segunda-feira, 13 de abril de 2020

Cinema - O Homem Invisível (The Invisible Man)

De: Leigh Whanell. Com Elisabeth Moss, Aldis Hodge, Oluver Jackson-Cohen, Harriet Dyer e Storm Reid. Suspense / Terror, EUA, 2020, 126 minutos.

A violência doméstica - física e psicológica - e a dificuldade das mulheres em serem OUVIDAS em episódios como estes, estão no centro do debate de O Homem Invisível (The Invisible Man), um suspense quaaaase bom. E eu não quero ser presunçoso afirmando isso mas a primeira metade do filme estava me ganhando de uma maneira, que estava prontinho pra escrever uma resenha das mais elogiosas, para um estilo que eu seguidamente torço o nariz. A trama inicia da forma mais sensacional (e angustiante) possível: uma mulher que saberemos mais tarde que se chama Cecilia (Elisabeth Moss) está tramando um plano para fugir de seu marido em um casarão em uma bela encosta litorânea. Ela levanta perto das quatro da manhã, faz tudo em silêncio para não chamar a atenção, até conseguir pular o grande muro que envolve a mansão para encontrar sua irmã - e, a princípio, a liberdade. Traumatizada pela dor vivida, ela tem dificuldade de superar e seguir adiante até o dia em que, duas semanas depois, chega a notícia de que seu ex, o abusador violento, morreu. Se suicidou, aparentemente.

Cecília está morando na casa de seu amigo James (Aldis Hodge) e de sua filha Sydney (Storm Reid). O trio convive de forma amistosa nos dias seguintes à chocante notícia da morte de Adrian (Oliver Jackson-Cohen), o ex, mas Cecilia sente como se algo a incomodasse: em meio aos corredores e as frestas da casa do amigo, parece sentir a presença do falecido. Como se fosse um vulto à espreitá-la, impossibilitando-a de seguir a vida normalmente. E confesso a vocês que a execução técnica dessa primeira parte, é não menos do que soberba. Com habilidade, o diretor Leigh Whanell (que fez Sobrenatural: A Origem, que eu não assisti), utiliza os enquadramentos, a profundidade de campo e os travellings como forma de "preencher" o cenário, gerando tensão por aquilo que NÃO vemos, mas, assim como a protagonista, também sentimos. O mesmo vale para o desenho de som, que transforma ruídos cotidianos como o chilrear de uma panela ou o zumbido de uma lâmpada, em elementos que contribuem para a claustrofobia onipresente, que é completada por uma fotografia naturalmente escurecida. Há tensão por todos os poros e uma tensão que a gente não sabe bem dizer por quê: e essa é a melhor parte do filme. Tanto que até os inevitáveis jump scares surgem de forma orgânica, como na parte em que Cecilia chuta sem querer a tigela de comida do cachorro.


Mas aí vem a segunda parte, que nos revela muito cedo qual é a natureza daquele sentimento de perseguição a partir de algo aparentemente invisível para Cecilia. Com dificuldade de fazer com que os demais compreendam aquilo com que está lidando - como acontece quase sempre que uma mulher resolve denunciar um agressor -, será enviada para tratamento psicológico, especialmente após a ocorrência de um crime bárbaro. Pior, sem poder provar aquilo que acredita estar vendo - à sua maneira de ver, claro -, se verá isolada conforme a brutalidade dos acontecimentos se avizinharem a ela. E, aí sim, admito que a inevitável correria do segundo ato, quase me fez perder boa parte do interesse pelo projeto. O filme tem sequências simplesmente deliciosas de "gelar a alma" sem fazer muito esforço - como na parte em que Cecilia descobre, no sótão da casa de James, um inexplicável celular de Adrian. Mas até mesmo a profissão do ex da protagonista acaba por entregar muito rapidamente qual a explicação mais lógica para aquilo que estamos assistindo. E isso em um filme de suspense, que se vale em muitos casos da tensão e das formas de "segurá-la", aprofundando a angústia e o terror do espectador, é algo meio decepcionante. Por mais que, evidentemente, compreenda o impacto social da denúncia do absurdo da violência doméstica como componente narrativo.

E, ainda que aqui e ali a correria tenha a sua dose de tensão, a conversão do suspense em um mero thriller policial na segunda parte, reduz bastante o potencial que poderia ter sido explorado até o final da película, inclusive com outras soluções possíveis para o caso. E, mesmo as reviravoltas, são incapazes de surpreender o cinéfilo mais atento. E, pior: soam quase infantis, assim como as motivações do vilão e daqueles que estão ao seu redor - por mais que, sim, sociopatas sejam violentos sem muito sentido. E, como crítica a este tipo de comportamento, a película também não funciona tão bem assim, já que parece ser um tanto desperdiçada a oportunidade para a ampliação desse debate. E, talvez eu esteja exagerando um pouco em esperar um pouco mais de investigação psicológica ou profundidade em um simples suspense, mas a primeira parte me fez esperar por isso. E me enganou. Restou alguns sustos, muita correria e nenhuma discussão sobre o horror da violência doméstica. Além da boa atuação de Elisabeth Moss, que sempre se entrega de corpo e alma a tudo que abraça. Achei meio pouco.

Nota: 6,5



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