terça-feira, 12 de julho de 2022

Cine Baú - Os Imperdoáveis (Unforgiven)

De: Clint Eastwood. Com Clint Eastwood, Morgan Freeman, Gene Hackman, Richard Harris e Jaimz Woolweltt. Faroeste, EUA, 1992, 131 minutos.

Não deixa de ser meio irônico pensar que talvez o último grande faroeste - ao menos nos moldes dos clássicos de Sérgio Leone ou Don Siegel que marcaram época -, também represente uma espécie de crepúsculo oficial de um gênero. Afinal, o tom de melancolia meio generalizado que rege a narrativa de Os Imperdoáveis (Unforgiven), com o William Munny de Clint Eastwood surgindo como um criador de porcos resignado e nostálgico, funciona quase como uma metáfora perfeita para algum tipo de desencanto que só decorre da maturidade - e que costuma surgir justamente naquele instante em que olhamos para o passado e refletimos sobre tudo aquilo que vivemos até ali. Como agimos ou deveríamos ter agido, quais os arrependimentos possíveis em um velho oeste onde primeiro se atira e depois se pergunta. Munny é um sexagenário taciturno, que carrega no semblante meio esgotado um olhar cheio de ambiguidades: não parece haver orgulho afinal, em ser um "pistoleiro aposentado". Um sujeito que pode ter cometido as mais variadas atrocidades, de forma meio ilógica talvez.

Os instantes iniciais dessa obra-prima dão conta dessa nova vida do veterano que "pendurou a pistola". Em seu rancho não muito proeminente tenta superar o luto pela morte da esposa, enquanto cria os filhos que lhe ajudam em sua lida com os animais. O negócio talvez não seja assim tão promissor, o que faz com que ele aceite uma última missão antes do ocaso oficial: vingar uma prostituta que teve o rosto desfigurado após um ataque ocorrido na cidade de Big Whisky. Para lhe auxiliar na tarefa, ele recruta o seu velho amigo Ned Logan (Morgan Freeman) - sendo a dupla acompanhada também pelo jovem Schofield Kid (Jaimz Woolweltt), que sonha em ser um caubói tão heroico quanto Munny (de quem ele teria ouvido histórias maravilhosas de um familiar). Só que Big Whisky é comandada à ferro e fogo por um xerife chamado Little Bill (Gene Hackman), que não aceita muito bem a ideia de vingança perpetrada pelas meretrizes. Mais do que isso, estampa na entrada da localidade uma placa onde há uma mensagem que proíbe a entrada de forasteiros com armas.


Ao cabo, é um contexto em que não é assim tão fácil definir quem são realmente os mocinhos e os bandidos - e esse tipo de maniqueísmo era muito mais claro para o espectador nos clássicos de antigamente (especialmente nos de John Ford). Aqui Munny pretende abandonar o espectro de violência que ainda lhe ronda (como se fosse uma espécie de fantasma a lhe assombrar e que está pronto para vir à tona). Mais do que isso: dentro de seu armário os esqueletos são pesados e os traumas são doloridos, o que explica a sua predisposição em recuperar qualquer resquício de humanidade (por mais que o sacrifício de porcos inevitavelmente apareça como um tipo de paradoxo apresentado pelo roteiro). E como se já não bastasse toda essa complexidade do quebra-cabeças estabelecido pelo bem engendrado roteiro, há ainda um segundo matador interessado na recompensa das mulheres do bordel - um certo English Bob, encarnado por Richard Harris como uma figura debochada e levemente excêntrica.

Eastwood estava no seu décimo sexto filme da carreira como diretor quando venceria os prêmios de Filme e Diretor no Oscar de 1993, que premiaria ainda Hackman como Coadjuvante e Joel Cox como Editor. E as conquistas soam quase como um divisor de águas que sepultaria o gênero entre os grandes, pavimentando também o terreno para que Eastwood se aventurasse em outros estilos, caso do drama romântico (As Pontes de Madison, 1995), do drama policial (Sobre Meninos e Lobos, 2003) e até do filme de guerra (Cartas de Iwo Jima e A Conquista da Honra, 2006). Para os fãs de faroeste permanece para sempre a imagem meio idílica das roupas balançando no varal em um entardecer amarelado, enquanto Munny se esforça para, novamente, deixar o passado para trás. "É uma coisa infernal matar um homem. Você tira tudo o que ele tem e tudo o que ele vai ter" lembra o protagonista dentro desse contexto. É a deixa para a expiação de um peso que pouco tem a ver com qualquer tipo de glória. É o recado que fica.


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