terça-feira, 23 de julho de 2019

Cine Baú - O Tesouro de Sierra Madre (The Treasure of the Sierra Madre)

De: John Huston. Com Humphrey Bogart, Tim Holt, Walter Huston e Bruce Bennett. Aventura / Drama / Faroeste, EUA, 1948, 126 minutos.

"Dê poder a um homem e você conhecerá quem ele realmente é". A frase atribuída ao pensador Maquiavel representa como poucas o potencial destrutivo da ganância humana - e que é retratada de forma magistral no clássico O Tesouro de Sierra Madre (The Treasure of the Sierra Madre). Dirigida por John Huston (O Facão Maltês), a partir de livro de B. Traven, a obra nos joga para o México do ano de 1925, onde os indigentes Dobbs (Humphrey Bogart) e Curtin (Tim Holt) se conhecem após serem enganados por um empresário do ramo das construções. Desesperados e praticamente falidos, juntam-se a um velho minerador de nome Howard (Walter Huston, o pai do diretor) para tentar mudar de vida numa espécie de "corrida do ouro" tardia. Para tanto, são convencidos pelo veterano a irem a um lugar ermo, inóspito e cheio de aclives para, com poucos recursos, tentarem encontram algumas pepitas do metal que lhes pudesse fazer mudar de vida.

Mas a beleza desse filme não está na mera aventura que lhes leva ao local (a Sierra Madre do título) e sim na transformação dos três personagens durante a sua jornada - especialmente Dobbs, que passa a desconfiar até mesmo de sua sombra. Conforme avançam na mineração e vão encontrando algumas migalhas de ouro - que representam MUITO em dinheiro -, resolvem dividir tudo em partes iguais. Mas como não duvidar que algum deles não trairá os demais para ficar com suas riquezas? Não estaria Howard, com seu espírito afável e otimista, preparando uma armadilha para os seus ajudantes? E Curtin, com seu senso de justiça, não estaria disposto a enganar seus parceiros de empreitada? Em meio a aridez palpável e ao calor sufocante que salta para fora da tela, Dobbs vai se tornando um sujeito obcecado pelo seu ouro, com direito a delírios sobre possíveis traições e divagações existencialistas sobre sua condição.


Nesse contexto, não bastasse o isolamento e as dificuldades naturais - com direito a acidentes de percurso que quase comprometem a jornada -, o trio ainda precisa lidar com os desconfiados nativos do México, além de terem de enfrentar um grupo de pistoleiros que lhes cruza o caminho. A chegada do misterioso Cody (Bruce Bennett) ao local, tornará tudo ainda mais complicado: ele deseja se incorporar ao grupo, mas pouco se sabe sobre a vida dele. Alternando momentos que fazem lembrar a tradição dos grandes faroestes, com outros em que se o suspense e o drama se sobressaem, Huston transforma a película na experiência cinematográfica completa - há tensão, alguma dose de humor e aventura em iguais medidas. Conforme os dias e noites transcorrem com os protagonistas perdidos no meio do nada, assistimos a dissolução de seus valores morais e éticos, com disputas internas que se transformam no prenúncio de sua própria tragédia.

Com grandes interpretações - Huston pai está inesquecível na figura de um sujeito ambíguo, mas sempre otimista, caracterização que lhe valeu o Oscar na categoria Ator Coadjuvante -, a obra ainda foi a oportunidade para que Bogart fugisse um pouco do papel de mocinho/galã que ele havia interpretado em obras-primas como O Falcão Maltês (1941), Casablanca (1942) ou Uma Aventura na Martinica (1945). Já Huston, mesmo tendo dirigido clássicos como Uma Aventura na África (1951) e A Honra do Poderoso Prizzi (1985) teve uma carreira irregular, nunca mais repetindo o sucesso de O Tesouro... que lhe deu a estatueta dourada nas categorias Diretor e Roteiro Adaptado. O filme foi escolhido o 30º melhor da história em votação feita pelos integrantes do American Film Institute em 1998 e é frequentador assíduo das listas de melhores. Um Cine Baú mais do que merecido.


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