terça-feira, 30 de janeiro de 2024

Pitaquinho Musical - The Smile (Wall of Eyes)

Vamos combinar que existem discos que a gente escuta, cantarola o refrão, decora as letras e consome instantaneamente. E há, por outro lado, aqueles álbuns que são feitos para serem saboreados aos poucos. Que nem sempre são fáceis - e que exigem do ouvinte uma atenção a mais, uma persistência que, em muitos casos, nem combina tanto com essa coisa moderna da absorção cultural imediata, mas que parece estar sempre olhando para o seguinte, para o que vem depois, para o próximo. Que o Thom Yorke é uma espécie de elo de resistência a esses modelos mais óbvios, mais comerciais, não chega a ser exatamente uma novidade. Era assim no Radiohead, com sua música cósmica, etérea, enevoada e alienígena funcionando como uma metáfora pra tempos tecnológicos, urgentes e um tanto caóticos que antecipariam a virada do milênio. É assim também com o The Smile, que chega ao segundo trabalho com Wall of Eyes.



Mais uma vez trabalhando ao lado do parceiro de longa data, o guitarrista Jonny Greenwood, e de Tom Skinner - o baterista do coletivo Sons of Kemet - Yorke volta novamente seu olhar para questões contemporâneas e fatalistas, casos da pandemia (Friend of a Friend) ou de disputas de espaços políticos (Teleharmonic). Tudo por meio das letras enigmáticas, ambíguas, que se somam às melodias caleidoscópicas, que nos levam de lá para cá em uma mistura de jazz, eletrônica minimalista e algo que se aproxima do rock. Um bom exemplo desse expediente, pode ser encontrado em Read the Room, que remonta a um Radiohead da era King of Limbs. Mesmo com guitarra, baixo e bateria mais tradicionais, neste caso chama a atenção a forma pouco convencional que o instrumental ondula como se feito de fragmentos, que vão no limite entre a inquietação e a desordem. São músicas harmoniosas mas conflitantes, que se comprimem e se expandem, criando um universo próprio. Caso de outras joias, como a instigante Bending Hectic.

Nota: 8,5


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