De: Alexander Payne. Com Bruce Dern, Will Forte, June Squibb e Bob Odenkirk. Drama / Aventura, EUA, 2013, 115 minutos.
Quem acompanha a carreira do diretor Alexander Payne sabe de sua capacidade de dar luz à dramas familiares, que parecem examinar os Estados Unidos em seu componente mais provinciano - o que muito provavelmente tem uma boa dose de autobiografia, dadas as suas origens em Omaha, no coração do País. Foi assim com As Confissões de Schmidt (2002) e Os Descendentes (2016), com o expediente se repetindo no clássico moderno Nebraska, premiado projeto que completa dez anos de seu lançamento em 2013. Disponível para aluguel na plataforma da Amazon, o filme parte de um fiapo de história para uma análise de temas, como, solidão na terceira idade, dificuldade de comunicação entre gerações e incertezas diante da finitude. Na trama, o octogenário ex-alcoólatra Woody (Bruce Dern, em premiadíssima caracterização), acredita ter ganho um prêmio de US$ 1 milhão, que estaria disponível para retirada na cidade de Lincoln, Nebraska.
Só que o suposto prêmio não passa de um daqueles golpes em formato de carta registrada - que publicações como a Revista Seleções enviava para seus clientes, dando a entender que eles poderiam ficar milionários do dia para a noite, desde que assinassem o periódico. E, admito, quando era jovem, minha família assinou a Seleções e o troço era tão sacana, que até chaves - simbólicas, falsas, claro -, de automóveis ou de casas de valores estratosféricos, eles enviavam pelos correios. Era um esquema que visava atrair novos assinantes que, assim, participariam de sorteios. E por mais que seu filho David (Will Forte) tente demovê-lo dessa intenção estapafúrdia de viajar mais de mil quilômetros partindo do Estado de Montana, no Norte dos Estados Unidos, não há nada que o faça mudar de ideia. É preciso ir até Lincoln. A pé, de carro, de qualquer jeito que for. No começo do filme, Woody é parado até mesmo pela polícia, que quer entender o que ele faz bordejando a rodovia perigosamente.
Claro que tudo isso não passará de uma boa desculpa para um drama de aproximação entre pai e filho, que andavam aparentemente afastados - especialmente por traumas passados. Ranzinza, Woody é daqueles que está sempre as turras com os demais familiares, como no caso da esposa Kate (June Squib). Lá pelas tantas, pra tentar atender o desejo do pai, David pede uma folga no trabalho - como vendedor de eletrodomésticos - para uma jornada à bordo da caminhonete da família, em direção ao Nebraska. O que envolverá uma parada estratégica na cidade Natal de Hawthorne, na Dakota do Sul, após um acidente no caminho. Será lá que Woody reencontrará seus antigos amigos - parceiros de bodega, na realidade -, e revelará o que motiva a viagem. Despertando nos moradores do local não apenas a curiosidade, mas também o desejo de levar alguma vantagem sobre o prêmio (que, lembremos, sequer existe).
Feito com uma refinada fotografia em preto e branco - que parece ampliar o sentimento de melancolia interiorana -, e com uma trilha sonora que alude à solidão desses espaços, a obra tem alguns de seus grandes instantes envolvendo uma visita a Ray (Rance Howard), o irmão de Woody. Em uma sequência tão divertida quanto excêntrica, os filhos de Ray, Cole e Bart (Devin Ratray e Tim Driscoll) tentam, em vão, estabelecer algum diálogo com David, sobre carros e seus tipos de motor - num estereótipo difícil de ignorar. Em outra parte, toda a família está reunida em torno da televisão - que, ao cabo, se torna um dos únicos entretenimentos possíveis em eventuais fins de mundo. E, por mais que haja graça alternada com desalento, a produção não deixa de mirar em certo otimismo quase agridoce em seu terço final quando Woody, de uma forma meio torta, parece atingir o seu objetivo. Ou ao menos uma parte dele.
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