De: Sophie Barthes. Com Emily Clarke, Chiwetel Ejiofor e Rosalie Craig. Ficção científica, Reino Unido, 2023, 101 minutos.
Vamos combinar que a ideia de Geração do Futuro (The Pod Generation) não poderia ser mais instigante: e se num futuro próximo as famílias pudessem gerar filhos em estruturas externas ao corpo humano? Se em lugar de um barrigão de grávida com todas as implicações decorrentes disso, uma tecnologia substituísse a processo normal de formação de um embrião por uma espécie de útero externo descartável - algo semelhante a um "ovo" de plástico em tamanho maior? Sim, parece bizarro, mas se a gente pensa em como as coisas evoluem, não nos parece algo tão impossível. Na existência do casal protagonista, no caso Rachel (Emilia Clarke) e Alvy (Chiwetel Ejiofor), essa passa a ser a realidade quando ela, em segredo, se inscreve em um programa de uma subsidiária do conglomerado de tecnologia Pegazus, da qual ela é uma dedicada funcionária. Aliás, tão dedicada que recebe uma promoção que tem como efeito colateral justamente a oportunidade do parto, digamos, mais moderno.
Só que aí, de saída, já se estabelece aquele que poderia ser um dos principais dilemas da narrativa e que, infelizmente, não é tão bem aproveitado. O caso é que do ponto de vista do mercado de trabalho, Alvy está em um campo diametralmente oposto ao de Rachel, já que ele é um professor de botânica que ocupa seus dias em uma espécie de jardim doméstico improvisado - local de resistência em que mantém uma série de organismos vivos da natureza (árvores e plantas bem podadas e manejadas em um solo bem cuidado). É nesse espaço que idílico, distante do aparato tecnológico que habita o dia a dia dos dois (e dá pra ver que ele tem dificuldade até mesmo com as inteligências artificiais que interferem no cotidiano doméstico), que ele recebe alunos e visitantes. Que tem a oportunidade de ter contato direto com algo que parece ter ficado no passado: a natureza exuberante, vívida, com suas flores, frutos, folhas e outros componentes. E, claro, como não poderia deixar de ser, Alvy não é tão favorável assim ao parto em uma cápsula. Externa. Estranha à vida e toda a sua organicidade.
Esse é um dilema interessante que, em meio a discussão de outros temas, como, expectativas em relação à maternidade, exigências das corporações (e do capitalismo), limites da tecnologia, alterações no mercado de trabalho e outras questões éticas ou não, poderia ter mais eco. Em certa altura, por exemplo, quando já estão "grávidos", Rachel e Alvy passam por um grupo estereotipado de feministas mais radicais que se mostram contrárias ao procedimento. Alvy pergunta: "mas elas não eram favoráveis" (pensando certamente nas implicações da independência feminina e do útero como esse símbolo onipresente do suposto papel da mulher na sociedade patriarcal)? "Isso era antes", responde Rachel. Mas por quê era antes? O que mudou? Assim como essa incerteza parece pairar no ar, também são excluídas da trama as redes sociais, os canais de mídia alternativa e outros segmentos que poderiam fazer mais barulho em relação a decisões de governo ou de grandes corporações. É tudo meio diluído em uma experiência centrada apenas no microcosmo da dupla de protagonistas. Com uma grande passividade em que tudo parece apenas um tanto insípido.
Um outro exemplo de subtramas não exploradas a contento, envolve um casal que já teve um filho a partir da tecnologia sintética, que alega que ele é incapaz de sonhar. O que motivaria isso? Há algo que muda na formação desse embrião gerado de forma artificial? Só que o assunto é abandonado no caminho. E o que isso poderia ter a ver com os seguidos sonhos que Rachel tem sobre gravidez convencional? Evidentemente que há aí um outro dilema que fica no rasinho: como se dará a conexão mãe e filho, a partir da geração fora do útero? Quais as implicações morais, existenciais, filosóficas a respeito da evolução genética? Ao focar sua trama somente na relação do casal, de suas diferenças e de necessidades de adaptação - como na parte em que Alvy vai a uma sessão de terapia em que até a psiquiatra é uma inteligência artificial -, o filme desperdiça a oportunidade de avançar mais em alguns de seus temas. Ao cabo, tudo parece um episódio mais ou menos de Black Mirror: tem algum capricho na produção e uma ideia que se fragiliza a todo instante, ao navegar na mera banalidade. Uma pena.
Nota: 3,0
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