Quem imaginou que o Fontaines D.C. pudesse distensionar o seu som denso, enevoado - talvez tornando-o mais acessível ou comercial em seu quarto registro, Romance -, errou o pulo. Seguindo no terreno do pós-punk lúgubre, que mescla guitarras cheias de fuzz com as linhas de baixo palpitantes, o coletivo de Dublin, na Irlanda, não mudou uma vírgula do seu estilo - para alegria dos fãs. O que mudou, desde a estreia com Dogrel (2019), foi o mundo, que parece ainda mais acelerado, tecnológico, turbulento e distópico, em um cenário de extremismo político, guerras, pandemias e tentativas individuais de sobrevivência em meio a toda a tensão. Contexto que, para quem tem aderência a um rock mais direto e reflexivo, que mescla divagações políticas e sociais amplas com o intimismo das pequenas coisas, se torna um prato cheio. O que é reforçado, não por acaso, pela voz de barítono às vezes seca, noutras pastosa, do vocalista Grian Chatten.
Nesse sentido, é preciso que se diga que esse não é um trabalho de fácil absorção, já que as ideias surgem espalhadas em canções nunca óbvias, de poucos refrãos e que por vezes parecem saídas de um filme alternativo de baixo orçamento. Mesmo singles como Starburster emergem em uma mistura quase aflitiva de hip hop com shoegaze, com a letra sobre síndrome do pânico e comportamento autodestrutivo, tendo como "efeito" adicional a respiração sôfrega do vocalista. Outros instantes como a noventista Here's the Thing não fariam feio em um disco tardio de grunge, que refletisse a realidade em meio ao caos. No material de divulgação, Chatten destacou que o álbum funciona como uma distopia futurista inspirada no clássico japonês Akira e em filmes como A Grande Beleza (2013) de Paolo Sorrentino. O que explica esse clima meio de submundo urbano e de glamour desbotado de canções como In the Modern World, Favourite e Death Kink. Essencial.
Nota: 9,0
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