terça-feira, 26 de novembro de 2019

Tesouros Cinéfilos - O Professor Substituto (L'Heure de La Sortie)

De: Sébastien Marnier. Com Laurent Lafitte, Emanuelle Bercot, Pascal Greggory e Luàna Bajrami. Suspense, França, 2018, 98 minutos.

No cinema é possível passar a mensagem das mais variadas formas: esfregando na cara, apostando em sutilezas, sendo mais ou menos "panfletário" ou óbvio. Assim como em qualquer arte, o filme também pode (e talvez até deve) ser político. Deve desconstruir aquilo que está estabelecido pelo status quo nos fazendo, minimamente, refletir. Pois eis que por trás do verniz de suspense cascudo desse O Professor Substituto (L´Heure de La Sortie) há uma fortíssima bandeira sendo levantada - e que não mencionarei para que a experiência de assisti-lo não seja comprometida. O filme começa em uma sala de aula suarenta (o calor é claudicante, palpável) onde um professor aplica uma prova. De forma inesperada e sem nenhuma explicação prévia, o mesmo professor abre discretamente a janela, sobe silenciosamente em uma cadeira e se joga janela afora. Para horror dos adolescentes, que ficam sem reação.

A vida segue com um professor de nome Pierre (Laurent Lafitte) sendo contratado para ser o substituto daquele que cometeu suicídio. Só que, aos poucos, ele percebe que há algo errado com aqueles estudantes: mais inteligentes que os demais (quase como pequenos prodígios), questionam os saberes e os métodos do substituto, conhecem seus direitos e agem de forma excêntrica, influenciando toda a escola com o seu comportamento arrogante e prepotente. Sim, é a velha história do professor que precisa lidar com uma turma difícil. Mas essa não será difícil por problemas de aprendizado relacionados a um contexto social injusto ou de pobreza. Filhos da elite, se tornarão figuras misteriosas para Pierre, que passará a persegui-los, tentando identificar qual o segredo que lhes ronda. Eles teriam algo a ver com a morte ocorrida no educandário? Por quê parecem tão passivos e agressivos ao mesmo tempo? O que eles estariam tramando?


Nesse sentido, trata-se de um filme que equilibra de forma magistral o drama e o mistério. E que utiliza a cinematografia em favor da narrativa. Parece haver o tempo todo algo que perturba, uma espécie de mal-estar que é reforçado por barulhos da natureza ou domésticos (como um choro de bebê que persiste em uma vizinhança ou a música hipnotizante de uma boate), num trabalho de edição e mixagem de som muito bem feitos. Os closes fechados, os silêncios constrangedores, o céu que persiste em oprimir, uma barata que aparece de forma inesperada, um notebook que desaparece sem deixar vestígios, uma ligação em que apenas se escuta uma mulher chorando do outro lado da linha... tudo parece contribuir para que haja um sentimento de incômodo. E quando Pierre descobre que um grupo de seis jovens de sua sala de aula se refugiam em uma espécie de pedreira abandonada, se comportando de maneira desafiadora e beligerante, essa sensação só aumenta. Pior: um baú com mais de uma dezena de DVDs feitos pelos alunos, poderá ser o indicativo de que algo muito grave possa estar para acontecer.

Não é cinema para todos os paladares, já que a construção do clima de suspense se dará muito mais por aquilo que o filme não mostra do que por aquilo que revela - esqueça os jump scares que eles praticamente não existem. Ainda que não seja tão "redondinho" na construção de seu roteiro, ele procura chamar a atenção para o mal-estar generalizado que afeta a humanidade e sobre as tantas formas que a nossa geração pode estar comprometendo o futuro dos jovens. De que adianta ser um prodígio em um mundo cheio de ódio, de preconceito, de intolerância em relação às diferenças? O que será de um futuro de escassez de recursos naturais, de aumento da miséria, de fome, de doenças e de novas tecnologias nem sempre sendo usadas com motivos louváveis? Guardando semelhanças com a ótima série Years and Years, a película do diretor Sébastien Marnier nos ensina que, no fim das contas, é importante estarmos preparados para sofrer. O mundo, afinal, nos imporá muitas e doloridas derrotas. Cabe a nós, saber lidar.

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