segunda-feira, 25 de abril de 2022

Novidades em Streaming - A Jornada (Proxima)

De: Alice Winocour. Com Eva Green, Matt Dilon, Zélie Boulant e Sandra Hüller. Ficção científica / Drama, Alemanha / França, 2020, 108 minutos.

"Estamos nos preparando para ir. Mas isso não é o mais difícil. O mais difícil é a volta, quando percebemos que vida continua sem a nossa presença." Quem acompanha o Picanha de perto já sabe que a ficção científica com uma pegada mais existencialista costuma nos tocar. E ainda que em A Jornada (Proxima) - disponível na Amazon Prime - a abordagem não seja assim tão filosófica, aqui temos um filme que funciona como uma boa desculpa não apenas para discutir de forma simbólica o rompimento do cordão umbilical entre mães e filhos, mas também como o mercado de trabalho pode ser muito mais difícil para as mulheres. Independente da profissão. E especialmente para aquelas que desejam ser astronautas. E é esse o caso de Sarah, a protagonista vivida por Eva Green, que é selecionada para se juntar a uma missão espacial em Marte. O que a deixará por um período de um ano longe da filha de apenas oito anos Stella (Zélie Boulant).

Sim, porque quando a gente assiste um filme tradicional de astronauta - com homens -, o ambiente doméstico ou a existência de filhos dificilmente se convertem em uma dificuldade. Imbuídos em suas missões, esses sujeitos não tem medo de olhar pra trás, para encarar o futuro. O que importa é a heroica jornada. E o temor real será pelo desconhecido. Pelo que vem pela frente. É diferente do caso de Sarah - e a meu ver está aí a beleza do que a obra de Alice Winocour propõe: enquanto a astronauta está em treinamento na Agência Espacial Europeia de Colônia, as dificuldades vividas pela filha, à distância, lhe atormentam. Como ela conseguirá se focar no rígido treinamento para sobreviver em Marte se a pequena está indo mal na escola? Se ela está com saudade? Se está magoada com a própria mãe, já que talvez considere a escolha pela profissão como uma espécie de abandono?

E não bastasse todas essas dores intermitentes que carrega - físicas e psicológicas -, Sarah ainda precisa conviver com o machismo do meio, simbolizado pelo astronauta americano Mike Shannon (Matt Dillon) que, ao apresentar a tripulante da missão, a elogia afirmando que será bom ter uma mulher no grupo, já que "dizem que as francesas sabem cozinhar bem". É claro que cada personagem possui muito mais camadas num tipo de rara complexidade, mas assistir as reações sutis e cheias de nuances de Green, enquanto evolui dentro do programa, é um pequeno deleite. As suas dores estão todas lá, em cada olhar melancólico, em cada choro solitário. E como externá-las? Com quem? A presença de uma pedagoga (a sempre ótima Sandra Hüller) pode ajudar. Ou piorar tudo, dependendo do ponto de vista, já que quanto mais a criança se aproxima da profissional e se acostuma com a ausência da mãe, mais distante ela fica.

Excelente em utilizar o próprio contexto da narrativa para discutir seus temas, o filme ainda aposta em metáforas meio óbvias, mas que ajudam a consolidar a proposta da obra. Um bom exemplo disso é a existência de uma ferida na perna de Sarah, ocorrida após um acidente em seu treinamento. Uma ferida que custa a cicatrizar - assim como custará a sarar a dor de sua escolha. Mas uma escolha que é vital para o futuro. Especialmente para o futuro de outras astronautas. Outras mulheres, que também queiram dar prioridade para outros aspectos de sua vida, que não apenas a maternidade. Além disso, é uma obra que explora bem o quão exaustivos são esses treinamentos. Algo que, muitas vezes, passa meio despercebido em algumas produções - e que, aqui, ajuda a reforçar a ideia de que as mulheres são tão capazes quanto os homens, na hora de superar desafios. Enfim, A Jornada é uma experiência com pouquíssima nave espacial ou "closes" de planetas imensos. E muita divagação sobre questões terrenas. E é justamente aí que ele acerta.

Nota: 8,0

 

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