quarta-feira, 15 de fevereiro de 2023

Novidades em Streaming - Armageddon Time

De: James Gray. Com Banks Repeta, Jaylin Webb, Anne Hathaway, Anthony Hopkins, Jeremy Strong e Jessica Chastain. Drama, EUA, 2022, 114 minutos.

Ok, a simbologia de um foguete de brinquedo alçando voo pode ser uma metáfora poderosa para o pequeno Paul Graff (Banks Repeta) na bonita cena em que ele está com o seu avô já doente (Anthony Hopkins), no parque Flushing Meadows no Queens, em Nova York. O mesmo vale para as tentativas meio tortas, e até aleatórias, de apontar como o racismo não é legal - novamente o avô de Paul, em um discurso edificante em um País que se aproxima de eleger Ronald Reagan que, em aparições de TV, se apresenta como aquele republicano típico que sonha um futuro ao estilo de frases tipo make America great again. Mas em Armageddon Time, mais recente trabalho do diretor James Gray - do ótimo Ad Astra: Rumo às Estrelas (2019) parece faltar algo que nos conecte efetivamente a história. Que nos faça torcer por aqueles que estão ali, verdadeiramente. Falta molho, parece.

Por que, para além do caráter meio white people problems da coisa toda, a obra inspirada em memórias do diretor soam apenas insípidas. Infelizmente, a impressão que temos é a de que ele está tentando extrair uma história de onde não tem muita coisa. Quer dizer, vá lá, tudo pode ser convertido em história, desde que com bom enfoque - não sejamos injustos. Mas aqui Gray condensa um pouco de tudo e, ao cabo, não aprofunda nada. Por exemplo, as feridas políticas dos Estados Unidos que funcionam como pano de fundo surgem de forma apenas discreta. Os preconceitos, especialmente no que diz respeito às questões raciais, ficam apenas no rasinho, na "piscina das crianças". O tema da morte, do luto, está lá mas, é isso. O vô de Paul já é velhinho e a gente sabe que ele vai morrer. E o amadurecimento de um filho da classe média é apenas o amadurecimento de um filho da classe média: briga com os pais, leve rebeldia, maconha, inseguranças, incertezas, desejos incompreendidos e tudo o mais.

Paul, que estuda em uma escola pública aparentemente por obra da mãe (Anne Hathaway) - que faz parte da Comissão de Pais e Mestres do educandário e pleiteia um cargo maior na Instituição - sonha em ser um artista famoso do mundo das artes plásticas. Ele ainda não sabe direito o que é isso. Quando desenha uma caricatura de seu professor, é repreendido, fica de castigo. Quando visita o Museu de Guggenheim deseja ser um abstracionista à moda de um Vassily Kandinsky, sendo ainda mais incompreendido quando leva essas inspirações para as aulas. No meio do caminho, um episódio envolvendo seu melhor amigo Johnny (Jaylin Webb) faz com que ele seja obrigado a mudar de escola, indo parar na afetadíssima Kew Forest, com seus uniformes pomposos, professores conservadores e um clima Escola Sem Partido (que pretende formar aquela massa de alunos que, em um país como o Brasil, criaria mais tarde o Partido Novo). Bom, na primeira cena no local já nos deparamos com um discurso de Maryanne Trump (Jessica Chastain), nada mais nada menos que a irmã de Donald. O que dá o tom do tipo de proposta de docência que vigora ali.

Como vocês já puderam notar, o destaque aqui é o elenco, que ainda é complementado por Jeremy Strong (o nosso querido Kendall Roy, de Sucession), que interpreta o pai de Paul, sujeito que parece sempre a beira de um ataque de nervos. Há um esforço de interpretação e de tornar os diálogos mais impactantes do que eles soam - em certa altura, uma das tias bolsonaristas de Paul menciona os riscos de o menino estudar em uma escola que tenha pessoas negras. Sim, é absurdo mas, nos tempos de hoje pode soar apenas caricato - ainda que a gente saiba que esse tipo de coisa exista (e muito). Mas talvez houvesse outras formas de abordar a temática. Com mais sutileza. Com ações e não verbalizando. Sei lá. No começo da temporada de premiações, a obra surgia com potencial até mesmo para figurar no Oscar - pra se ter uma ideia, foi uma das indicadas à Palma de Ouro, em Cannes. Mas foi perdendo força por conta de suas fragilidades, certamente. Não é um filme ruim. Tem boa execução, aquela fotografia granulada típica dos filmes alternativos. Gray sabe conduzir essa coisa de família agitada, tendo de tomar decisões difíceis. Mas aqui faltou algo que fizesse esse foguete voar com gosto, pra bem longe. Uma pena.

Nota: 6,5


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