quinta-feira, 17 de fevereiro de 2022

Cinema - O Beco do Pesadelo (Nightmare Alley)

De: Guillermo Del Toro. Com Bradley Cooper, Rooney Mara, Cate Blanchett, Toni Colette e Willem Dafoe. Drama / Fantasia / Suspense, EUA, 2021, 150 minutos.

A imagem de uma roda gigante surgida em um plano aberto ainda no comecinho de O Beco do Pesadelo (Nightmare Alley) pode ter sido apenas uma aleatoriedade. Ainda assim não deixa de ser fascinante como o imponente brinquedo do parque de diversões itinerante - que serve como cenário de parte da narrativa - funciona como uma metáfora meio involuntária daquilo que acompanharemos dali para frente. Sim, a vida vai e volta, sobe e desce e às vezes parece que estamos no mesmo lugar, ainda que tenhamos, de alguma forma, nos movimentado. E é exatamente isso que ocorre com o protagonista Stan Carlisle (Bradley Cooper), um trambiqueiro que engendra um truque que mistura mentalismo e espiritismo para tentar manipular seu público nessa arena tão fantasiosa quanto mística. Stan começa meio pequeno e por acaso nesse parque excêntrico, recheado de atrações de gosto duvidoso ou meio bizarras - como por exemplo a existência de uma espécie de "fera" que se alimenta de animais vivos. E vai galgando algum sucesso, que o fará, movido pela ambição, dar um passo além em seus truques.

Baseada no livro de William Gresham, essa história já havia sido adaptada para o cinema em 1947, por Edmund Goulding. E vamos combinar que se havia um diretor indicado para reinterpretar esse texto era Guillermo Del Toro, que não apenas modificou algumas das ideias da obra anterior - inclusive seu final -, como ainda ampliou o espectro sombrio e misterioso do enredo que acompanhamos. Com um pouco menos de senso de humor do que o filme dos anos 40 - e até um otimismo menor -, a narrativa nos conduz a uma espiral de acontecimentos que se transforma em um verdadeiro jogo de gato e rato em que o vigarista Stan levará até o limite o seu truque - que envolve adivinhações relativas a vida pessoal dos participantes, a partir de um ardiloso jogo de palavras. Se a sua partner Molly (Rooney Mara) solicita que ele "preste atenção", talvez ela esteja com um relógio à mão, enquanto Stan, de olhos vendados, tenta adivinhar. Um truque meio barato que atrairá a atenção da psiquiatra Lilith Ritter (Cate Blanchett) que se aproximará do ilusionista.

Como afirmei no começa da resenha, a roda gigante vai rodando, vai subindo, vai subindo, com Stan cada vez mais animado com a ideia de levar as suas façanhas até o limite. No meio do caminho há uma morte meio inesperada, do veterano Pete (David Strathairn), em um aparente acidente envolvendo sua predisposição ao alcoolismo. Ou ele teria tirado a própria vida? Stan, em meio a seus jogos de poder, estaria envolvido? E o que desejará a viúva Zeena (Toni Colette), uma cartomante que parece sempre rondar o espectro do protagonista. Parece meio complicado mas é tudo bem amarrado, tecnicamente bem executado, o que explica as indicações ao Oscar em Desenho de Produção (Tamara Deverell), Figurino (Luis Sequeira) e Fotografia (Dan Lautsen), além da protocolar nominação a Melhor Filme. Já o elenco estelar é complementado por nomes como Willem Dafoe, Ron Perlman, Richard Jenkins, Mary Steenburgen e Tim Blake Nelson.

Ao cabo trata-se de um bom filme, que mescla drama, suspense, fantasia e até romance de forma equilibrada e bem à moda dos anos 40. O pano de fundo da Segunda Guerra Mundial, que estava às portas de acontecer, não ganha tanta profundidade, sendo o foco principal a mesquinharia daqueles sujeitos - ainda que a mera existência de um vigarista disposto a enganar meia dúzia de ricaços possa também ser um bom reflexo dos tempos (e nunca é demais lembrar que os EUA mal se recuperava da traumática quebra da Bolsa de Valores de 1929). Em linhas gerais eu confesso que nem sempre sou favorável ao processo de reimaginar histórias já visitadas anteriormente - especialmente se o resultado da versão antiga tem qualidade. Mas, aqui, como forma de apresentar essa trama para as novas gerações, parece haver um sentido nisso tudo. O cinema, afinal, também é uma espécie de roda gigante. Que sobe, desce, e às vezes estaciona no mesmo lugar de onde partiu sendo que, o que vale, é a jornada.

Nota: 8,0

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