segunda-feira, 26 de junho de 2023

Novidades em Streaming - Beau Tem Medo (Beau Is Afraid)

De: Ari Aster. Com Joaquin Phoenix, Parker Posey, Patty LuPone e Amy Ryan. Comédia / Drama, EUA / Canadá / Finlândia, 2022, 179 minutos.

Joaquin Phoenix interpretando um adulto infantilizado mergulhado em traumas edipianos, tentando superar uma série de tragédias familiares - entre elas as que envolvem a conturbada relação com a própria mãe. E, como se não bastasse tudo isso, uma experiência filmada por Ari Aster - de Midsommar: O Mal Não Espera a Noite (2019). Tem como dar errado? Bom, aí vai de cada fã de cinema. Afinal são três horas extravagantes, divertidas, excêntricas e ousadas. Com um tipo de narrativa menos convencional que o habitual - o que talvez exija uma paciência um pouco maior. Ao cabo, Beau Tem Medo (Beau Is Afraid) é aquele tipo de obra que costuma dividir opiniões. Quem gostar vai considerar essa uma excelente alegoria para as manifestações psicológicas e os consequentes transtornos mentais que decorrem de uma mãe castradora e narcisista. Já aqueles que não simpatizarem tenderão a achar apenas entediante ou presunçoso. Um meio termo? Talvez.

Na trama, Beau Wassermann (Phoenix) é o sujeito solitário, filho de uma ricaça, que reside em um bairro tomado pela criminalidade (o caos do entorno é tão sufocante que o simples ato de entrar em seu apartamento é um desafio). Em meio a visitas ao psiquiatra e uma rotina de poucas novidades, Beau programa uma viagem para visitar a mãe, como forma de "comemorar" o aniversário de morte do próprio pai. Só que depois de uma madrugada mal dormida em que Beau é confundido com o vizinho que está com o som alto no prédio, o protagonista perde não apenas o voo, mas também a sua bagagem e as chaves de casa, que são roubadas na cara dura. Quando Beau liga pra sua mãe pra explicar todo esse contexto, ela faz pouco caso. Mais do que isso, inicia um processo de chantagem emocional que apenas ampliará o sentimento de ansiedade de Beau. Com tudo piorando no dia seguinte quando, em nova ligação, Beau descobrir que sua genitora está morta. Em um trágico acidente doméstico envolvendo a queda de um lustre.


Nessa altura do campeonato a gente já não sabe mais o que é coisa da cabeça de Beau, o que é trauma, ou o que é o simples desejo de fuga dos conflitos familiares. Para Mona Wasserman (Patti LuPonne) seu filho parece ser sempre alguém em dívida com ela. Ela lhe deu a vida, o que talvez lhei deixe na obrigação de atender seus desejos de forma incondicional. Mesmo que esse "desejo" seja uma simples visita. A mala e as chaves perdidas por Beau, assim como a demora pra acordar e pegar o voo no dia da viagem podem ser apenas uma desculpa verdadeira de quem efetivamente não conseguiu cumprir o combinado. Mas será mesmo? Será que no inconsciente desse sujeito tão perturbado, seus traumas que envolvem quartos escuros e uma mãe que sequer lhe deixava namorar sob a desculpa de ele ter uma grave doença no coração -, não são apenas a manifestação mais concreta de quem simplesmente não quer ir ao encontro da própria mãe? Por quê, se ele vai simplesmente sofrer - ou ser cobrado - ele iria?

Sim, a narrativa é cheia de buracos pra gente preencher com as nossas percepções, com a nossa bagagem, com a nossa história. Relações complexas com a mãe? Que chame Freud quem nunca teve alguma dificuldade. No percurso de Beau ele passará por tudo quanto é dissabor - que vão de um atropelamento, passando por uma fuga desesperada até chegar a um encontro inusitado com um grupo de atores itinerantes no meio da floresta. Todos esses elementos parecem se converter em pequenas pecinhas do quebra-cabeças que nos ajudarão a compreender não apenas o que aconteceu de fato com o pai de Beau em sua juventude, mas também como se comportava verdadeiramente a sua mãe no período. O que fará com que a gente entenda, ao menos em partes, os motivos de Beau querer fugir o tempo todo de Mona. Ou ao menos fugir dessa visita. E depois se arrepender. E tentar ir ao seu encontro de qualquer maneira. E se sentir livre. E viver. Não é uma experiência fácil e a impressão que se tem é que cada um que assistir vai dar ao filme uma interpretação. Isso não é ruim - ainda que possa sugerir que as ideias estão apenas espalhadas. Mas é uma obra que tem seu ponto, soberbamente executada do ponto de vista técnico, e que nos deixa em suspense em boa parte do tempo. Mesmo que esse tempo dure três horas.

Nota: 8,0


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