1) Vamos combinar que, em linhas gerais, foi um Oscar sem muitas surpresas. Por mais que houvesse algumas dúvidas na hora de decidir quem venceria nessa ou naquela categoria, na maioria dos casos deu a lógica. Ou muito perto disso. Por exemplo, em Atriz talvez muita gente acreditasse - eu, entre eles -, que Cate Blanchett poderia faturar sua terceira estatueta da história por Tár. Mas a real é que Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo cresceu muito na reta final. O que se refletiu em muitas das principais premiações - como Ator Coadjuvante (Ke Huy Quan), Atriz Coadjuvante (Jamie Lee Curtis), além de Roteiro Original e Filme (pros Daniels) e, claro, Michelle Yeoh (como Atriz).
2) Aliás, o Dalenogare falou no canal dele que uma das grandes quebras de paradigmas da vitória de Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo envolve a modalidade de campanha - algo que tem a ver com a janela de lançamento. Nos Estados Unidos, o filme dos Daniels estreou no final de março do ano passado. E foi crescendo durante a temporada, com o boca a boca, aumento do número de salas de exibição e uma trajetória que iniciou modesta e que foi se fortalecendo. E tudo com investimentos baixos. Algo parecido já havia ocorrido com Parasita. O que liga um sinal de alerta para as produtoras e meio que embaralha a lógica que estabelecia como fundamental, para efeitos de Oscar, lançar um filme próximo da temporada de premiações - em dezembro ou janeiro. Será mesmo? Nesse sentido, será que não vale a pena a visibilidade de um ano inteiro?
3) Nesse sentido, ponto pra A24 também. A produtora foi a recordista de indicações nesse ano, com 18, sendo 11 somente pra Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo (que, aliás, abocanhou sete estatuetas). A Baleia abocanhou outros dois troféus, para Brendan Fraser (Ator) e para Maquiagem e Penteados. A A24 tem pouco mais de dez anos de existência. E é objeto de um verdadeiro culto por parte dos fãs de cinema, sendo quase sempre sinônimo de qualidade. Se tiver A24 no projeto pode ir na fé.
4) Sobre o Brendan Fraser eu posso até ter torcido o nariz pra A Baleia - e até mesmo achado meio exagerada a atuação dele no filme. Mas não dá pra negar que esta é uma bela história de volta por cima. De astro de filmes de aventura à vítima de abusos sexuais tendo como resultado uma carreira praticamente sepultada, não dá pra negar que ver a sua vitória foi um dos mais comoventes instantes da premiação. Aliás, havia muitos estreantes entre os indicados nas categorias de interpretação e ver a alegria genuína destes na hora de receber o prêmio foi simplesmente sensacional. Ke Huy Quan, por exemplo, citou a mãe, recordando o fato de ter estado em um campo de refugiados no passado. E como cereja do bolo da vitória do ator vietnamita: o prêmio ser entregue por Harrison Ford, com quem ele contracenou em Indiana Jones, quando era um menino de apenas 12 anos.
5) Com a premiação polarizada entre Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo e Nada de Novo no Front foram inúmeras as produções que saíram de mãos abanando. Aliás, filmes que chegaram com força à reta final da temporada, casos de Os Banshees de Inisherin, Os Fabelmans e até mesmo Elvis, que contou com uma campanha massiva da Warner. Todos zerados!
6) Ainda que o Oscar estivesse menos representativo no que diz respeito à pessoas negras ou a mulheres - nenhuma diretora foi lembrada -, há que se considerar a vitória de Entre Mulheres na categoria Roteiro Adaptado, como um excelente prêmio de consolação. Especialmente para uma obra que tinha um baixo número de nominações.
7) Sobre representatividade, há que se destacar o fato de Michelle Yeoh, de Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo, ter sido a primeira asiática da história a vencer um Oscar. Outra conquista valiosa foi a da figurinista Ruth Carter, que alcançou o bicampeonato com o trabalho na continuação de Pantera Negra, se tornando assim a primeira negra a alcançar o feito em quase cem anos de entregas do carecão dourado. E, por fim Naatu Naatu realmente superou Lady Gaga e Rihanna na busca por melhor canção. Um pontinho "lateralizado" na busca por diversidade.
8) Pra quem participou dos bolões houve uma série de barbadas, como nos casos das categorias Animação (Pinóquio de Guillermo Del Toro), Filme em Língua Estrangeira (Nada de Novo no Front), Documentário em Curta-Metragem (Como Cuidar de Um Bebê Elefante), Efeitos Visuais (Avatar) e Som (Top Gun: Maverick). Tanto que no Bolão improvisado que participei com o amigo Henrique, a derrota foi por apenas um pontinho. Em favor dele.
9) Tô até agora em dúvida sobre se o In Memorian cometeu uma gafe em deixar vários nomes conhecidos de fora ou se isso faz parte de um tipo de critério de seleção da Academia, na hora de exibir os nomes no telão. Por que, vamos combinar, por mais que Triângulo da Tristeza não tenha ganhado nemhuma estatueta, foi no mínimo esquisito ver a jovem Charlbi Dean, que morreu de forma trágica aos 32 anos e que é uma das protagonistas do filme de Ruben Östlund, ausente da homenagem póstuma. Sim, Lenny Kravitz tocando foi bacana e tal, mas achei essa ausência, especificamente, extremamente deselegante.
10) E só pra não deixar passar batido, em linhas gerais foi uma cerimônia ótima, dinâmica, bem conduzida. Gosto do estilo de Jimmy Kimmel nas piadas - aquela coisa de dar a cutucada mas não ser exagerado. Entre as melhores piadas, adorei ele brincando sobre o fato de James Cameron ter sido ignorado na categoria ator: "O que eles acham que ele é, uma mulher?" Ou sobre as chances de briga estarem consideravelmente maiores, já que eram cinco os irlandeses indicados: "Temos muita diversidade, já que temos astros de todos os cantos de Dublin", completou. Por mim, pode continuar na apresentação numa boa.
E que venha a próxima temporada!
Nenhum comentário:
Postar um comentário