quinta-feira, 25 de maio de 2023

Picanha.doc - Still: A História de Michael J. Fox (Still: A Michael J. Fox Movie)

De: Davis Guggenheim. Com Michael J. Fox e Tracy Pollan. Documentário, EUA, 2023, 95 minutos.

Existe uma cena em Still: A História de Michael J. Fox (Still: A Michael J. Fox Movie) que dá uma dimensão da forma como o astro da trilogia De Volta Para o Futuro encara, atualmente, o fato de conviver com a Doença de Parkinson. Nela, é resgatada - de forma muito breve - a participação do ator na série Curb Your Enthusiasm, em 2011. É um instante pequeno em que Fox interpreta a si próprio, entregando uma lata de refrigerante a Larry David (na trama do episódio eles são vizinhos). Quando este tenta abri-la ela simplesmente explode na sua cara - e a sua reação indignada é absolutamente hilária. Talvez nem fosse necessária uma explicação sobre como os movimentos espasmódicos incontroláveis, que são típicos de quem sofre da doença, devem ter agitado a lata. Mas de forma debochada, Fox olha pra David com aquele olhar tipicamente foxiano e diz, de forma enternecida: "Parkinson".

É claro que até ser capaz de brincar com sua própria condição, o astro que foi um dos mais incensados dos anos 80, viveu um período de profunda dor e, naturalmente, até de negação a respeito do Parkinson. Quando o diagnóstico lhe foi dado, ele simplesmente não conseguia aceitar. "Eu? Com essa doença de velho?" A ponto de seguir como o protagonista da série dos anos 90 Spin City, sem que seus colegas de trabalho soubessem de sua doença. E toda essa trajetória de ascensão como estrela mirim até a impossibilidade de exercer a profissão que ama, formam a matéria-prima desse excelente documentário dirigido por Davis Guggenheim (de Uma Verdade Inconveniente, 2006). Não dá pra negar que é um filme duro e que nunca minimiza os efeitos devastadores do Parkinson. Mas é, ao mesmo, tempo uma experiência cheia de ternura, de afeto, de bom humor e até de esperança - especialmente no que diz respeito à relação do ator com seus familiares. 



E, para quem cresceu nos anos 80 e 90, e tem De Volta Para o Futuro como uma das trilogias da vida, o documentário também serve como uma justa homenagem a um dos mais cativantes atores daquele período. Dono de um carisma insuperável, Fox demoraria pra "acontecer" no seu meio - o fato de ser baixinho para os padrões sempre se apresentou como uma barreira. E todos os detalhes desses tropeços iniciais, de incertezas e de idas e vindas que culminam em Caras e Caretas, sitcom dos anos 80, são costurados com uma edição ágil, extremamente criativa e dinâmica, e que utiliza cenas das próprias produções antigas gravadas por Fox, para que se estabeleça uma lógica narrativa. Um bom exemplo desse expediente pode ser observado nos flashbacks que contam como o ator conciliou as agendas para gravar o filme de Robert Zemeckis e a série que ele estrelava ao mesmo tempo (usando instantes dos projetos em questão em que ele dorme em cena ou mesmo brinca com o fato de ter que se virar em dois trabalhos).

Para os fãs de Fox é simplesmente impossível ficar alheio e compreender o aparato que o envolve é, de alguma maneira, também dar visibilidade para uma doença complexa e que, muitas vezes, é mal compreendida pelas pessoas em geral. As dificuldades para caminhar, as dores, os sintomas neurológicos que só aumentam (e os estratagemas para escondê-los), a fala embolada, nada impede o fato de percebermos que, por baixo do olhar melancólico, há o mesmo Michael J. Fox de sempre. Bem humorado, sempre com uma tirada pronta pra tirar as pessoas do prumo - nem que seja ao brincar consigo mesmo. Para muitos, esse tom mais espirituoso talvez possa soar apenas estranho ou excêntrico (como assim ele não é o coitadinho que está doente?). Mas já há estudos que mostram que lidar de forma positiva, talvez possa ser o caminho para uma maior aceitação. Isso sem contar o fato que Fox leva completamente a sério o Parkinson, investindo milhões de dólares em um fundo para pesquisas sobre a doença. "Em vinte anos? Ou estarei morto ou curado", brinca em certa altura, respondendo ao documentarista. Michael J. Fox é aquele tipo de presença magnética, inquieta, borbulhante, que sempre estará viva, ao cabo. Que venha a indicação ao Oscar na categoria Documentário.


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