De: Felipe Holguin. Com Elizabeth Martínez, Antonio Jiménez e Pabla Florez. Comédia / Drama, Colômbia, 2024, 82 minutos.
Mais um daqueles filmes que partem de um fiapinho de história, que serve de desculpa para uma análise mais ampla de uma série de questões sociais, culturais, políticas e outras. Assim é o singelo A Suprema (La Suprema), o enviado da Colômbia para a edição do Oscar desse ano, e que está disponível para aluguel na plataforma da Amazon Prime. Na trama, a adolescente Laureana (Elizabeth Martínez) é impactada por uma notícia lida em um jornal, nos arredores do modesto vilarejo que dá nome à obra: no texto, a informação de que o lutador de boxe Anastásio Paez disputará o título mundial da sua categoria dali a três dias. Anastásio não apenas é nativo da remota La Suprema - uma daquelas aldeias isoladas do mundo, que sequer aparecem no mapa -, como é o tio de Laureana. O que será o gatilho para um singelo objetivo: assistir a luta de qualquer maneira.
Ocorre que esse povoado parece tão distante de tudo que sequer a energia elétrica chegou por ali. E, como consequência disso, nenhum dos habitantes do pacato local possui uma televisão. Empenhada em seu intento, Laureana conseguirá ajuda de dois amigos - ambos apaixonados por ela -, que não medirão esforços para colocar um gerador velho em operação, ou cruzar a mata fechada com quilômetros de fiação que poderão servir de extensão para a conectar um aparelho de TV que sequer existe. Mobilizada, a comunidade acompanhará a movimentação em meio à desconfiança de alguns - como no caso do hilário quarteto de idosos que passa o dia entre jogos de dominós e deboches em série -, e o apoio de outros, como no caso do taciturno Efraín (Antonio Jiménez) que sai da relutância inicial - ele parece guardar algum segredo ou mágoa do passado envolvendo Anastásio -, e o suporte comovente na segunda parte.
Mas esse não é apenas um filme sobre um vilarejo disposto a ultrapassar qualquer limite para assistir a uma simples luta de boxe - por mais que o aspecto inusitado da coisa toda já seja, por si só, um atrativo. Laureana parece ter uma relação complexa com a sua avó - que insiste que ela deveria usar mais vestidos e outros adereços, que a forçassem a parecer uma "mocinha". Na história nunca fica necessariamente clara a orientação sexual da jovem - e, em geral, talvez isso pouco importasse -, mas em um vilarejo fechado, onde o comportamento geral tende a ser mais conservador, esse não deixa de ser um aceno para um tipo de debate que poderia passar ao largo. O fato de que a adolescente é também uma apaixonada por boxe, que sonha em ser treinada por Efraín - que, na juventude, era o treinador de Anastásio -, reforça um pouco dessa tese. Ok, o boxe hoje em dia é praticado por gênero. O que não impede a avó de Laureana de lhe lembrar que aquele "não é um esporte para mulheres".
Carismático até dizer chega, esse é um daqueles projetos que faz com que torçamos para que as coisas saiam a contento. Que faz com que, de fato, nos importemos com aquelas figuras tão vulneráveis quanto embrutecidas. Quando num ato de desespero, Efraín e Laureana vão até a grande cidade de Cártago para tentar comprar uma TV, faltando apenas algumas horas para a luta, é difícil não ter compaixão e sentir a dor daquela dupla empobrecida, que empreende uma via crúcis que resulta em uma série de frustrações. A expectativa geral da comunidade parece ser a melhor: o presidente pode ir até o local, a visibilidade pode aumentar. Quem sabe um sistema que traga a eletricidade, a luz? Mais infraestrutura nessa cidadela de chão batido? Turismo? Uma vida mais digna? O entusiasmo faz lembrar o de outro projeto de rara beleza, rodado na América do Sul, no caso o uruguaio O Banheiro do Papa (2007), que nos faz rir e chorar em igual medida. Mas o legado é outro. Que fica evidente no canto uníssono das lavadeiras ao final.
Nota: 8,0
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