De: Sebastián Schindel. Com Cecília Roth, Miguel Angel Solá, Yanina Ávila e Benjamín Amadeo. Suspense / Drama, Argentina, 2020, 99 minutos.
Nesse sentido, o filme já abre com uma sequência de teor entorpecedor, em que uma moça se movimenta vagarosamente por um corredor mal iluminado - ela parece ter sangue em suas vestes. Ela teria cometido um crime? Ou está fugindo de alguém? Não demora para que a gente saiba se tratar da empregada Gladys (Yanina Ávila) - que atende de forma silenciosa (e bastante zelosa) os caprichos dos patrões Alicia (a sempre ótima Cecilia Roth) e Ignacio (o veterano Miguel Angel Solá). Quando o casal recebe uma ligação da polícia, vai ao encontro do filho Daniel (Benjamín Amadeo, em caracterização impressionante), que está preso após violar uma medida protetiva envolvendo a sua ex-mulher Marcela (Sofía Gala) que, acusando o rapaz de uma série de crimes (inclusive de tentar assassina-la), o impede de chegar perto também da filha pequena (no caso a neta de Alicia e Ignacio).
Por ser reincidente, Daniel está em maus lençois. As sessões judiciais são emocionalmente desgastantes e a solução para os pais do jovem - que desconfiam bastante das intenções da ex-nora (que parece exagerar nas suas reivindicações) - envolverá um altíssimo investimento de dinheiro, com a contratação dos melhores advogados possíveis. Em paralelo, enquanto essa história familiar dolorida se desenvolve - muitas sequências são comoventes e nos fazem ter dúvidas o tempo todo (o que é resultado das belíssimas interpretações de todo o elenco) -, temos Gladys. Os flashbacks perturbadores em que ela aparece vão aos poucos formando um arco narrativo paralelo. Grávida, teria sido impedida de ser mãe novamente (ela já tem um filho pequeno), sob pena de perder o emprego. Em um "segundo" tribunal uma outra ação parece estar sendo julgada. Tudo parece nebuloso, complexo, mas o roteiro engenhoso nos deixará de olhos arregalados o tempo inteiro.
E, sinceramente, creio que não valha a pena avançar muito mais na história, sob pena de estragar algumas das boas surpresas que a trama nos reserva - e eu confesso que, como de hábito, fui bastante surpreendido pelas revelações que emergem dessa colcha de retalhos. É um filme na tradição do gênero e que não deixa de colocar o dedo na ferida no que diz respeito a discussões como hipocrisia das classes mais ricas (que acreditam que o dinheiro, ainda, pode comprar praticamente tudo) e como as relações de poder estabelecem alguns tipos de vínculos sociais viciados e que dificilmente são modificados. Em meio a tantos filmes meia bomba saídos da mais famosa plataforma de streaming do mundo, Crimes de Família não pesa a mão ao apostar em uma fotografia de cores palidamente acinzentadas e um desenho de produção correto e econômico - o que faz com que foquemos naquilo que realmente interessa, no caso, a história surpreendente. Vale conferir.
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