quinta-feira, 6 de setembro de 2018

Pérolas da Netflix - Catfight (Catfight)

De: Onur Tukel. Com Sandra Oh, Anne Heche, Alícia Silverstone e Amy Hill. Comédia / Drama, EUA, 2016, 99 minutos.

Catfight (Catfight) é aquele tipo de comédia que foge do comum, especialmente pelo fato de extrair humor do inusitado. Aliás, não são poucas as sequências em que não sabemos se estamos rindo de nervoso ou por achar aquilo que assistimos verdadeiramente engraçado! A trama nos apresenta a duas pessoas completamente distintas que têm em comum o fato de terem sido colegas de faculdade. Veronica Salt (Sandra Oh) é a "esposa troféu" casada com um magnata, que é empresário do ramo de recolhimento de lixo e que acaba de fechar um contrato no Oriente. Já Ashley Miller (Anne Heche) é uma artista plástica em ascensão, que utiliza as suas obras para fazer a crítica à sociedade e ao american way of life. Duas figuras diametralmente opostas que se reencontrarão em meio a um aniversário. E as feridas abertas pelas diferenças entre elas serão o catalisador para algumas das mais surpreendentes cenas de luta (!) do cinema recente.

Basicamente o diretor Onur Tukel utiliza a briga entre as protagonistas para fazer a crítica a este mundo de extremos que vivemos, em que somos incapazes de aceitar ou conviver com aqueles que são ou que pensam de uma forma diferente da nossa. Veronica, muito provavelmente uma republicana, é a favor da guerra e da defesa do "cidadão de bem", especialmente pelo fato de o seu marido ganhar rios de dinheiro com a política armamentista americana. Já Ashley, certamente uma democrata, utiliza seus quadros cheios de cores vivas e de iconoclastia para fazer o provocativo contraponto. Quando estes pensamentos tão antagônicos batem de frente, há o choque, o conflito. E, como tudo na vida, o roteiro nos mostra que nem sempre os culpados pelos nossos problemas são os outros e que, sim, as coisas podem mudar inesperadamente de uma hora para outra.



A despeito do pano de fundo político/social é um filme absolutamente leve e despretensioso de se assistir. Mas que está o tempo todo tecendo bem-humorados comentários a respeito do sentimento de alienação generalizada que vivemos nos dias de hoje - algo reforçado pelo estúpido programa de televisão que mostra um sujeito peidando e que perdura pelos mais de quatro anos em que a história se desenrola. Com personagens secundários como a (ex) empregada doméstica de Veronica, a película também se ocupa de lembrar que, como dizia Paulo Freire, "se a educação não for libertadora, o sonho do oprimido será o de ser o opressor" - e certamente os anos de convivência com a família burguesa de Veronica fazem a mulher ser a favor da guerra e de outras políticas anacrônicas. Por outro lado a tia Charlie (Amy Hill), com sua existência pacata e riponga em meio as árvores, parece ser a única personagem lúcida da história. E há ainda a Alícia Silverstone como a namorada de Ashley e, confesso, fazia anos que não a via em um filme.

Cheio de idas e vindas o filme ainda utiliza a trilha sonora cheia de composições clássicas - de Beethoven, Bach, Mozart - de forma criativa e eficiente. Um dos melhores exemplos desse uso ocorre durante uma vernissage de Ashley que, inevitavelmente, acabará mal. Na sequência a trilha escolhida é a conhecida suíte In The Hall Of The Mountain King, de Edvard Grieg, que com seu baixo crescente e explosão orquestral forma o combo perfeito para uma das mais engraçadas cenas do filme, que culminará em uma disputa em uma borracharia. Ainda que haja ecos de outros diretores - impossível não pensar em Tarantino ou nos Irmãos Coen - e uma verdadeira homenagem a um elenco lembrado apenas por séries (ou até mesmo esquecido), o caso é que o filme de Tukel tem personalidade e injeta certo frescor a um gênero que, normalmente, é visto com desconfiança.

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