De: Rachel Lambert. Com Daisy Ridley, Dave Merheje, Megan Stalter e Bree Elrod. Comédia / Drama, EUA, 2023, 94 minutos.
Se existe algo que parece legítimo dos relacionamentos da era moderna é a capacidade dos jovens de se autossabotar. Dificuldades de encontrar alguém interessante, de estabelecer laços ou de ter responsabilidade afetiva tem sido parte das reclamações nas redes sociais. Mas vamos combinar que também é preciso se ajudar. Se desarmar. E retirar aquela barreira que impede uma relação mais profunda. Mais sólida. No caso do filme Às Vezes Quero Sumir (Sometimes I Think About Dying) temos em Fran (Daisy Ridley) o exemplo da protagonista introspectiva, silenciosa e com pendor pra depressão que, ao menor sinal de intimidade, parece disposta a jogar tudo pro alto e sair correndo. E, ok, talvez muitos prefiram a solitude do que alguma companhia desagradável. Mas não parece ser o caso de Fran que, em meio a sua rotina repetitiva de trabalho e de alimentação à base de queijo cottage, tem uma série de devaneios com a morte, com florestas abandonadas e bichos que lhe sobem pelo corpo.
Em alguma medida, Fran poderia ser apenas chata mesmo. Acontece. A gente conhece o tipo - aquele sujeito que, debaixo do véu da quietude, possui um ar de superioridade que apenas esconde a baixa autoestima eventual. A vida dela, em uma pequena cidade costeira sem muitos atrativos, se resume a ir ao trabalho, cumprir os protocolos do dia, mandar alguns e-mails, organizar planilhas. Quando uma colega está em vias de se aposentar, ela parece incapaz de celebrar verdadeiramente a nova etapa da vida da mulher que está de saída da empresa (que tem aquele escritório de estilo meio The Office). Enquanto os demais se ocupam da festividade surpresa e do cartão, ela está apenas interessada na sua fatia de bolo. E em não interromper a sua existência ordinária em frente ao computador. Ao menos é assim até a chegada de Robert (Dave Merhege), um sujeito sociável e carismático, que chega pra dar uma inesperada mexida no coração da protagonista.
O relacionamento, quando é com uma pessoa do perfil de Fran, inevitavelmente vai pra um lado meio torto. Robert tem genuíno interesse a respeito da jovem. Quer saber mais sobre ela, a família o passado. Se namorou ou não, se foi casada, quem são seus amigos, o que lhe interessa. Quais seus gostos. Para ele, é apenas estranho esse silêncio todo. Mais ainda quando ela reage mal diante das perguntas dele. Robert, um fã de cinema, que já foi casado duas vezes e que se mudou da grande cidade justamente para esquecer um segundo divórcio traumático, agora tende de lidar com um novo "trauma". O da candidata a par romântico incapaz de dialogar normalmente, sem se sentir ferida, magoada, inquirida ou o que quer que seja. No Tinder, já vi gente se queixando do fato do match fazer perguntas. Sério mesmo? Num mundo em que não se sabe mais conversar sem que seja por uma tela - justamente onde Fran se solta -, como se faz pra aprofundar o vínculo, sem que esse projeto de relação já morra na origem?
Será, evidentemente, um exercício de paciência que talvez nem todos terão - eu, como espectador, me coloquei mais de uma vez no lugar de Robert. Fosse eu no lugar sugeriria a Fran, inicialmente, um bom terapeuta - por experiência própria, foi o que fiz quando o pânico social bateu. Um tratamento que lhe ajude nos traumas, nas dores - e, em geral, o espectador fica meio no escuro nesse tipo de cinema mais alternativo, já que não há nada sobre passado, ou o que contribui para a formação de uma alma despedaçada. Fran parece inteligente e dotada de um senso de humor refinado. Mas não é suficiente para se unir a alguém. Talvez ela nem seja só, ainda que eu tenda a achar que absolutamente todo mundo procura alguém pra dividir a vida, os sorrisos, um filme ou um pão com queijo cottage no café da manhã. É isso que faz uma existência em tons pasteis ganhar cor. E contribuir para sair da mesmice. A vida, afinal, pode ser curta. E nem todos os momentos serão extraordinários. Assim, talvez caiba a nós encontrar aquela faísca de beleza no cotidiano.
Nota: 7,5
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