segunda-feira, 17 de agosto de 2015

Cine Baú - O Que Terá Acontecido a Baby Jane?

De: Robert Aldrich. Com Bette Davis, Joan Crawford, Victor Buono e Maidie Norman. Comédia dramática / Clássico, EUA, 1962, 134 minutos.

Houve uma época em que Hollywood era pródiga em utilizar o cinema para falar de si mesma. Entre os anos 50 e 60, obras hoje clássicas como Crepúsculo dos Deuses, A Malvada, Assim Estava Escrito, Contrastes Humanos e Cantando na Chuva - pra citar apenas algumas - utilizaram a metalinguagem como base para esforços de roteiro que conseguiam se apresentar ao mesmo tempo trágicos e cômicos, dramáticos e divertidos. O caso do sensacional O Que Terá Acontecido a Baby Jane? (What Ever Happened to Baby Jane?), ponto alto da filmografia do versátil diretor Robert Aldrich - dos igualmente bons Com a Maldade na Alma e Os Doze Condenados - é mais um exemplo, talvez ainda mais cruel, da máquina recicladora de astros que envolve também a capital mundial do cinema, capaz de relegar a um segundo plano artistas que antes já simbolizaram fama (e rentabilidade, claro!).

A Baby Jane do título é uma atriz-mirim que fez fama e fortuna em apresentações na TV e no cinema quando era apenas uma garotinha de oito anos mimada e de personalidade indócil. Na vida adulta, Jane (Bette Davis, em interpretação arrebatadora que lhe rendeu a décima indicação ao Oscar) se tornou uma atriz decadente, mais conhecida por seus escândalos e bebedeiras do que por algum papel de destaque. Em contrapartida, a irmã Blanche (Joan Crawford, sempre soberba), que quando criança apenas acompanhava as andanças de Jane pelo universo na qual ela trafegava, na vida adulta é uma estrela de Hollywood, requisitada para grandes papeis, sendo disputada pelos principais estúdios. Isso até o dia em que ela sofre um acidente, no auge da fama, aparentemente causado pela ira ciumenta de Jane, incapaz de conviver com o fracasso tanto no profissional quanto no pessoal


As duas agora moram juntas em uma mansão decrépita, com Jane "cuidando" de Blanche, que passa seus dias enclausurada em uma cadeira de rodas, no segundo andar, tentando encontrar algum significado em sua vida solitária e distante dos holofotes. Amargurada, Jane deixará vir a tona toda a mágoa que sente pela irmã mais famosa, tornando sua vida um inferno por meio de suas ações. Atos simples como telefonar para um médico amigo, ter contato com a simpática vizinha ou mesmo comer, serão impedidos por Jane, cuja insanidade aumentará a cada dia. Especialmente após o anúncio de que a casa será vendida por Blanche nas semanas seguintes. A situação piora quando a empregada (Maidie Norman) passa a desconfiar do isolamento de Blanche, fruto da perversão quase sádica da irmã que, nem as cartas de fãs faz chegar até ela.

Baseado no livro de Henry Farrel, o filme de Aldrich é um verdadeiro veículo catalisador do talento de ambas as atrizes, que passam boa parte das pouco mais de duas horas de película se digladiando na tela. O clima é de terror na mansão, ampliado pelo aspecto sinistro dos corredores escuros, pela trilha tonitruante (de Frank De Vol), pela fotografia envelhecida e pela imprevisibilidade de cada ato louco de Jane. Nem a aparição de um produtor (o bonachão Victor Buono), disposto a conduzir Jane de volta a fama perdida, será capaz de acalmar os ânimos, já que o resultado será apenas constrangedor - com Jane usando seu antigo figurino e cantando seu único sucesso (I'm Written a Letter to Daddy). Com excelentes histórias de bastidores - reza a lenda que ambas as atrizes eram desafetas na vida real - e um roteiro que reserva algumas surpresas, a obra recebeu apenas um Oscar (Figurino), já que a disputa com um certo Lawrence da Arábia era complicada. Mas se mantém até hoje como um dos mais representativos filmes sobre a decadência e o caráter efêmero da fama, não podendo, nesse sentido, ser mais atual. Um filmaço!


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