. O mesmo valendo para o mais recente trabalho dos caras, intitulado Trouble Will Find Me, de 2013. Mas foi com High Violet (2010), que o quinteto atingiu a sua plenitude artística - se é que possível que a sua trajetória seja descrita dessa maneira. Com um pouco mais de apuro na parte instrumental, muito por conta da riqueza de detalhes alcançada pela dupla de guitarristas Aaron e Bryce Desner, o disco mantém o clima perturbador ao projetar em seus versos problemas do homem moderno, especialmente os da seara amorosa.
As letras são um verdadeiro espetáculo a parte. A abertura, com Terrible Love, utiliza uma metáfora ao comparar um amor complicado com o fato de se estar "caminhando com aranhas". As tristezas estão por todo o canto. Em Sorrow, Berninger lamenta: I live in a city sorrow built / It's in my honey, it´s in my milk. Já em Afraid of Everyone, a fuga, com base em medos cotidianos é tema: With my kid on my shoulders, I'll try / Not to hurt anybody I like. Os lamentos sussurrados, cantados de forma arrastada e melancólica, quase tornam "visível" a figura de um homem que sofre de amor, em algum subúrbio, enquanto entorna goles e mais goles de algum whisky barato. O disco não recebeu nota 8,7 do conhecido site Pitchfork à toa - recebendo na ocasião o selo de Best New Music. E nós, aqui do Picanha, o reconhecemos como um legítimo exemplar Lado B, Classe A.
Nenhum comentário:
Postar um comentário