segunda-feira, 26 de outubro de 2020

Novidades no Now/VOD - Borat: Fita de Cinema Seguinte (Borat Subsequent MovieFilm)

De: Jason Woliner. Com Sacha Baron Cohen e Maria Bakalova. Comédia, EUA, 2020, 95 minutos.

Ascensão da extrema direita, Trump, negacionismo científico, intolerância, xenofobia, fake news, militarismo... vamos combinar que não poderia haver momento mais adequado para o surgimento de uma sequência com o "segundo melhor repórter do Cazaquistão" do que os tempos de hoje. Sim, desde 2006 o mundo mudou bastante e uma revisão do primeiro filme estrelado por Sacha Baron Cohen quase o torna uma comédia apenas mediana sobre o comportamento absurdo do americano médio da "família de bem". Só que esse mesmo americano médio, em 2020, está completamente fora do armário, com toda a sua intolerância, ódio pelo diferente e crença de que os valores mais conservadores vem sendo deturpados nos últimos anos - inclusive por figuras progressistas como Barack Obama. Então, arremessar novamente o Borat nesse contexto é lançar um convite sem limites para a denúncia de todos os tipos de abusos. Que aparecem, novamente, sob o véu de um suposto falso documentário, que mescla sequências reais com outras magistralmente encenadas.

Assim, Borat: Fita de Cinema Seguinte (Borat Subsequent Moviefilm) parte exatamente de onde parou, com o melhor argumento da história. Após a obra de 2006, Borat retorna para seu País Natal sendo enviado como escravo para uma espécie de Gulag - é a sua sentença por ter provocado tanta humilhação ao povo do Cazaquistão. E ele só é retirado do campo de trabalho forçado por um motivo nobre: insatisfeito por não fazer parte dos panteão dos mais proeminentes governos extremistas do planeta - entre os quais, figura com louvor o nosso glorioso "mito" -, o presidente envia Borat com a missão de levar um presente para Donald Trump (ou McDonald Trump), com o objetivo diplomático de ser incluso no seleto grupo dos extremistas. O presente? Um macaco. Que morre no caminho. Porque é COMIDO pela única filha de Borat, que vai escondida na viagem à Terra do Tio Sam sob o pretexto (ou sonho) de se tornar uma nova Melania. Sem o macaco, o repórter resolve "presentear" sua filha ao vice-presidente norte-americano Mike Pence. Sim, isso mesmo: dar a sua filha.

Pois esse arco dramático esdrúxulo é a desculpa perfeita para um sem fim de comentários políticos, sociais, religiosos e culturais que envolvem ambos os países em questão, mas que colocam um dedo enorme na ferida da desastrosa política geral da extrema direita. Em uma das tantas sequências engraçadas, Borat não sabe como entrar em um evento em que Pence se manifestará - a ideia é se aproximar do sujeito com seu "presente". A solução? Entrar no local com vestes semelhantes aos da Ku Klux Klan. Em outro instante, o protagonista fala com dois republicanos sobre a forma de Obama, Clinton e os democratas em geral conduzirem a política. "É uma pena que não possamos fazer com eles o que desejaríamos, porque aqui eles têm direitos", comenta um dos homens, com uma tranquilidade ao mesmo tempo dilacerante e constrangedora. Há ainda uma sequência implacável sobre aborto, em que Borat evidencia que, para os republicanos conservadores, pouco importa como um bebê foi concebido: é a vontade de Deus que está em jogo.

Em geral a obra é uma coleção de momentos que evidenciam a hipocrisia de boa parte da sociedade americana, não fazendo nenhuma concessão na hora de chocar - e quem vota em figuras como Trump e Bolsonaro naturalmente se sentirá incomodado. Há ainda um outro momento de alívio, especialmente pela presença magnética da atriz búlgara Maria Bakalova, que interpreta Tutar, a filha de Borat, que também tem ótimos momentos de improviso. Sendo uma divertida - e porque não, tristemente melancólica - peça dentro do xadrez político que envolve as eleições americanas, que ocorrem no próximo dia 03 de novembro, a película faz muita questão de mostrar de que lado está (e a cena envolvendo o ex-prefeito de Nova York e atual advogado de Trump, Rudolph Giuliani, filmado sem saber, é apenas uma das provas disso). Contando ainda com a maior reviravolta da história do cinema em 2020, Borat: Fita de Cinema Seguinte é a prova de que enquanto houver absurdo, a quantidade de matéria-prima para um filme como esse pode ser praticamente infinita.

Nota: 8,5

Um comentário:

  1. Ponto alto do filme, pra mim, foi a questão o Holocausto e como as narrativas lunáticas dos conservadores arquitetam a desinformação e alimentam o negacionismo. Baita!

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