segunda-feira, 7 de março de 2016

Cine Baú - Um Estranho no Ninho (One Flew Over the Cockoo's Nest)

É muito provável que a maioria das pessoas desconheça o fato de o diretor tcheco Milon Forman ter perdido os pais no campo de concentração nazista de Auschwitz, durante a Segunda Guerra Mundial. Não chega a ser coincidência, portanto, o fato de o trauma vivido por um Forman ainda jovem ressurgir tão seguidamente, em sua filmografia, no formato de alegorias que dão conta do homem em conflito com o sistema vigente, com a sociedade conservadora ou mesmo em embate com o que estabelece o status quo. Mozart, por exemplo, era um homem a frente de seu tempo que teve dificuldade de se enquadrar ao período em que viveu, como pode ser visto no soberbo Amadeus (1984). E o que dizer do comediante Andy Kaufman, considerado um desajustado pela maioria, e que teve sua história contada no melancólico O Mundo de Andy (1999)? Os exemplos são muitos e remetem inclusive ao início de sua carreira, como no caso do autoexplicativo Pedro, O Negro (1963).

O mesmo expediente é utilizado por Forman no clássico Um Estranho no Ninho (One Flew Over the Cockoo's Nest) - adaptado do livro de Ken Kesey. O microcosmo criado pelo diretor envolve o ambiente fechado de uma instituição para doentes mentais, onde os internos se mantêm enclausurados sob o comando da enfermeira-chefe Ratched (Louise Fletcher). A metódica rotina e as normas impostas pela instituição não se alteram até a chegada de um novo paciente, Randle McMurphy (Jack Nicholson, em um de seus melhores papeis da carreira). Randle é acusado de estupro de menor e chega ao local após simular um quadro de insanidade na prisão em que estava. Conforme os dias avançarem e o novato perceber as condições a que estão impostas os doentes que, nas aparências, vivem uma rotina normal - mas que sequer estão autorizados a assistir a uma partida de beisebol pela TV - é que Randle passará a questionar o conformismo estabelecido pela situação. E isto da maneira mais anárquica possível!




São inesquecíveis, por exemplo, as cenas em que Randle consegue escapar do sanatório levando a tiracolo um grupo de internos para fazer uma pescaria em alto-mar, ou mesmo a sequência em que é realizada uma festa de arromba em uma madrugada - com a conivência do funcionário do turno - com direito, inclusive, a perda da virgindade de um dos jovens pacientes. O personagem de Nicholson inegavelmente tem caráter duvidoso, como é possível perceber durante toda a projeção em suas pequenas artimanhas. Mas o que ele constata, em momentos de lucidez, é que os pacientes apenas precisam ser estimulados de outras maneiras, já que, em muitos casos, a dita loucura, não passa de uma espécie de desajuste social, que poderia ser corrigido de outras formas. E, nesse sentido, a cena em que o personagem Chief consegue fazer uma cesta em um prosaico jogo de basquete, quase é capaz de arrancar uma lágrima do olho do espectador mais coração mole, por representar um significativo avanço.

Analisada a partir desse contexto, é possível dizer que Forman realiza uma obra absolutamente equilibrada do ponto de vista dramático, nunca apelando para o melodrama barato, ou mesmo exagerando, em contraponto, nas cenas mais divertidas - que são muitas, é preciso que se diga! Ao mesmo tempo, não deixa de ser fascinante observar detalhadamente a interação dos coadjuvantes em tela - e há rumores de que o diretor teria se utilizado de verdadeiros doentes mentais em seu trabalho -, merecendo destaque a aparição de astros como Danny DeVito e Christopher Lloyd ainda jovens (e insanos!) e em início de carreira. Em um ano recheado de grandes filmes (e grandes atuações), como nos casos de Um Dia de Cão, Barry Lyndon e Tubarão, só pra citar alguns, esse verdadeiro clássico moderno conseguiu a proeza histórica de faturar as cinco principais categorias do Oscar - Filme, Diretor, Ator, Atriz e Roteiro Adaptado - algo que só havia ocorrido anteriormente em 1934, com Aconteceu Naquela Noite e que voltaria a acontecer, posteriormente, com o ótimo O Silêncio dos Inocentes (1991). O justo vigésimo lugar na lista de 100 Melhores do American Film Institute (AFI), publicada em 1998, também não deixa de ser uma bela credencial. Se você ainda não assistiu, faça um favor a si mesmo e assista. É um filmaço.

5 comentários:

  1. Ótimo texto! Esse não vi, vou fazer um favor a eu mesma e irei assistir hehe.. Beijão!

    ResponderExcluir
  2. Ótimo texto! Esse não vi, vou fazer um favor a eu mesma e irei assistir hehe.. Beijão!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Jojô, queridona! Obrigado pelo comentário. Tenho certeza de que você vai curtir o filme!. Beijo grande! =D

      Excluir
  3. não sem razão, tive o privilégio de escrever neste blog e colocar "um estranho no ninho" o filme da minha vida.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Citaste uma das grandes cenas, que até não mencionei, a da "narração" do jogo de beisebol. Sensacional!

      Excluir