Talvez Entre Nós (Entre Nos), esse verdadeiro achado entre os filmes independentes do Netflix, fosse um drama como qualquer outros, não fosse por um aviso bem no início da obra: baseado em fatos reais. É importante que o espectador não esqueça desse "pequeno" detalhe enquanto acompanha a dura trajetória da personagem Mariana (Paola Mendoza). Mariana é uma imigrante ilegal nos Estados Unidos - saída da Colômbia -, tentando viver o sonho americano. No bairro do Queens, em Nova York, ela convive com o marido e com dois filhos pequenos, até o dia em que o marido anuncia, sem muita solenidade, que a está abandonando para ir morar em Miami. Mariana se vê sozinha, sem emprego, com dois filhos pra criar e sem direito algum em um País que, a bem da verdade, preferiria que pessoas como Mariana não estivessem ali.
A dor, inicialmente gera um certo estado de letargia por parte da protagonista, ainda que não demore para que ela vá a luta. A tentativa de vender calzones em meio a uma multidão de nova-iorquinos, que a ignoram (e se afastam) como se ela fosse portadora de uma grave doença contagiosa, resultam em sequências de cortar o coração. Tudo com os filhos a tiracolo, loucos de fome, se sede, de frio e de calor. A situação piora quando o senhorio a despeja por falta de pagamento do aluguel e Mariana passa a ter de viver na rua, fazendo em muito lembrar a situação vivida pelo personagem de Will Smith, no tocante A Procura da Felicidade. Mas, é preciso que se diga, há um naturalismo nos gestos, nunca forçados, que faz com que o espectador se afeiçoe daquele trio que nunca desiste.
O fato de o filme jamais se preocupar em explicar os motivos pelos quais o marido teria abandonado Mariana, são capazes de gerar uma sensação ainda maior de isolamento. O único amigo latino das redondezas, Alejo (Eddie Martinez), assim como a protagonista, também não consegue sucesso nos contatos telefônicos com o agora ex. Mariana perambula pela cidade atrás de trabalho, até encontrar na venda de latinhas de refrigerante uma alternativa para levantar qualquer grana. O seu esforço, bem como as pequenas compensações geradas por ele - poder comprar um salgadinho para matar a vontade dos filhos, ou mesmo levá-los ao cinema -, fazem com que o sorriso volte ao rosto da jovem mãe. Situação que faz lembrar outra película sul-americana - já muito citada por aqui -, o imperdível O Banheiro do Papa.
Ainda que seja dolorosa praticamente do início ao fim, a obra mantém um certo otimismo, seja nos gestos afetivos da mãe para com os filhos, muitas vezes retribuídos, seja no encontro com companheiros de colheita de latas ou outros amigos que lhe servem de "fornecedores". Fazendo amizades aqui e ali, acreditando firmemente que a sua situação possa mudar pelo esforço, pelo trabalho, pela simplicidade e humildade, pela luta diária, Mariana construirá uma daquelas trajetórias que nem os maiores filmes de Hollywood são capazes de apresentar em suas pomposas obras de ficção, recheadas de efeitos especiais. Os letreiros finais, tão realistas quanto os do começo do filme, farão arrepiar até o mais sisudo dos cinéfilos. Que terminará invariavelmente a sessão com um sorriso no rosto. Salve o cinema independente.
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