terça-feira, 29 de agosto de 2023

Tesouros Cinéfilos - Oldboy

De: Park Chan-wook. Com Choi Min-sik, Kang Hye-jung, Yoo Ji-tae e Ji Dae-han. Drama / Suspense, Coréia do Sul, 2003, 119 minutos.

"Ria e o mundo rirá com você. Chore e você chorará sozinho." Uma história de vingança vertiginosa e cheia de reviravoltas, resultado de um roteiro impecavelmente bem costurado. Num arroubo minimalista, assim pode ser resumida a experiência com Oldboy - obra de Park Chan-wook, que completará 20 anos de seu lançamento em setembro. Mas o filme é muito mais do que só uma narrativa de vendeta, afinal, trata-se de um thriller psicológico voluptuoso e surpreendente, que deriva para temas diversos, como, perdas familiares, a brutalidade humana e a obsessão catártica pela morte. Ao cabo, pode não ser um projeto para todos os paladares, dada a violência gráfica estilizada de suas sequências, com direito a cenas que envolvem desde dentes sendo arrancados na martelada, passando por polvos sendo consumidos vivos, até chegar aos impulsos sexuais edipianos. É tudo exagerado, como se estivéssemos em uma espécie de mangá alternativo.

A trama começa com cenas do empresário Oh Dae-su (Choi Min-sik) que acaba de ser preso por embriaguês. Após um amigo pagar sua fiança, o homem faz uma ligação para a filha, que está completando seu quarto aniversário - que ele perderá dado o imbróglio que se envolveu. Mas as coisas pioram quando ele é sequestrado e acorda em um quarto fechado. Local em que ele permanecerá aprisionado, sem muita explicação. Por quinze anos. Um encarceramento tortuoso, que afetará não apenas o corpo, mas também a mente - o que piorará quando ele souber que sua esposa foi assassinada e que ele mesmo é o principal suspeito. Só que, assim como Dae-su é preso sem nem saber por quê, nem por quem, ele é solto no topo de um prédio abandonado, após uma sessão de hipnose. E terá pouco tempo para tentar descobrir quem foi seu carcereiro e os motivos que lhe levaram ao crime. 



Em meio a coleta de pistas que possam lhe levar a possíveis inimigos, o homem  recebe um celular e uma quantia de dinheiro de um morador de rua. Aos poucos ele perceberá que, mesmo livre, está sendo monitorado. E que no caminho para localizar seu torturador, terá de enfrentar uma série de desafios - com direito a lutas corporais contra capangas que trabalham para o seu algoz (batalhas que fazem lembrar jogos de videogame como Streets of Rage ou Final Fight) em ambientes deliberadamente claustrofóbicos. E como parte dessa teia conspiratória perfeitamente engendrada há ainda a presença da chef de cozinha Mi-do (Kang Hye-jung) que se tornará o interesse amoroso de Dae-su, auxiliando o homem a, inclusive, tentar encontrar a sua filha (que, atualmente, teria sido adotada por um casal que reside na Suécia). É tudo bem estruturado, mas com uma fluidez vigorosa, mesclando flashbacks e cenas atuais que ajudam na compreensão dos fatos e no estabelecimento de uma lógica narrativa.

E, para além do filme em si há o aparato técnico eficiente, que vai desde a trilha sonora de notas ao mesmo tempo caóticas e claudicantes, passando pela fotografia dessaturada que amplia a sensação de urgência, até chegar aos planos-sequência bem orquestrados (muitos deles cheios de elementos, com ótimas coreografias). Ao cabo, o que se tem com Oldboy é uma experiência operística que vai para além da violência e de seus signos: há toda uma psicologia por trás, que pode ser percebida nos detalhes, nos comportamentos, nos olhares e nos silêncios. Em uma sequência decisiva, por exemplo, a expressão ambígua de Dae-su mergulha o espectador na incerteza sobre seus sentimentos. Ele sabe o que, de fato, está vivendo naquele instante? Por tudo isso, o filme se converteria em um marco do cinema sul coreano, com sua capacidade única de mesclar o realismo mágico (com suas formigas gigantes e pesadelos abstratos) com os sentimentos demasiadamente humanos. Park Chan-wook venceria o prêmio de direção no Festival de Cannes daquele ano. Pavimentando o caminho para outras obras-primas modernas, caso do recente Decisão de Partir (2022). Vale demais.


Nenhum comentário:

Postar um comentário