segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

Pérolas da Netflix - Meu Nome É Dolemite (Dolemite Is My Name)

De: Craig Brewer. Com Eddie Murphy, Wesley Snipes, Da'Vine Joy Randolph, Tituss Burgess, Craig Robinsos e Snoop Dogg. Comédia / Drama, EUA, 2019, 118 minutos.

Em uma das tantas cenas divertidas do ótimo Meu Nome É Dolemite (Dolemite Is My Name), um grupo de amigos negros está no cinema para assistir ao clássico A Primeira Página (1974), dirigido por Billy Wilder. Filme de branquelo, feito pra branquelo, com uma trama romântica e uma verborragia classe média, a obra é rechaçada por Rudy Ray Moore (Eddie Murphy) e seus amigos, que dizem não terem entendido nada. Esse sempre foi, na verdade, o grande problema da falta de representatividade: sem se reconhecer em tela, a comunidade negra acabava relegada a papéis secundários, de serviçais ou de submissão a algum patrão branco ou rico. Pois foi no começo dos anos 70, quando surgiu a vertente cinematográfica que ficou conhecida como Blaxploitation, que esse cenário, ao menos em partes, mudou. Os filmes agora eram protagonizados e realizados por atores negros, com o uso de sua linguagem, gírias, hábitos, músicas e figurinos. Havia, finalmente, espaço para que as minorias também se reconhecessem no cinema.

O que esta obra dirigida por Craig Brewer (Ritmo de Um Sonho, 2005) faz é contar uma dessas tantas histórias reais de cinema de guerrilha, feito na raça, com poucos recursos e muita vontade. Rudy (o já citado Murphy, em um de seus melhores papéis na carreira) é um vendedor de discos frustrado, que sonha em subir aos palcos para ser comediante. Depois de algumas tentativas sem muito sucesso, ele vê a sua vida mudar quando passa a ouvir histórias contadas por moradores de rua - cheias de palavrões, de piadas chulas, de rimas controversas. É assim que ele vai criar o cafetão Dolemite, que conquistará a população negra, que se identificará com seu comportamento luxurioso, musical e sinuoso, bem como com suas histórias divertidas. Mesmo quando o mercado lhe disser não - como nas primeiras tentativas de levar seu disco de humor para uma grande gravadora -, o sujeito encontrará maneiras de fazer ecoar a voz da comunidade nas ruas, vendendo seus discos em um mercado "alternativo", qur funcionará dentro de sua própria loja.


A situação se complica um pouco mais quando o protagonista resolve fazer, de fato, o seu próprio filme, na intenção de alcançar um público maior. Empenhando a sua obra para conseguir recursos de investidores, Rudy "aluga" um antigo prédio que já serviu de reduto cultural para a comunidade negra, para rodar ali a sua película. Na paixão. No esforço. Contando com o suporte de alguns estudantes da faculdade de cinema. Com a luz "emprestada" do vizinho. Com força. Na persistência. E na tentativa de converter o amadorismo em uma espécie de ode a uma arte que não apenas pode, como deve ser levada a todos as pessoas. Nesse sentido, meu Nome É Dolemite é também uma grande homenagem àqueles que se esforçam para fazer filmes, sendo impossível não rir e se emocionar com aquele grupo de realizadores que, se não levam muito jeito, acreditam fielmente naquilo que estão produzindo e em seu resultado.

É um filme que pode até ter uma pegada meio autoajuda naquele sentido meio "acredite em você ou na sua força de vontade, de crescer, de fazer acontecer", mas ao final da sessão será praticamente impossível não estar com um sorriso no rosto. O elenco esbanja carisma, não deixando de ser divertido assistir à Titus Burgess (o Titus de Unbreakable Kimmy Schmidt) em um papel mais sério, Snoop Dogg como um presunçoso DJ de rádio ou mesmo o "retorno" de Wesley Snipes na pele de um afetado ator que acredita que venceu na vida (se comparado aos demais). Já o figurino, só não estará entre os indicados na próxima edição do Oscar, se os votantes da Academia estiverem sofrendo algum tipo de colapso visual, o mesmo valendo para a trilha sonora, recheada de hits cheios de suingue de artistas, como, Marvin Gaye, Kool and The Gang e The Commodores. Enfim, é uma obra divertida, leve e otimista, com excelente desenho de produção, e que ainda possui uma mensagem retumbante e altamente relevante - especialmente em uma época em que temos de conviver com figuras racistas e preconceituosas como Trump ou Bolsonaro.

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