segunda-feira, 3 de setembro de 2018

Tesouros Cinéfilos - O Fabuloso Destino de Amélie Poulain (Le Fabuleux Destin d'Amélie Poulain)

De Jean Pierre Jeunet. Com Audrey Tautou, Robert Gendreu e Mathieu Kassovitz. Fantasia / Comédia / Romance, França, 2001, 121 minutos.

Na categoria dos feel good movies é provável que poucas obras sejam tão queridas pelo público quanto O Fabuloso Destino de Amélie Poulain (Le Fabuleux Destin d'Amélie Poulain) - fábula fantasiosa do diretor Jean Pierre Jeunet, que conta com uma carismática protagonista que não hesita em ajudar os outros, ao mesmo tempo que busca encontrar o grande amor de sua vida. É um filme colorido, leve e absolutamente gostoso de assistir, daqueles que transitam por gêneros diversos, nos fazendo rir e chorar em igual medida. Sua trilha sonora inesquecível (e indicada ao Oscar) encontra o equilíbrio perfeito na fotografia primaveril e de cores quentes (que também foi nominada pela Academia), capaz de denotar um estado de espírito generalizado de otimismo que, em tempos de ódio, preconceito e intolerância, é mais do que bem-vindo. E há o roteiro, cheio de frases de efeito espirituosas e diálogos excitantes que se harmonizam com uma montagem didática e cheia de charme.

Sim, é difícil resenhar uma obra-prima moderna como esta, sem enchê-la de elogios. Sem considerá-la diferente e cheia de personalidade, com uma vivacidade que salta a tela. E que nos envolve de maneira quase comovente. A Amélie do título é vivida por Audrey Tautou como uma garota curiosa, de olhar maroto e sorriso esperto - a despeito do distanciamento afetivo do pai e da trágica morte da mãe, quando ela ainda era jovem. No bairro em que mora, encontra uma caixa escondida no banheiro de sua casa - cheia de relíquias de infância que provavelmente pertenceu a algum antigo morador. Decidida a encontrar o dono da caixa, Amélie chega até Dominique (Maurice Bénichou), que chora de alegria ao tomar contato com tantos objetos que lhe trazem boas (e nostálgicas) memórias do passado. Embevecida por um certo sentimento de euforia por ter "feito o bem", a protagonista decide ajudar, com pequenos gestos, aqueles que a rodeiam. Sim, acredite, a trama é essa.



Em sua volta estão uma série de personagens excêntricos, que mais parecem saídos de algum tipo de devaneio fantasioso e onírico. Entre eles a colega de trabalho hipocondríaca, o feirante mal humorado, o ex-namorado ciumento, o vizinho que sofre de uma severa doença nos ossos que lhe impede de sair para a rua, um escritor fracassado e o próprio pai que, agora aposentado e distante dos prazeres da vida, busca significado em objetos prosaicos, como um anão de jardim (e, diga-se de passagem, a ideia de Amélie para incentivar o pai a viajar pelo mundo, e que envolve a pequena estátua, é uma das melhores partes)! E há também o sujeito que coleciona fotografias descartadas e rasgadas de uma cabine de fotos e que despertará grande curiosidade em Amélie, sendo peça chave da história. Nesse sentido, consiste-se em uma obra de personagens e de personalidades que, por mais expansiva que possa parecer, também vai no íntimo de cada um deles para revelar suas fraquezas, anseios e necessidades. Necessidades que todos têm, inclusive a protagonista.

Como uma coleção de retalhos sobre diversas vidas, a obra aposta no poder da edição - do som e da imagem - para transformar o filme em uma experiência (também) sensorial. Não é por acaso que, ao assistirmos um homem ao estourar um plástico bolha ou a protagonista colocar a mão dentro de um saco de grãos, imediatamente pensamos naquilo que gostamos ou não ou que nos dá prazer (por mais simples que as coisas sejam). É claro que na busca de Amélie pela felicidade haverá percalços, angústias e decepções. Mas assim é a vida e será fazendo o bem que ela também encontrará a felicidade. Indicada ao Oscar na categoria Melhor Filme Estrangeiro na cerimônia de 2002, a película perderia o prêmio para o bósnio Terra de Ninguém (2001). Ainda assim o seu universo enigmático e delirante - que amplia as experiências testadas anteriormente por Jeunet nos igualmente divertidos Delicatessen (1991) e Ladrão de Sonhos (1993) - permanece vivo na mente de qualquer cinéfilo.


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