quinta-feira, 13 de junho de 2019

Disco da Semana - Bárbara Eugênia (TUDA)

Escutar qualquer disco da Bárbara Eugênia é como abrir um armário em que estão empilhadas roupas levemente empoeiradas, docemente amarrotadas e talvez até com algum cheiro nostálgico de "guardado". Mas são peças que você ainda deseja usar, que sabe que se der uma repaginada nelas, lavar, passar, elas ainda servirão. Terão lá seu charme. Enfim, funcionarão. Essa metáfora, meio boba até, serve para estabelecer a artista carioca como uma das que melhor dialoga com a música feita no passado, mas que nem por isso deixa de envernizar os seus trabalhos com uma personalidade própria, cheia de vigor. O que é capaz de conferir certo frescor até mesmo a covers do cancioneiro (brega?) nacional, como é o caso de Por Que Brigamos?, lançada em 1972 pela Diana, e que no álbum É O Que Temos (2013) reaparecia com uma bem-vinda energia, uma intensidade ao mesmo tempo lânguida e voluptuosa.

O expediente agora se repete com Sol de Verano, lançada em 1983 pela britânica radicada na Espanha Jeanette, e que figura entre as canções do mais recente registro da compositora, o maravilhoso TUDA. Funcionando como uma espécie de "deslocamento temporal", as canções lançadas em décadas distintas também parecem servir para reposicionar Bárbara musicalmente, que deixa para trás o flerte com a sonoridade setentista e mais amplamente romântica, para investir ainda mais no diálogo com os anos 80, bem como seus sintetizadores, batidas mais eletrônicas e um clima mais festivo. "Não sei se [era] mais doce...mais anos sessenta certamente! Acho que desde sempre foi pop, só era mais vintage mesmo. Agora dei uma modernizada. Fui lá pros anos 80, 90. As influências continuam muito as mesmas, só dei mais espaço para coisas que não chegavam no resultado final. Como, por exemplo, a musica eletrônica ou ritmos mais especificamente brasileiros, como o ijexá, samba-reggae, e outras cositas más", revelou em entrevista ao site Omelete.


Nesse sentido, interessante notar como o trabalho dialoga de forma natural com os mais variados estilos. Se as regionalistas Saudação e Eu Vim Saudar abrem e fecham o disco respectivamente, como se fossem cânticos folclóricos, Perdi e o single Bagunça, são as músicas dos anos 80 por excelência. Mas não os anos 80 óbvios, de toneladas de sintetizadores e sim aqueles que trafegam livremente sem vergonha de adicionar outros elementos, como pequenos fragmentos e colagens instrumentais capazes de retirar as mesmas músicas de uma caixinha fechada de definições. As Maçãs que Vêm é MPB indie com base eletrônica que não faria feio no álbum Tropix (2016) da Céu. Já Querência é um surpreendente reggae, ao passo que a ótima Confusão é o cancioneiro popular que também tem espaço entre os fãs da artista. E há ainda Perfeitamente Imperfeita que, com clima de axé, surge como uma das melhores canções desse ano.

Contando com uma série de participações especiais - do Bloco Pagu a Tatá Aeroplano, passando por Zeca Baleiro (que participou da composição de Bagunça) e o coletivo Onda Vaga, na linda Por La Luz Y Por Tierra - Bárbara ainda alcança com suas letras absurdamente confessionais e poéticas, a maturidade de quem já está há dez anos na estrada, tendo trabalhado com, entre outros, Edgard Scandurra, Otto, Karina Buhr, Tom Zé e Heitor Dhalia, em projetos distintos como um tributo ao cantos francês Serge Gainsbourg ou a websérie Absurda: Lado A. Eu só vou fazer / Daqui pra frente / O que me faz bem / Me faz bem, canta a artista na já citada As Maçãs Que Vêm, como se resumisse o espírito que provavelmente vai reger, daqui pra frente, as suas escolhas artísticas. Os fãs agradecem!

Nota: 8,8


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