De: Jeff Nichols. Com Jodie Comer, Austin Butler, Tom Hardy, Michael Shannon e Mike Faist. Drama, EUA, 2023, 116 minutos.
Assim que finalizei Clube dos Vândalos (The Bikeriders) confesso a vocês que fiquei me perguntando a respeito do sentido desse filme ter sido feito - e, sim, eu tenho consciência plena de que a apreciação de um produto cultural não depende necessariamente disso. Não é preciso encontrar significado em tudo, especialmente quando o assunto é arte. Aliás, mais do que isso, a interpretação de cada pessoa dependerá de sua bagagem, experiências, vivências. Só que, aqui, rolou meio que uma sensação de vazio - e que talvez tenha a ver com o fato de que essa história ser excessivamente estadunidense. Ok, antes de os clubes de motociclistas funcionarem como uma espécie de antessala da extrema direita - no Brasil, em muitos casos, esses coletivos envolvem sujeitos bem nascidos que se reúnem para passeios "radicais" com suas Harley, enquanto reclamam do comunismo e das políticas sociais do governo Lula -, eles tiveram um embrião. E a minha dúvida era: esse tipo de comportamento sempre foi assim?
A resposta da produção dirigida por Jeff Nichols - de Loving (2016) -, parece ser: sim, sempre foi assim. Talvez com uma perspectiva um pouquinho diferente, mas sim. Quando surge nos anos 60, o Clube dos Vândalos - que existiu de verdade - era, sim, um grupo de adeptos da liberdade e da velocidade, que se reunia para conversas rasas, cervejadas, discussões acaloradas e brigas sem sentido. Mais ou menos como os bolsonaristas nos dias de hoje. Mas no seu embrião parecia haver uma espécie de código de conduta que, aqui e ali, foi se perdendo conforme a coisa foi crescendo. E gerando filiais nos mais variados estados norte-americanos. Que é quando a coisa descamba, a violência aumenta e o espírito aventureiro, à moda Sem Destino (1969), rock'n roll e contracultura, se esvai. E é justamente essa narrativa que é contada, em estilo documental, por Kathy (Jodie Comer), que conhece o integrante dos Vandals, Benny (Austin Butler, no modo James Dean das ideia), para se casar com ele apenas cinco anos depois.
A história é contada, em um arroubo metalinguístico, pelas lentes do fotógrafo Danny Lyon (Mike Faist, uma das estrelas do recente Rivais), que acompanha não apenas Kathy em seu relato, mas também os integrantes remanescentes do próprio grupo - entre eles o fundador Johnny (Tom Hardy, que entrega muito no papel do sujeito xucro, mas com algum senso de compaixão) e seu braço direito Brucie (Damon Herriman), que são orbitados ainda por outros integrantes da gangue, como o mal encarado Zipco (Michael Shannon) e o almofadinha Cal (Boyd Holbrook). Com idas e vindas no tempo, a narrativa contempla os desafios do grupo em se manter sólido, ao passo em que são desafiados por jovens supostamente rebeldes, que pretendem a todo o custo tomar o seu lugar de liderança - especialmente depois do surgimento de um sujeito irascível conhecido apenas como The Boy (Toby Wallace), que ameaça o grupo.
Em linhas gerais, o que o filme parece querer mostrar é como um coletivo pode simplesmente descambar se não estiver bem estruturado, organizado, talvez até com um estatuto bem consolidado, com tudo piorando em tempos de guerras (como a do Vietnã) e de incertezas sobre o futuro. Com tudo correndo meio solto não foi difícil de a coisa sair de um grupo de homens de meia idade, talvez meio insatisfeitos com alguma coisa, que são eventualmente misóginos e beberrões para um grupo de homens de meia idade, talvez meio insatisfeitos com alguma coisa, que são ainda mais misóginos e beberrões. Ao cabo, a motociata se converteria em um espelho extraído de Mussolini, para ser reconfigurado nos dias atuais como símbolo de uma extrema direita frustrada com os avanços do mundo. O que era contracultura e Born to Be Wild, do Steppenwolf nos anos 60, hoje em dia é preconceito, intolerância, óculos escuros, masculinidade tóxica e bandanas com os dizeres Make America Great Again. Se foi isso que Nichols quis mostrar, eu não consigo ter certeza. Entre a excêntrica camaradagem, os dentes podres, o ronco do motor e o barro e os homens que pretendem estuprar uma mulher em um bar a luz do dia, ou que quase decepam o pé de um suposto rival não parece haver muita diferença. É tudo meio parecido. Sem muito espaço para contradições.
Nota: 6,0
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