Ainda que não seja assim tão bem executado do ponto de vista técnico, O Preço da Verdade (Dark Waters) tem como uma de suas fortalezas o seu tema mais do que relevante - especialmente em um momento em que o ativismo ambiental, as discussões sobre a importância da manutenção dos ecossistemas e o debate sobre como nos alimentamos estão em alta. Na trama, Mark Rufallo é Robert Billot, um advogado acostumado a defender corporações, especialmente em casos que envolvem a indústria química. Num certo dia ele recebe a visita de dois agricultores que garantem estar perdendo o seu rebanho bovino para aquilo que acreditam ser um caso de envenenamento. As suas propriedades fazem divisa com um aterro sanitário da DuPont, uma das maiores empresas do mundo e que atua em áreas diversas - de insumos agrícolas a polímeros. Para os produtores, a água consumida por bois e vacas nos mananciais dos arredores pode estar matando os animais. Bom, um deles perdeu quase 200 cabeças para doenças que nem os veterinários conseguem definir direito quais são. É coisa grande em uma daquelas clássicas brigas de "Davi contra Golias".
Tocado pelo fato de os agricultores terem sido indicados a ele pela sua vó - a infância, não adianta, nos deixa nostálgicos -, Robert resolve pegar para si a causa, o que significa também ir contra tudo aquilo em que acredita o escritório de advocacia em que trabalha. Sob o olhar desconfiado de seu chefe Tom (Tim Robbins em interpretação cheia de ambiguidades), o jurista empreende uma jornada que envolve a leitura de centenas de milhares de documentos relativos ao "comportamento corporativo" da DuPont, realizando também visitas àqueles que está defendendo - especialmente ao turrão Wilbur Tennant (Bill Camp) -, e também a ex-empregados e a pessoas ligadas à indústria. E será cruzando todos esses dados e informações que Robert descobrirá algo alarmante (e que não chega a ser bem uma novidade): os produtos químicos, sintéticos, despejados pela DuPont não apenas em mananciais ou aterros, mas também em nossas casas, fazem mal também para os humanos, ocasionando doenças, deformidades e uma série de outras condições que comprometem - e comprometerão - a saúde de milhares de famílias.
Nesse sentido, O Preço da Verdade é um filme relevante e corajoso, que coloca o dedo na ferida a respeito das crenças que temos na indústria como aquele ente bonzinho, que gerará empregos e que garantirá, nem que seja com documentos falsos, lobby e apoio de políticos e lideranças locais, que tudo estará bem, em ordem, e que não haverá nada de moralmente duvidoso ou corrupto sendo feito - e há um diálogo absurdamente revelador sobre como as grandes indústrias tratam a obediência às leis como apenas um pró-forma ligado a relação "custo x benefício". Como um exemplo, a gente sabe que o teflon, tão presente no nosso dia a dia, faz mal. E o pior: a indústria também sabe. Mas é mais barato para eles saber dessa informação, guardá-la e arcar com futuros e cínicos processos, enquanto despejam pesquisas falsas que buscam moldar a opinião pública sobre efeitos não tão negativos de seus produtos. E aqui cabe um elogio ao esforço feito pelo protagonista, que terá uma paciência de Jó para que as suas teorias sejam confirmadas (o que explica também os motivos de o filme ficar tão arrastado no terço final já que, sabemos bem, na esfera jurídica as coisas podem ser demoradas, aliás, bastante demoradas).
E mesmo com uma trilha sonora convencional e até eventualmente ostensiva, uma fotografia obviamente acinzentada/azulada e melancólica e uma montagem excessivamente expositiva (em uma cena a gente já entendeu que os dentes pretos de habitantes locais podem ser um indício de que eles também possam estar sendo envenenados, mas isso é explicado e mastigado até o limite para os espectadores), o filme do diretor Todd Haynes (Carol) tem valor, como já dito, pelo seu tema. E, ainda que o assunto não seja assim tão bem explorado - tudo parece meio esquemático, inclusive algumas interpretações (aliás, o que faz a Anne Hathaway como uma esposa histérica e submissa no filme?) -, é importante as pessoas tomarem conhecimento dos pormenores jurídicos que envolvem o cidadão comum lutando contra grandes corporações que exaurem sua saúde (e suas existências). Por fim, achei estranha a ausência de alguma música do Neil Young - que fez um disco inteiro para criticar outra gigante dos insumos, a Monsanto -, na trilha sonora. Mas a onipresente Take Me Home, Country Roads, do John Denver aparece. E, na real, a gente sempre gosta.
Nota: 7,0
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