segunda-feira, 20 de janeiro de 2025

Novidades em Streaming - Kneecap: Música e Liberdade (Kneecap)

De: Rich Peppiatt. Com Liam Óg Mo Chara Ó Hannaidh, Naoise Móglaí Bap Ó Cairealláin, JJ Ó Dochartaigh e Michael Fassbender. Drama / Comédia, Irlanda, 2024, 90 minutos.

Não fosse a vida real e talvez um trio de rap de Belfast, cantando músicas provocativas e iconoclastas na língua irlandesa, conquistando o público com seu flow envolvente, talvez só fosse possível na ficção. Mas o caso é que a banda Kneecap não apenas existe de verdade, como lançou seu primeiro (e elogiado) álbum em 2024 - se chama Fine Art. E como a história é, de fato, muito boa, o trio formado por Liam Óg Mo Chara Ó Hannaidh, Naoise Móglaí Bap Ó Cairealláin e DJ Próvai, ainda foi tema do filme de mesmo nome - uma narrativa ficcional sobre como eles se conheceram (de uma forma quase aleatória) para, mais tarde, atrair multidões para suas energéticas apresentações. Movidos pelo nacionalismo - reforçado pela manutenção de seu idioma -, os músicos desenvolveriam uma predileção por temas sociais, políticos e religiosos, convertendo sua arte em veículo de combate ao domínio britânico e de exaltação a uma identidade irlandesa.

Sim, talvez não seja muito simples compreender os bastidores dessas disputas centenárias que envolvem os países do Reino Unido - o que só é possível com um bom material de apoio. Ainda assim devo dizer que essas disputas entre católicos e protestantes, entre nacionalistas irlandeses e unionistas quase fica em segundo plano, perante o poder da música e do impacto cultural como um todo. Claro que no cerne do debate está o soft power que só a arte possibilita - o que torna a experiência ainda mais irresistível. "Em todo o mundo uma língua indígena morre a cada 40 dias", recorda um letreiro, antes dos créditos finais. A luta de Mo Chara, Móglai Bap e DJ Próvai é contra esse apagamento. Afinal seria muito cômodo fazer parte da cultura hip hop tendo como base a língua do colonizador. Muito mais fácil de furar a bolha, vamos combinar, e basta pensar nos nossos artistas e de como eles alcançam outros públicos ao adotar o inglês.

 

 

Certo ou não, o fato é que a divertida e corrosiva obra do diretor Rich Peppiatt - que é o enviado da Irlanda ao Oscar, na categoria Filme em Língua Estrangeira -, nos faz pensar sobre todas essas questões. Com muito senso de humor e sem muito espaço para o mero autoelogio. Sim, a banda pode até ter talento e ter demorado para emplacar, dados os preconceitos, mas Mo Chara e Móglai Bap, que são irmãos, são retratados como dois jovens rebeldes, cooptados pelo tráfico de drogas. Aliás, é justamente a prisão de Mo Chara, em uma noite de batida policial em uma boate de Belfast, que faz com que ele conheça o futuro DJ Próvai - até aquele momento, apenas um professor de música e de linguística, de nome JJ Dochartaigh. Mo Chara se recusa a falar em inglês, durante o interrogatório, sendo JJ acionado, em plena madrugada, para ser seu intérprete.

O furto improvisado do bloquinho de anotações do jovem será a deixa para que JJ descubra o potencial das letras rabiscadas na caderneta. Impressionado, ele coloca uma base sonora em cima. E, bom, o resto é história. Da criação do nome do grupo, passando pelos amores improvisados (como no caso de Georgia) e os preconceitos vividos pelo trio, especialmente pelo professor, que prefere preservar sua identidade com medo de retaliações, tudo é descortinado com uma dinâmica descolada, fluída, com a edição recheada de efeitos cômicos e interessantes e um sem fim de instantes tão poéticos quanto violentos (como no momento em que a dupla central confronta os rivais do coletivo Republicanos Radicais Contra as Drogas). Importante ainda mencionar a presença do pai de Chara e Bap, um ex-paramilitar republicano, que finge a sua morte para fugir do exército britânico e que ressurge, aqui e ali, como um espectro a influenciar as decisões de todos ali. Tem impacto. E vale dar atenção.

Nota: 8,0


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