terça-feira, 9 de julho de 2019

Cinema - Fora de Série (Booksmart)

De: Olivia Wilde. Com Kaitlyn Dever, Beanie Feldstein, Billie Lourd, Skyler Gisondo, Jessica Williams, Lisa Kudrow e Will Forte. Comédia, EUA, 2019, 105 minutos.

Devo admitir que sempre fico meio desconfiado dos filmes que tratam do universo dos adolescentes - especialmente pela dificuldade que muitos diretores têm de escaparem dos estereótipos. Do jogador de futebol americano popular, bonito e tosco, passando pela nerd que não é padrão de beleza (mas é muito inteligente), até chegar ao introspectivo dark ouvinte de The Smiths, o caso é que muitas obras reduziram os adolescentes a figuras exclusivamente maniqueístas, sem nenhum senso de vida em comunidade ou empatia. E que respondiam apenas de uma forma: com maldade ou bondade excessiva, de acordo com o papel que lhes foi atribuído na trama. Aliás, é assim até hoje e vamos combinar que as historinhas meio bobas, sobre adolescentes querendo perder a virgindade ou sobre moças românticas sonhando com príncipes encantados inexistentes, em meio a um festival de piadas machistas e misóginas, nunca contribuiu muito.

E quando li o resumo desse Fora de Série (Booksmart), sobre duas amigas com quase nada de vida social e que sempre foram muito focadas em tirar as melhores notas (o estereótipo das CDFs), mas que resolvem correr atrás do prejuízo na última noite de festa antes da formatura do Ensino Médio, confesso que não me animei muito. Mas esse filmezinho adolescente, pasmem, está entre os 25 melhores do primeiro semestre, de acordo com o site Metacritic (que compila notas de críticos dos mais diversos veículos). Então resolvi encarar a sessão, até mesmo porque queria algo mais leve, sem muita pretensão. E é preciso admitir: trata-se de uma gratíssima surpresa.


A quebra de estereótipos acontece já nos primeiros minutos do filme, quando as protagonistas Amy (Kaitlyn Dever) e Molly (Beanie Feldstein) se dão conta que os colegas que passaram a vida inteira na zoeira, entrarão em universidades tão majestosas quanto as delas. Sim, porque, por incrível que possa parecer, é possível SIM aproveitar a vida, curtir, namorar, ir para as festas, beber e transar e TAMBÉM ir para uma faculdade legal, estudando, se focando. Há momento para tudo. E uma coisa não exclui a outra. É a mesma lógica que vale para a dificuldade que Hollywood tem para aceitar que, nas comédia românticas, uma mulher possa casar (se assim desejar) e TAMBÉM ter uma carreira, um trabalho. Bom, quando nos primeiros minutos de filme essa ficha cai para nós, junto com uma das protagonistas, a película da diretora estreante Olivia Wilde já ganha um bom punhado de pontos.

Sim, os skatistas não precisam ser necessariamente os maconheiros burros, os ricações não precisam ter um bando de bajuladores à sua volta, os populares não precisam ser antipáticos e os nerds não precisam ser pretensiosos. É da vida real que estamos falando, e Olivia apresenta as características de cada adolescente - suas inseguranças, medos, desejos, anseios - com uma naturalidade comovente. Não estamos falando que não haverá "tribos", cada grupo interagindo mais com quem tem mais afinidade. Mas não é possível que todos curtam juntos? E é nesse aspecto tão prosaico que o filme nos arrebata. Quando Amy e Molly chegam a tão desejada festa, o "medo" inicial - de serem ridicularizadas, por nunca terem sido muito sociais -, dá lugar a outros sentimentos (euforia, paixão, desilusão). E a fluidez com que tudo acontece nos emociona e nos faz rir em igual medida.


É um filme tão simples, que é quase inacreditável. Se passa todo em uma madrugada, com Amy e Molly indo de festa em festa em busca da tal festa do Nick (a balada "oficial" da noite). Uso de drogas, ingestão de álcool, amizades, sorrisos, galinhagens, primeiras vezes desajeitadas (e totalmente compreensíveis), tudo estará lá, bem como as piadas sexuais engraçadas e os comentários sociais inteligentes, travestidos de piadas (como não sorrir um sorriso amarelo quando o motorista do Uber se revela o DIRETOR DA ESCOLA!) ou não (caso da onipresente mensagem sobre feminismo e de respeito às diferenças). Com uma sequência toda na piscina que, desde já, está entre as melhores do ano, Fora de Série ainda tem uma trilha sonora daquelas pra marcar época, com artistas como Perfume Genius, LCD Soundsystem, Rhye e Anderson .Paak dando ainda mais vida a cada sequência dessa pequena joia. Há esperança na geração Millenial. E os filmes já os têm tratado com um pouco mais de respeito e menos presunção. Que bom.

Nota: 8,5

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