Sim, a gente sabe que, no conjunto da obra, Em Busca do Cálice Sagrado (1975) segue imbatível como o melhor filme dos britânicos do Monty Phyton. Mas A Vida de Brian (Life Of Brian) possui pelo menos uma sequência que permanece como uma das mais divertidas (e acidamente críticas) concebidas pelo coletivo: aquela em que, quase no terço final, Brian (Graham Chapman) precisa lidar com um grupo de fanáticos religiosos que acredita, com todas as suas forças, que ele é o Messias encarnado. E essa cena é especialmente engraçada (e trágica) porque ela faz um duro questionamento não a religião em si, mas ao absurdo do extremismo cego, representado por um grupo de pessoas que, se comportando quase como zumbis, passa a adorar aquele sujeito sem nem compreender muito bem o por quê. Isto é comprovado, por exemplo, quando Brian deixa pelo caminho objetos pessoais como uma moringa, ou a sua sandália, e que passam a ser imediatamente tratados como artefatos de grande valor simbólico, quase divinos.
Mas o melhor é como as coisas se encaminham dentro da história para chegar nesse ponto: Brian na verdade estava fugindo de integrantes do exército romano, após se aliar a um grupo de revolucionários que questiona os métodos do Estado. Só que, em meio a fuga, o sujeito se vê numa espécie de parada em que diversos profetas se empenham em doutrinar a população. Fingindo estar ali no meio com este mesmo propósito, ele consegue driblar os militares ao mesmo tempo em que diz alguma frase boba de autoajuda que ganha a atenção de meia dúzia de gatos pingados. Não demora para que suas palavras ecoem na multidão, que passa a lhe perseguir até o deserto, onde ocorrerão os "milagres" que, na realidade, não passam de interpretações livres da realidade. É o caso por exemplo, do instante em que Brian indica a existência de uma árvore frutífera que poderá servir de alimento para o bando faminto. Todos, claro, ficam assombrados com a habilidade do Messias.
Mas o melhor vem a seguir: salvo por Judith (Sue Jones-Davis), Brian vai pra casa, transa com ela e amanhece o dia abrindo a janela pelado mesmo, para receber os raios de sol. E qual não é a sua surpresa ao se deparar com o grupo de fanáticos que se multiplicou ainda mais, desejando com todas as forças ouvir os ensinamentos de Brian? A sequência é absurdamente hilária porque cada frase dita pelo Messias "improvisado" é respondida em uníssono pela população, num improvável e cômico jogral. Tudo melhora quando surge a mãe de Brian (Terry Jones), uma judia ortodoxa que está claramente insatisfeita com a descoberta da sexualidade do filho, ao passo que tem de lidar, da janela, com a turba de seguidores do filho. E a despeito do caráter divertido desse instante (o melhor da película), ele ainda carrega uma importante lição de moral: a de que as pessoas não devem seguir de forma inquestionável algum ídolo ou ideia, devendo preservar a liberdade e a individualidade de pensamento. "You are all individuals", afinal.
Óbvio que, quando foi lançado, A Vida de Brian incomodou os religiosos que, claro, viram no filme uma dura crítica ao pensamento dogmático - por mais que haja até mesmo certo respeito à religiosidade como um todo (basta ver o que acontece na primeira cena do filme, quando Jesus Cristo aparece "de verdade"). A crítica, afinal, como já dissemos, parece muito mais endereçada às igrejas e a forma como tomam para si a religião, alienando a população e subvertendo a sua lógica de pensamento. Sobre a película, é claro que este é apenas um dos tantos momentos divertidos, merecendo destaque ainda a cena final, em que os bandidos crucificados cantam a singela Always Look On The Bright Side, subvertendo qualquer lógica narrativa já que, uma música feliz, em meio a um cenário desolador, não faz nenhum sentido. Mas a ideia não é fazer sentido. E era isso que tornava os Phytons tão imprevisivelmente engraçados o que fez com que, não por acaso, eles influenciassem toda uma geração de humoristas dos anos 80 e 90. Aliás, seguem influenciando até hoje.
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