segunda-feira, 14 de março de 2016

Pra Ouvir - Tiago Iorc

Gente demaaais
Com tempo demaaais
Falando demaaais
Alto demais
Vamos atrááás de um pooouco de paz

(Alexandria - Tiago Iorc)

Devo confessar a vocês o fato de que, até o anúncio da apresentação do cantor Tiago Iorc na Univates - o evento ocorre no próximo dia 24 de março, a partir das 20h -, pouco tinha ouvido do artista. Aqui e ali até tinha encontrado, em minhas andanças pelas FMs locais, um ou outro de seus hits - casos de Coisa Linda ou Amei Te Ver. Mas, ainda assim, parar para ouvir mesmo, as GANHA, nunca tinha feito. O fato é que sempre que lia ou ouvia falar a respeito de Iorc, de arrasto vinham observações sobre a sua obra, feita quase que totalmente em inglês. Ok, o compositor morou durante cinco anos na Inglaterra, o que talvez explicasse essa preferência. Mas o fato é que não costumo gostar muito de artistas brasileiros que cantam na língua dos nascidos na terra da Rainha. Sim, é um tipo de preconceito de minha parte, talvez. Mas não simpatizo.

O anúncio de que seu registro mais recente, lançado no ano passado e intitulado Troco Likes, era praticamente todo em português - a exceção de um bonus track -, pouco mudou a minha percepção. E, agora, enquanto escrevo esse texto, ao mesmo tempo em que cantarolo em loop quase infinito o refrão de Alexandria - canção que inaugura o trabalho -, é que percebo o quanto perdi de tempo, ao ignorar um dos mais graciosos, sinceros, diretos e, ao mesmo tempo, sofisticados álbuns do ano que passou. Sim, como se estivesse num tipo de redenção particular, estou correndo atrás e escutando MUITO - com o ingresso comprado e tudo para prestigiar o show. A animação fez com que eu me motivasse a escutar também o disco anterior, intitulado Zeski. E não é que ali descobri também um trabalho muito bem acabado do ponto de visto de produção e que de quebra já ensaia uma aproximação com as canções em português? São esses os dois discos que integram o nosso Pra Ouvir de hoje - quadro em que sempre falamos de algum artista nacional, dando um pitaco em suas principais obras.



Bom, voltando ao que falávamos: quando a gente vê uma letra como a de Mil Razões - Posso lhe dar mais mil razões pra te querer / Coisas que eu já nem sei o nome / Posso compor mais cem canções de amor / Pra quê? Se quando eu canto você some - ficamos nos perguntando: por quê foi que rolou essa demora pra cantar em português? Os versos construídos por Iorc na nossa língua são descomplicados, acessíveis e românticos na medida certa - sem soarem excessivamente piegas ou mesmo ultrapassados - e ideais para serem acompanhados pelas melodias construídas, na maioria dos casos, com uma base simples de voz e violão. Talvez isso explique a verdadeira comoção que tomou as redes sociais, quando do anúncio da apresentação do artista em nossa região - e o comportamento absolutamente afável do artista (e que seu estende aos videoclipes e a sua participação na internet) parece contribuir para esse clima otimista.

Em entrevistas, o artista explicou que, para ele, os versos inglês eram gerados de maneira muito mais natural - o que transformava o seu soft rock em um produto ideal para o consumo do público mundo afora. A ótima recepção das últimas canções de Zeski fez com que essa perspectiva fosse alterada. "Existiu essa vontade de fazer algo que as pessoas pudessem cantar, que entendessem de forma mais direta. Achei que foi super válido (encerrar o disco Zeski com músicas em português), porque me cutucou mais para trabalhar composições na nossa língua", afirmou ao site Papel Pop na época da divulgação de Troco Likes. Bom, para quem escuta o registro mais recente do artista, a impressão é de que o álbum poderia ter outro nome, igualmente alinhado ao que se lê por aí, nos facebooks da vida: manda mais que tá poco!


Zeski (2013): interessante ouvir o trabalho anterior de Tiago Iorc em relação a Troco Likes não apenas como um exercício de curiosidade, mas também para perceber o que movia o artista, seu modelo de trabalho, suas influências. O primeiro ponto que chama a atenção é a facilidade e a naturalidade com que ele canta em inglês - o que faz com que cada canção nunca soe absolutamente forçada, desconexa ou confusa. Ao contrário, composições como What Would You Say não fariam feio - com seu clima à Simply Red - em alguma rádio light mais atenta as novidades. O mesmo vale para a simpaticíssima Life Of My Love, com seu refrão pegajoso até dizer chega! A música mais suave, as baladas, o violão dedilhado em pressa e a percussão cadenciada e nunca excessiva são uma marca do trabalho que poucas vezes acelera, formando, nesse sentido, um conjunto absolutamente coeso em sua lógica de existência. Algo capaz de tornar até meio deslocadas (quem diria!) as canções em português - especialmente o cover desnecessário de Tempo Perdido da Legião Urbana. Ainda assim, se foi a música de Renato Russo também uma das responsáveis pela aproximação com os versos cantados em nossa língua, bom, nos resta saudá-la por seu importante papel.


Troco Likes (2015): em uma época em que a ordem do dia, especialmente na internet, parece ser destilar ódio - em muitos casos relacionados a ideologias difusas - um disco que fala de maneira tão sincera e desavergonhada sobre o amor, parece ser um verdadeiro alento. O coração dispara / Tropeça, quase para / Me encaixo no teu cheiro / E ali me deixo inteiro canta Iorc na onipresente Amei te Ver, que, assim como no caso de Coisa Linda - Coisa Linda / Vou pronde você estar / Não precisa nem chamar - talvez sejam as mais representativas daquilo que é o cerne de um registro que, se por um lado dialoga fortemente com a simplicidade, por outro não deixa de lado a eventual reflexão acerca do tempo em que vivemos. E, nesse sentido, poucas canções conseguem ser mais reveladoras do que a ótima Sol Que Faltava: Onde foi, onde foi / A última vez que você se deixou / Livre sem se retocar / Sem se Instagramear, pergunta o artista como um verdadeiro observador do cotidiano, no que diz respeito a inexplicável vontade humana em ver e ser visto na atualidade. E tudo isso em meio a uma produção limpa e com arranjos de cordas totalmente ensolarados e assobiáveis, funcionando como um belo complemento para cada instante desse precioso trabalho.

Pra quem não ouviu ainda, só resta de dizer que vale muito a pena!

As informações sobre a apresentação podem ser encontradas aqui, no site da Univates.

E que venha o show! =D

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