Qual caminho deve seguir uma artista de consolidada carreira na música pop, que possua mais de meia dúzia de discos formados por um rico catálogo de canções comerciais e radiofônicas - muitas delas figurando nos primeiros lugares das paradas -, e que, consequentemente, tornou os seus milhões de fãs acostumados a um certo padrão de consumo? Manter a mesma lógica, permanecendo na chamada "zona de conforto", quem sabe lançando mais e mais registros que servirão apenas para consumo imediato sendo talvez, posteriormente, relegados ao esquecimento, num processo naturalmente descartável dentro de um gênero com essa característica? Ou quem sabe talvez se reinventar, sair um pouco do lugar comum, experimentar um pouco mais, enfim, arriscar? Se você acredita que a segunda alternativa é a melhor, seja bem-vindo a um dos melhores (se não o melhor), disco da cantora Rihanna, o recém lançado e surpreendente Anti.
Ok, pra começo de conversa, também não estamos aqui falando que a artista tenha feito uma espécie de Kid A - o incensado e revolucionário álbum do Radiohead -, alterando tão drasticamente o seu modelo de trabalho. Ocorre que, para quem se acostumou a ouvir faixas carregadas de auto-tunes, sintetizadores e batidas mais naturalmente descomplicadas como nos casos dos ótimos hits Only Girl (In the World), What's My Name?, Diamonds, We Found Love, You Da One, ou mesmo a inaugural Umbrella, não deixa de surpreender o clima quebrado e pouco óbvio da abertura Complicated, ou mesmo o urgente soft pop feito com riqueza instrumental de James Joint, a oitentista Kiss It Better, a levemente caótica Woo (que chega a surpreender pela curiosa semelhança com o tUnE-yArDs) ou mesmo a jazzística Love On the Brain, que não faria feio no mais recente disco do Alabama Shakes (ou seria do Vaya Con Dios?). A compositora parece ter bebido de várias fontes desde o agora já distante e feito para as pistas Unapologetic (2012). E as aplica em seu novo trabalho de forma orgânica e fluída.
É claro que, como já mencionado, as mudanças não são da "água para o vinho". Mas são pequenas alterações que fazem com que esse oitavo registro se afaste um pouco das soluções um pouco mais fáceis encontradas por Rihanna em seus álbuns anteriores, tornando esse álbum levemente mais desafiador, o que faz com que ele cresça a cada audição. Ainda que, em cada curva de seu rico, limpo e característico vocal seja possível encontrar um pouco de cada elemento - dentro dos referenciais de hip hop, R&B e soul music - que até hoje formou a sua discografia. Não à toa que canções como a ótima Work - feita em parceria com o rapper Drake - muito provavelmente farão "carreira" nas rádios mundo afora - tanto que uma audição isolada da música talvez cause até um certo estranhamento ao ouvinte que ler essa resenha.
E aí chegamos a sensacional Same Ol' Mistakes, que, ao emular a canção New Person, Same Old Mistakes dos australianos do Tame Impala - presente no recente Currents, um dos melhores discos internacionais do ano passado -, talvez represente mais significativamente o novo momento vivido por Rihanna, algo muito provavelmente impensável na época de discos como o popíssimo Loud (2010). E o grudento refrão que inicia com a frase feel like a brand new person, parece simbólico, quase como um recado metafórico dado aos fãs e a crítica (por mais que a canção seja puramente romântica). Algo que também pode ser visto na imagem da capa, criada pelo artista gráfico Roy Nachum - e que a afasta do padrão fazendo-careta-e-sensualizando dos discos anteriores. Talvez Anti afaste um pouco o seu "ouvinte padrão". Mas quem se aventurar pelo trabalho, certamente descobrirá uma coleção de grandes canções.
Nota: 7,7
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