De Aneesh Chaganty. Com Kiera Allen, Sarah Paulson e Pat Healy. Suspense / Terror, EUA, 2020, 89 minutos.
A Síndrome de Münchhausen por Procuração - distúrbio mental em que o genitor (geralmente a mãe) provoca abuso infantil ferindo a criança, gerando sintomas de forma intencional ou mesmo causando a doença -, já foi retratada em pelo menos duas ótimas séries recentes - no caso Sharp Objects e The Act, ambas da HBO. Em Fuja (Run), recente filme da plataforma Hulu, o tema volta em um suspense que começa muito bem, mas termina de forma apenas ok. Na trama, a mãe excessivamente "protetora" é Diane (Sarah Paulson, ativando o modo macabro), que criou a sua filha Chloe (Kiera Allen) em uma cadeira de rodas, completamente isolada do mundo exterior. Em um primeiro momento somos apresentados a uma dupla que interage de forma aparentemente saudável, até o momento em que a jovem passa a desconfiar das atitudes da mãe. E, bom, assim como ocorre na série The Act, alguns segredos vêm a tona e tudo aquilo que parecia a realidade, no entorno, começa a desmoronar.
Dirigido por Aneesh Chaganty - do razoável Buscando... (2018) -, o primeiro ato do filme é bastante instigante. Chloe está com 17 anos e, as vésperas de ir para a faculdade, aguarda ansiosamente a carta de aprovação de alguma instituição de ensino superior, o que representará a saída oficial da casa da mãe. Já Diane parece tranquila com este fato - e a sequência inicial dá conta disso: enquanto monitora a caixa de correio, cuida da filha, fazendo alimentando-a, ajudando em sua locomoção, lhe dando os remédios, fazendo fisioterapia. Parece tudo normal. Parece. Lá pelas tantas Chloe descobre em meio aos pacotes de supermercado, um desconhecido medicamento que está em nome de sua mãe. Na tentativa de investigá-lo, será surpreendida com o fato de que os comprimidos não correspondem à descrição da embalagem. Mais a fundo, perceberá a gravidade dos fatos, conforme segredos forem sendo revelados e, mais do que isso, não vale a pena contar para não revelar algumas das surpresas.
De forma engenhosa, o roteiro nos fornece algumas informações que nos dão a chave para aquilo que está acontecendo - como o próprio fato de a garota NUNCA poder acessar a caixa de correio, ou ter qualquer tipo de autonomia. Ao mesmo tempo, utiliza sequências prosaicas para gerar suspense - e uma das que mais gostei é aquela em que Chloe se esforça para acessar o Google em meio a madrugada na tentativa de descobrir alguma coisa sobre o princípio ativo do misterioso medicamento, ocasião em que se depara com uma "estranha" queda na internet. Será a partir desses episódios que a jovem montará o seu quebra cabeças, o que culminará em uma sequência em que ambas saem de casa e Chloe tem a oportunidade de descobrir um pouco mais sobre aquilo que ela considerava a sua vida - e que era apenas uma prisão particular. O que, nas aparências, era carinho, zelo e cuidado excessivos, era no final das contas uma severa doença psicológica que, apenas nas aparências, soava normal.
E, pra mim, aqui, entra o principal problema do projeto [ALERTA DE SPOILER], que é quando o filme envereda para a perseguição de gato e rato, o que quebra um tanto do componente psicológico visto nos dois primeiros atos. Vista imediatamente como a vilã oficial da história - e não como uma figura doente, que também prescindiria de cuidados médicos - Diane passará a ser caçada por agentes da lei porque, todos sabemos, espectador de Hollywood que se preze adora a vingança como elemento narrativo. E, a meu ver, isso deixa um gosto amargo na conclusão, o que é piorado pela lamentável última cena da obra, que se passa sete anos depois dos eventos que culminam na "prisão" da mãe perturbada. Ainda assim, como suspense, considero Fuja bastante "honesto", a despeito da repetição meio inexplicável de temas. Sarah Paulson empresta o seu rosto bastante expressivo e seu gestual "duro" para a composição da mãe perturbada, e se ela não chega a ser uma Patricia Arquette (de The Act) no desvario, cumpre bem o seu papel. Já Kiera está discreta em sua composição, ainda que mereça todo o crédito por ser cadeirante na vida real (o que por si só, já é um mérito).
Nota: 7,5
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