quarta-feira, 10 de abril de 2019

Disco da Semana - Matheus Brant (Cola Comigo)

Quando lançou o disco Assume Que Gosta (2016), o musico Matheus Brant deu carta branca para que os hipsters tivessem um disco "carnavalesco" para chamar de seu. O registro, divertido até dizer chega, era um convite nostálgico para um encontro entre a música alternativa e ritmos como o arrocha, o axé, a marchinha, o sertanejo universitário e o pagode. Sim, em cada coraçãozinho indie que pulsa a cada novo lançamento da Grimes ou do Arcade Fire há alguém disposto a cantar a plenos pulmões o refrão de Abandonado, do Exaltasamba (que o artista incluiu naquele trabalho). Sim, o encontro entre ritmos mais comerciais com violõezinhos estilo MPB, alguma dose de psicodelia e toneladas de sintetizadores resultou em músicas que caíram no gosto tanto do fã do programa do Rodrigo Faro, quanto do admirador de cada episódio do Greg News.

Assim, havia muito expectativa para o novo registro de Brant que, intitulado de Cola Comigo, chega dando aquela abraço carinhoso no pagode dos anos 90 - sim, aquele mesmo que crescemos escutando nas tardes do Domingo Legal, onde uma dúzia de pagodeiros cantavam sorridentes, enquanto estalavam os dedos e faziam dancinhas estranhas, em meio aos piores playbacks da história. Só Pra Contrariar, Soweto, Negritude Junior, Karametade, Os Travessos, Katinguelê... há uma pitada de cada um desses coletivos no trabalho que exala um frescor impressionante, jamais parecendo apenas uma simples homenagem ou uma mera caricatura. Com personalidade, Brant se leva a sério - sem perder o senso de humor, claro -, dialoga com o lirismo poético do samba e perfuma cada canção com cores próprias e com um verniz que revitaliza o estilo que se desgastou, assim que o novo milênio surgiu.



Em entrevista concedida ao site Revista Arte Brasileira, o instrumentista disse sentir falta na nova MPB, no samba e nos artistas indie em geral de uma certa vitalidade nas composições - uma comunicação direta com o público. "Essas eram justamente as características presentes no pagode. Assim, pensei que aproximar esses dois universos poderia resultar em algo interessante. De um lado o pagode com a coloquialidade e a espontaneidade muitas vezes consideradas de mau gosto e de outro o indie, a nova MPB, com seu apuro técnico, arranjos e sonoridade contemporâneos, muitas vezes definidos como bom gosto" enfatizou. Não é por acaso que ele mesmo, ao definir o seu estilo musical, o classifica como "pagode indie" - um tipo de música espontânea, sem qualquer trava intelectual e recheada por emanações vivas, cotidianas e eventualmente sofisticadas.

Saboroso de ouvir, o registro tem produção limpa com a voz do artista - que também é advogado e escritor - se sobressaindo em meio a ruídos eletrônicos, cavacos, surdos, pandeiros e muito lalaiá, palminhas e outros efeitos. Basta ouvir o refrão grudentíssimo de Preta (executado num daqueles típicos coros do pagode que não fariam feio em algum registro do Chico Buarque) ou letras irrepreensíveis como a de Tudo no Menu - Eu quero ter uma caminha bem macia / E a gente deita junto nela todo dia / Fim de semana até parece com a Bahia / A gente pode se encontrar - para ficarmos absolutamente arrebatados. Não demora e o preconceito vai se embora num instante. Brant tem dito em entrevistas que Assume Que Gosta e Cola Comigo integrarão, futuramente, uma trilogia. Não faria mal se ele adotasse um estilo tão saturado, cansativo e marcado pelo hedonismo como o sertanejo universitário para jogar alguma luz. É possível falar de amor, sexo e vida cotidiana sem tanto ranço, como comprova esse gracioso álbum.

Nota: 8,5

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