De: Laura Mora Ortega. Com Natasha Jaramilo, Giovanny Rodriguez e Juan Pablo Trujillo. Drama / Suspense, Colômbia / Argentina, 2017, 95 minutos.
Assistir ao ótimo Matar Jesus (Matar a Jesús), me fez lembrar de uma outra obra - no caso, o tenso O Filho (2001). E ainda que sejam filmes completamente diferentes entre si, há algo que une ambas as experiências, especialmente no que diz respeito ao exame dos ciclos de violência social, o medo como parte da rotina e quais os fatores que desencadeiam esses sentimentos - muitos deles ligados a traumas do passado e dores que apenas se reproduzem, sem muita explicação. Na produção dos Irmãos Dardenne, acompanhamos um carpinteiro enlutado pela perda do filho em um assassinato mal explicado, que contrata um jovem aprendiz que, mais tarde, descobriremos ser justamente o criminoso do passado. Já na obra dirigida pela colombiana Laura Mora Ortega, e que é baseada em fatos reais ocorridos na sua adolescência, uma jovem se aproxima perigosamente do sujeito que matou seu pai, meio que do nada.
Claro, como eu já disse, são experiências distintas - uma sul-americana, com todos os seus signos e códigos urbanos, de motos e asfaltos com seus barulhos urgentes; outra europeia, com elementos mais contemplativos, num cinema de espaços mais apertados e claustrofóbicos. No cerne esse aspecto de alguém que tem uma informação sobre o passado - e que poderá usá-la como uma forma de obter vantagem. Vingança? Talvez. Mas o caso é que as coisas podem ser mais complexas do que supõe a mera lógica do "bandido bom é bandido morto". No caso de Paula (Natasha Jaramilo), a protagonista de Matar Jesus, ela simplesmente assiste à morte do próprio pai, o carismático professor universitário de Ciências Políticas de Medellín, José Maria (Camilo Escobar), após um ataque perpetrado por uma dupla de sicários em uma moto. Sem uma resposta efetiva da polícia - não há sequer um suspeito, muito menos uma motivação -, Paula fica desalentada ao saber que o caso será arquivado.
Isso até uma noite em que Paula vai à boate com amigos. E esbarra justamente com Jesus (Giovanny Rodriguez), o jovem que, de acordo com as suas lembranças (ela pôde ver seu rosto de relance), foi o responsável pelo ato cruel. De forma discreta, ela tenta elaborar um plano para dar cabo do bandido. O que envolve uma aproximação, que avança para um estranho flerte - com um convite para a visita a um ponto mais ermo da cidade. Mas, se você não é um assassino, como você procede? Paula esconde em sua mochila, junto de seus equipamentos de fotografia - prática da qual ela é uma entusiasta -, uma garrafa quebrada. A tática pode dar cabo do rapaz? Sem muita certeza, ela mantém contato com um traficante das redondezas, um tal de Gato (Juan Camilo Cárdenas), que pode lhe ajudar a conseguir um revólver. Mas será que essa proximidade com esse outro espectro da criminalidade lhe fará bem? Até que ponto ela vai, tendo ainda o risco de ser descoberta?
Em meio a policiais corruptos, familiares preocupados e uma violência que parece se avizinhar a todo momento, em cada esquina da turbulenta cidade colombiana, a protagonista tenta juntar a coragem necessária para executar seu objetivo. Mas qual o sentido de continuar esse ciclo sem que tudo piore ainda mais? O delegado local, sugere que ela saia dali. Esqueça tudo o que aconteceu. Mas isso também é viável? Contrastando os figurinos coloridos, as luzes brilhantes da cidade ao anoitecer e as músicas hipnóticas e sensuais, com o cinza dos prédios e a crueza dos cenários de periferia, Laura Mora Ortega esmiuça o tecido social sem apelar para o maniqueísmo barato. Na realidade não há mocinhos e bandidos quando o sistema como um todo está um tanto falido. Quando um lado da cidade sofre de forma chocante com a realidade. Alguém precisará baixar a arma. Dar o primeiro passo. Pensar em algum tipo de redenção. E certamente não será um processo fácil.
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